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Sementes do ódio

Ataques do presidente Trump a quatro deputadas de ascendência estrangeira promovem a agenda racista e a polarização. Líderes supremacistas brancos avaliam manobra do republicano e exibem temor ante expansão da população de imigrantes

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 22/07/2019 04:05
Membros do Movimento Nacional Socialista exibem suástica em chamas depois de protesto em Daketown, na Geórgia, em 21 de abril do ano passado: grupos xenófobos se espalham pelos EUA aferrados na intolerância racial

Eles lutam por uma ;América Branca; (e fazem questão de adotar o termo com letras maiúsculas), um país livre de imigrantes e de afroamericanos. Acreditam ser a única raça pura, e se alimentam de décadas de intolerância. Dos 1.020 grupos de ódio ativos nos Estados Unidos, 374 seguem as cartilhas do nacionalismo e da supremacia branca, de acordo com a organização Southern Poverty Law Center (SPLC). ;Tudo sobre o que venho falando há décadas está se tornando verdade, e as ideias pela quais tenho lutado venceram;, declarou, em 31 de janeiro de 2017, David Duke, ex-líder da Ku Klux Klan, ao comentar a vitória de Donald Trump nas urnas. Na semana passada, o magnata instilou preconceito ao sugerir a quatro mulheres congressistas de ascendência estrangeira que voltem aos locais de onde vieram. Ante a imensa repercussão negativa, o republicano contra-atacou. ;Esses tuítes não foram racistas. Eu não tenho um osso racista em meu corpo!”, afirmou.

O Correio entrevistou três líderes de grupos considerados supremacistas brancos pelo SPLC e pela Anti-Defamation League (ADL, ou ;Liga Anti-Defamação;) e os questionou sobre o discurso divisivo de Trump. ;A ameaça da supremacia branca é clara: de Pittsburgh (Pensilvânia) a Poway (Califórnia), nós temos visto consequências desse tipo de retórica conspiratória. Todas as formas de extremismo são perigosas;, disse à reportagem Sharon Nazarian, vice-presidente para Assuntos Internacionais da ADL. ;Não sabemos o que está no coração ou na mente de nosso presidente. Mas, como temos afirmado, palavras têm consequências. A recente retórica de Trump, como ficou exemplificado nos tuítes, ecoou os mesmos pontos de discussão dos nacionalistas brancos. Isso é profundamente perturbador, principalmente por vir do líder do mundo livre.;


O ;capitão; Harry Hughes, diretor de relações-públicas e diretor da 11; Região do Movimento Nacional Socialista (NSM) dos EUA (que inclui Arizona, Utah, Nevada, Califórnia e Havaí), disse não estar preocupado com os tuítes de Trump atacando as deputadas Alexandria Ocasio-Cortez, Rashida Tlaib, Ilhan Omar e Ayanna Soyini Pressley. ;O presidente tem direito de emitir sua opinião, e os esquerdistas no Partido Democrata parecem sentir que a centro-direita não tem o direito de ter uma opinião. Se você diz algo que eles não gostam, o classificam de ;racista;;, desabafou. Hughes admite que a meta do NSM é ganhar poder político e defender os melhores interesses do ;Povo Branco;. ;A vinda de milhões de pessoas do Terceiro Mundo aos EUA está derrubando nossa nação e colocando uma carga social e financeira imensa sobre todos os americanos. Muitos defensores da imigração repetem o mantra ;A diversidade é nossa força;, mas não podem citar uma única cidade anteriormente branca que viu queda no crime. Os EUA não se podem dar ao luxo de se tornarem um campo de refugiados do mundo.;


Ameaça

Um dos oito diretores do American Freedom Party (Partido da Liberdade Americana), fundado em 2010 por skinheads do sul da Califórnia, Kevin B. MacDonald ; professor de psicologia da Universidade da Califórnia em Long Beach ; admite que a retórica de Trump tornou os americanos ;muito mais conscientes da ameaça representada pela imigração;. ;Também abriu os olhos deles para a realidade de que os não brancos veem a América em termos muito negativos. Isso significa tornar os brancos mais cientes de sua identidade racial e polariza ainda mais a política dos Estados Unidos.;

Tom Metzger, ex-Grande Dragão da Ku Klux Klan na Califórnia, fundou a White Aryan Resistance (WAR, ou ;Resistência Ariana Branca;) em 1983. ;Sou um racista da classe trabalhadora branca;, admitiu, rejeitando a pecha de nacionalista branco. ;Nossa filosofia é a sobrevivência e a expansão.; Ele se gaba de ter alertado a direita contra a ascensão do nacionalismo, mas disse ter sido ignorado. Questionado sobre os principais fundamentos do grupo, Metzger desconversou: ;No momento, estamos nos divertindo, assistindo ao desmoronamento do sistema corrupto;.


Por sua vez, Clayborne Carson, fundador do Instituto Martin Luther King Jr., da Universidade de Stanford, e guardião dos documentos do líder ativista, vê Trump como um político que domina a arte de expressar visões alinhadas a muitos dos nacionalistas brancos. ;Ele legitima os pontos de vista de americanos que jamais se uniriam a um grupo nacionalista branco, mas que se sentem mais livres para expressar seus sentimentos racistas e anti-imigração. São essas as pessoas que não veem problema em dizer aos imigrantes para voltarem de onde vieram;, explicou ao Correio.



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