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Largada para nova corrida às armas

Deixa de ter validade, a partir de hoje, um acordo firmado entre as duas potências, durante a Guerra Fria, parabanir os mísseis nucleares de alcance intermediário. Além da rivalidade, Washington e Moscou olham para Pequim

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 02/08/2019 04:06
Míssil soviético em exposição na Ucrânia, que integrou a União Soviética: europeus receiam escalada militar
Uma nova etapa da corrida armamentista entre as duas maiores potências militares pode estar começando hoje, quando os Estados Unidos abandonam formalmente o Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance Intermediário (INF, em inglês), firmado no fim dos anos 1980 com a extinta União Soviética ; que teve como sucessora a Rússia. O acordo baniu mísseis atômicos com alcance entre 500km e 1.500km, uma categoria de armas que Washington e Moscou mantiveram por décadas estacionadas em países aliados na Europa. O presidente Donald Trump comunicou oficialmente a saída do acordo em 1; de fevereiro, e, no início do mês, Vladimir Putin ratificou a suspensão das obrigações por parte de Moscou.

;O tratado INF foi útil para nós, mas funciona somente se as duas partes o respeitarem;, afirmou recentemente o novo secretário americano de Defesa, Mike Esper, durante audiência no Senado. Os EUA justificaram o rompimento alegando que a Rússia vinha desenvolvendo sistemas que burlam os termos do acordo. Em especial, o Pentágono cita como exemplo o míssil 9M729, que poderia atingir alvos a até 1.500km, de acordo com especialistas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, aliança militar ocidental). A Rússia sustenta que o alcance da arma é de 480km, e acusa o governo americano de dar fim ao INF para consolidar uma posição de supremacia, em especial no cenário europeu.

Embora os governos do continente tenham manifestado o receio de uma reedição da corrida armamentista em seu território, a Otan fechou com a posição de Washington, na expectativa de que o bloco posssa contar com um sistema eficiente de defesa convencional (não nuclear). No mês passado, o então secretário de Defesa dos EUA, Ash Carter, classificou o fim do INF como benéfico. ;Do ponto de vista militar, e não político, não é tão ruim;, disse, em conferência promovida pelo Conselho de Relações Exteriores (CFR), instituto independente que funciona como uma espécie de laboratório político para o Departamento de Estado. ;Podemos fazer bom uso do que chamamos de ataque convencional rápido.;

China
Analistas de assuntos de defesa veem como alvo da nova doutrina militar exposta pelo Pentágono não propriamente a Rússia, mas a China, que não é signatária do INF e traçou como prioridade para as próximas décadas a expansão e a modernização de sua capacidade bélica. Thomas Mahnken, do Centro de Estudos Estratégicos da Universidade Johns Hopkins, acredita que os EUA devem instalar novos mísseis convencionais de médio alcance em ilhas do Pacífico e no território de países aliados, para compensar o poderio crescente de Pequim no Mar do Sul da China, onde disputa com vizinhos a soberania sobre ilhas de importância estratégica. ;Essas armas seriam uma força de dissuasão ante à agressão chinesa.;

Também a Rússia, de acordo com os estudiosos, vinha se preparando para o fim do tratado INF, criticado pelo governo de Vladimir Putin desde 2007, quando se retirou de outro acordo firmado na Guerra Fria ; sobre Forças Armadas Convencionais na Europa (Cafe, em inglês). Quando Trump anunciou a intenção de romper com o INF, em outubro, Moscou não procurou demovê-lo ; ao contrário, Putin logo anunciou uma nova geração de armas. ;Agora, veremos o desenvolvimento e a implantação delas;, afirma o analista independente Pavel Felgenhauer, ouvido pela agência de notícias France-Presse.

Além do controverso míssil 9M729, pivô do rompimento do tratado, o Exército russo trabalha em uma versão terrestre do míssil Kalibr, lançado de navios e testado em combate na guerra civil da Síria, onde a Rússia intervém desde 2015, em apoio às forças do aliado Bashar al-Assad.


;O tratado INF foi útil para nós, mas funciona somente
se as duas partes o respeitarem;

Mike Esper, secretário de Defesa dos EUA

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