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Teste portátil para a quimioterapia

Usando inteligência artificial, dispositivo indica o grau de efeito de um medicamento quimioterápico sobre células doentes colhidas em uma biópsia. Para especialistas, a solução poderá facilitar o tratamento personalizado da enfermidade

postado em 05/08/2019 04:05

Uma das principais dificuldades enfrentadas no tratamento de câncer é saber se os remédios quimioterápicos estão fazendo efeito, matando as células tumorais e preservando as saudáveis. Pesquisadores da Universidade de Rutgers, nos Estados Unidos, trabalham no desenvolvimento de um dispositivo que poderá ajudar médicos e pacientes nesse sentido. Baseada em inteligência artificial, a solução tecnológica foi apresentada recentemente na revista Microsystems & Nanoengineering.

O dispositivo portátil é capaz de fornecer resultados imediatos e ajudar em análises moleculares adicionais. Para os criadores, ele permitirá intervenções personalizadas, além de melhora no gerenciamento e na detecção de cânceres. ;Nós vislumbramos usá-lo como uma ferramenta de diagnóstico de pronto atendimento para avaliar a resposta do paciente;, explica Mehdi Javanmard, um dos autores do estudo e professor-assistente no Departamento de Engenharia Elétrica e Computação na universidade norte-americana.

A equipe criou o dispositivo para auxiliar o colega Joseph Bertino, pesquisador residente do Instituto de Câncer e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Rutgers. Bertino dedica-se a uma terapia para maximizar a eficácia da quimioterapia e minimizar danos colaterais.

;Ele me perguntou se poderíamos desenvolver uma tecnologia que pudesse avaliar rapidamente se os pacientes responderiam positivamente a essa terapia;, conta Mehdi Javanmard. ;Nossa tecnologia combina inteligência artificial e sofisticados biossensores que lidam com pequenas quantidades de fluidos para ver se as células cancerosas são sensíveis ou resistentes a medicamentos quimioterápicos;, resume.

Biossensor
A recomendação do grupo, que iniciou o trabalho em 2015, é que o dispositivo seja manuseado apenas por profissionais de saúde e após a confirmação da doença por meio de uma biópsia. Inicialmente, deve ser aplicado o quimioterápico cogitado para o tratamento no material coletado do paciente. Espera-se que as células sensíveis ao remédio morram, e as resistentes permaneçam vivas.

Depois, o dispositivo deve ser colocado na mesma amostra para que o biossensor meça as propriedades eletrônicas das células, ou seja, o tamanho e a permeabilidade da membrana delas. Usando inteligência artificial, a solução detecta as estruturas vivas e as mortas, conforme mudanças das propriedades eletrônicas. Com base na percentagem entre essas duas condições das células, o médico pode avaliar se o paciente vai responder positivamente à quimioterapia. Em testes com amostras de culturas de células cancerosas tratadas com diferentes concentrações de um medicamento quimioterápico, a precisão foi superior a 95%.

Para os criadores, com a nova abordagem, o padrão de atendimento será aperfeiçoado e haverá redução dos custos do tratamento. ;O dispositivo é totalmente eletrônico, portátil e muito barato. A tecnologia também usa inteligência artificial, o que resulta em maior precisão;, destaca Mehdi Javanmard.

Limites
Luciano Santos, médico oncologista e coordenador médico do grupo Oncologia D;Or em Brasília, ressalta que cada paciente responde de uma forma à quimioterapia. Dessa forma, com os recursos atuais, é preciso expô-lo ao tratamento e às toxicidades para avaliar se haverá êxito. ;Uma vez comprovada a aplicabilidade desse dispositivo em situações de mundo real, poderemos considerá-lo como uma grande inovação no tratamento oncológico, principalmente no quesito avaliação de resposta antes da exposição do paciente ao tratamento;, diz.

Coordenador médico do Hospital do Câncer Anchieta, Marcos França acredita que a criação de uma forma de avaliação de eficácia será fundamental nesta nova era da oncologia. Apesar disso, ele ressalta a importância de entender que os tumores não são todos iguais, o que pode interferir na eficiência da proposta de abordagem feita pelos norte-americanos. ;Nem sempre uma mesma tecnologia pode ser capaz de mensurar a eficácia dessa infinitude de doenças que chamamos de câncer;, explica.

O médico também frisa que será preciso avaliar se a solução poderá ser usada em pacientes submetidos a outros tratamentos contra cânceres, como a imunoterapia, o uso de drogas alvo e de terapia hormonal. ;A mensuração da eficácia dessa nova tecnologia não apenas com a quimioterapia deve ser testada, pois o tratamento quimioterápico, apesar de ainda ser muito utilizado, vem perdendo espaço para as novas terapias;, aponta.

A ideia dos criadores é começar a comercializar o dispositivo daqui a três ou cinco anos. Para isso, o próximo passo do projeto é realizar testes em amostras de tumores retiradas de pacientes, e não de material de laboratório. Professor de Oncologia Aplicada do Centro Universitário de João Pessoa (Unipê), Luiz Victor Maia considera que o dispositivo abre novas portas para o tratamento de precisão. ;Tecnologias como essa são ansiosamente esperadas e podem impactar positivamente a vida de pacientes com câncer. A união da engenharia clínica, inteligência artificial e nanobiotecnologia pode otimizar os cuidados oferecidos e salvar vidas;, diz.

* Estagiária sob supervisão de Carmen Souza


;Nossa tecnologia combina inteligência artificial e sofisticados biossensores que
lidam com pequenas quantidades de fluidos para ver se as células cancerosas são sensíveis ou resistentes a medicamentos quimioterápicos;

Mehdi Javanmard, pesquisador do Departamento de Engenharia Elétrica e Computação na Universidade de Rutgers


Palavra de especialista

Risco de
expectativas
frustradas


;A tecnologia não é indicada para todos os tipos de câncer e de tratamentos, o que reduz o grupo a ser beneficiado. Isso pode gerar expectativas frustradas em muitos pacientes, pois a maioria deles não faz parte do grupo de interesse do estudo. Outro ponto de vista importante são as respostas não favoráveis, ou seja, como se sentirá um paciente submetido à nova tecnologia com os biossensores quando ela registrar que a resposta terapêutica não foi a desejada, ou seja, que as células do seu câncer continuam vivas? Os estudos devem continuar, pois podem resultar em bons resultados, mas a atenção de saúde individualizada deve permanecer e ser cada vez mais ampla, olhando o paciente para além da doença. A pesquisa precisa ser concluída para melhor afirmarmos seus benefícios e custo/benefício;
Luciana Martins, especialista em enfermagem oncológica e professora do Departamento
de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina

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