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Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 27/07/2019 04:06

Entrando em briga
por procuração



Na crise entre os Estados Unidos e o Irã, em escalada desde o romprimento de Donald Trump com o acordo nuclear de 2015 e a reimposição de sanções, o governo brasileiro se vê na posição de trocar a tradicional adesão aos mecanismos multilaterais de solução de impasses pelo alinhamento ; proclamado e reiterado pelo presidente Jair Bolsonaro ; com a política unilateral dos Estados Unidos para a chamada ;questão iraniana;. Mais do que afirmação retórica, foi esse o resultado da retenção, no Porto de Paranaguá, de navios carregados com milho destinado aos persas, que estão entre os maiores parceiros comerciais do país no Oriente Médio e origem, até poucos anos, de um respeitável superavit na nossa balança externa.

O cerne da questão envolve, porém, outro aspecto da reorientação geral pela qual o Brasil passa sob o governo de Jair Bolsonaro: a política para a prospecção, exploração, refino e distribuição do petróleo e dos derivados está sendo submetida a revisão profunda, expressa na privatização da BR Distribuidora. O cerco imposto por Trump ao resto do mundo, em torno de sua disputa com o regime islâmico de Teerã, coloca empresas de terceiros países como alvo potencial de represálias dos EUA, caso mantenham com contrapartes iranianas negócios de determinada monta, em setores definidos de atividade. No caso concreto, como especificou o chanceler Ernesto Araújo, o fornecimento de combustível aos cargueiros retidos em Paranaguá colocaria a Petrobras na mira do Tesouro americano.

A decisão do STF em favor do reabastecimento, lamentada pelo titular do Itamaraty, coloca potencialmente a maior empresa do país em rota de colisão com Washington ; por ironia, em momento no qual o presidente e o chanceler reiteram o afinamento com a política da Casa Branca e do Departamento de Estado.

Gato escaldado
Não é a primeira vez que a estratégia brasileira para o setor energético esbarra em um regime unilateral de sanções imposto pelos EUA a um regime percebido como adversário. Nos últimos anos, antes do acordo nuclear firmado em 2015 com o Irã por Washingron e mais cinco potências mundiais, a Petreobras viu-se obrigada a abandonar planos em estudos com a estatal petroleira iraniana para projetos comuns. Na ocasião, valia uma lei pela qual empresas de terceiros países cujos negócios com o país visado pelas sanções americanas superassem determinado valor estariam automaticamente excluídas de operar comercialmente no mercado americano.

Ciente de que não podia bancar a afronta, a Petrobras cancelou a instalação, no Irã, de uma subsidiária destinada a operar no Oriente Médio. Em particular, essa representação da estatal brasileira teria como missão central explorar as possibilidades de operação no Iraque, no marco da reativação da indústria petroleira no país, após a invasão americana de 2003, a deposição de Saddam Hussein e a guerra civil entre xiitas, sunitas e curdos.

Versão Caribe
O sistema unilateral de sanções imposto ao regime islâmico de Teerã é gêmeo do cerco imposto há seis décadas ao governo comunista de Cuba, com mecanismos e consequências em tudo semelhantes. Apoiadas na Lei Helms-Burton, que estende as represálias a empresas de terceiros países as punições determinadas para empresas americanas que negociem com o país-alvo, essa política que Havana classifica como bloqueio obrigou a Petrobras, ainda no governo Lula, a tirar o time de projetos em andamento na área de soberania cubana no Golfo do México.

Conhecida pela capacidade desenvolvida para atividades em águas profundas, a petroleira brasileira participou da prospecção em blocos licitados por Cuba na sua fatia do litoral que separa a ilha da península americana da Flórida. Teve, no entanto, de se afastar do processo quando chegou o momento de passar à exploração ; ainda em caráter experimental ; das reservas potenciais detectadas. Caso prosseguisse, a empresa ficaria exposta a punições do Tesouro americano e impedida de operar no mercado dos EUA.

Vai para o trono?
É com esse pano de fundo que Washington começa a examinar, formalmente, a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente e ele próprio presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, para responder pela embaixada nos EUA. Independentemente da concessão do agrément, passo considerado seguro no Planalto e no Itamaraty, a nomeação requer ainda a aprovação pelo Senado, onde as audiências para confirmação, na comissão permamente dedicada ao tema, prometem no mínimo debate acirrado. O filho 03 terá de ser confirmado, em última instância, pelo plenário do Senado.

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