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Li Peng, ex-premiê da China

Morre, aos 90 anos, o líder responsável por decretar a Lei Marcial em Pequim e por ordenar o massacre da Praça da PazCelestial, em 4 de junho de 1989. Sobreviventes celebram o falecimento, mas lamentam a impunidade pelas mortes de centenas de pessoas

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 24/07/2019 04:06
Li Peng recebeu o apelido de
Quando falou ao Correio, na manhã de ontem (noite em Taiwan, onde vive), Wuer Kaixi celebrava a notícia tomando um drinque com amigos. Um dos principais líderes dos protestos da Praça da Paz Celestial e sobrevivente do massacre de 4 de junho de 1989, em Pequim, ele admitiu estar feliz com a morte de Li Peng. O ex-primeiro-ministro da China que ordenou a repressão violenta ao movimento encabeçado por estudantes e ficou conhecido como ;o açougueiro de Pequim; morreu aos 90 anos, ;após uma doença cujo tratamento se revelou ineficaz;, anunciou a agência de notícias Nova China, ao homenagear um ;notável revolucionário proletário;. O texto saudou ;o membro expecional do Partido Partido Comunista da China (PCC), que sempre se mostou fiel;. ;Apesar da alegria, também fico um pouco desapontado com o fato de ele ter vivido por tanto tempo como se não houvesse justiça;, desabafou Kaixi. ;Eu aguardava o dia em que ele fosse condenado, e seu corpo, chicoteado. Mesmo assim, isso não traria justiça, especialmente para aqueles que perderam entes queridos naquele dia.;

As imagens de tanques atropelando civis e as estatísticas sobre o massacre se tornaram um tabu para o PCC. Pequim reconhece, oficialmente, 300 mortos. Os ativistas de Tiananmen (;Paz Celestial;, em mandarim) citam até 10 mil. Outro líder estudantil e sobrevivente da carnificina, Fengsuo Zhuo, 51, disse à reportagem sentir indignação e vergonha ante as notícias do falecimento de Li Peng. ;A justiça não foi feita, pois ele morreu de causas naturais, antes que pudesse enfrentar o julgamento. Li e sua família foram recompensados pelo PCC com autoridade e riqueza ilícita, por seu papel desempenhado no massacre. Mesmo que o ex-premiê esteja morto, sua família tem sangue nas mãos.;

Fengsuo explicou que, quando o então secretário-geral do PCC, Zhao Zhiang, foi exonerado, Li Peng comandou a reunião do partido que culminou na declaração da Lei Marcial em Pequim, o que desencadeou os protestos públicos na Praça da Paz Celestial. ;O estado de anarquia está indo de mau a pior. Somos forçados a tomar medidas decisivas e resolutas para colocar um fim à turbulência;, advertiu o então premiê, 16 dias antes do assassinato em massa, em rede nacional de TV, ao instaurar a Lei Marcial. ;Mais tarde, Li Peng tentou publicar o próprio diário, mas foi proibido. Eventualmente, o livro foi colocado na internet por dissidentes chineses. O documento confirmou a responsabilidade de Li pelo massacre, ainda que ele tenha apontado o dedo para Deng Xiaoping;, disse, ao citar o líder supremo da China entre 1978 e 1992.

Em 1989, Chan Ching Wa Jonathan, então com 24 anos, viajou de Hong Kong a Pequim para participar dos protestos. ;Então, este assassino de mãos manchadas com o sangue do povo está morto. Meu sentimento é de angústia e de tristeza profunda de como este assassino escapou sem qualquer castigo em seu leito de morte;, afirmou ao Correio. Chan acusa Li de ter sido o único encarregado por Deng de comandar o aparato estatal para esmagar o movimento estudantil. ;Ele apoiou a decisão de Deng de reprimir os estudantes, e foi quem anunciou a Lei Marcial, o chefe dos linha-duras.;

O ;açougueiro de Pequim; conviveu com o apelido até o fim de sua carreira política oficial, em 2003, como presidente do Parlamento chinês. Ele permaneceu por pelo menos 15 anos como membro permanente do escritório político do PCC. Na década de 1990, Li ocupou o cargo de vice-presidente, durante o governo de Jiang Zemin. Nascido em 20 de outubro de 1928 na província de Sinchuan, alistou-se ao PCC aos 17 anos e cursou engenharia e hidroeletricidade em Moscou. A ascensão no PCC e no governo começou em 1979, ao se tornar ministro da Energia Elétrica e, oito anos depois, primeiro-ministro, cargo ocupado por 10 anos. ;Ele tomou medidas decisivas para conter a desordem e aplacar os ânimos contrarrevolucionários; estabilizou a situação interna e teve um papel importante nesta luta crucial para o futuro do Partido e do país;, concluiu a agência Nova China.


O símbolo dos protestos


A imagem se tornou ícone dos protestos da Praça da Paz Celestial. Jeff Widener, 62 anos, trabalhava como editor de fotografias para o Sudeste da Ásia na Associated Press quando registrou o momento, no dia seguinte ao massacre. ;Na noite anterior, eu tinha sido atingido na cabeça por uma rocha lançada por um manifestante. Quando fiz a foto do ;Homem dos Tanques;, estava muito assustado, quase tinha morrido;, relatou ao Correio, no mês passado. A imagem mostra um estudante estático diante de uma coluna de tanques.


Eles estavam lá

;Li Peng foi o segundo implicado no Massacre de Tiananmen, depois de Deng Xiaoping. Desde o início, ele se mostrou frio e brutal. Eu estou envergonhado com o fato de ele ter escapado da responsabilização e da punição
que merecia.;


Fengsuo Zhuo, 51 anos, era estudante de física na Universidade Tsinghua e é um dos líderes estudantis da Praça da Paz Celestial


;Li Peng foi o carniceiro do massacre de 4 de junho, e é assim que ele deveria ser lembrado pelo mundo, pela história, e espero que, um dia, pelos livros escolares da China.;


Wuer Kaixi, 51 anos, um dos líderes estudantis da Praça da Paz Celestial

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