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Conexão diplomática

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 24/08/2019 04:05
Amazônia em foco
na cúpula do G7


Emmanuel Macron era, talvez, a pior escolha de Jair Bolsonaro para entrar em confronto em torno do tema das queimadas na Amazônia. O presidente francês forma, ao lado da chanceler alemã, Angela Merkel, a dupla dos governantes que conduzem a União Europeia (UE), a despeito das instâncias formais e dos consensos exigidos para as decisões de maior alcance no bloco. Ambos chegam à reunião do G7, no balneário francês de Biarritz, decididos a concatenar uma frente internacional de pressão sobre o governo brasileiro para que tome ações para conter as queimadas na Amazônia.

Discussões técnicas à parte, a disputa político-diplomática está montada. Macron foi o líder europeu que colocou as resistências mais claras à assinatura do acordo comercial recém-acertado entre a União Europeia (UE) e o Mercosul. Indicou, na ocasião do anúncio, que exigiria do novo governo brasileiro uma colocação clara sobre os compromissos com o Acordo de Paris e as metas de redução de emissão de gás carbônico. Deu a entender que poderia pbstruir a ratificação do tratado comercial entre os dois blocos caso não tivesse garantias claras a oferecer à opinião pública francesa sobre a adesão do Brasil aos termos firmados na capital francesa pela antecessora Dilma Rousseff.

Neste fim de semana, em Biarritz, será a hora de vez como o presidente francês e a chanceler alemã, Angela Merkel, reagirão às últimas colocações de Brasília sobre a tragédia ambiental na Amazônia.

Cheque sustado
De imediato, o Planalto e o Itamaraty analisam o impacto prático da suspensão de verbas destinadas pela Alemanha e pela Noruega a programas de preservação ambiental no Brasil. Deixando de lado as declarações do presidente sobre a represália, trata-se de recursos que têm sido essenciais para atividades de preservação do meio ambiente na floresta. Nenhum governo ficaria verdadeiramente feliz ou mesmo aliviado com o cancelamento desses programas.

Encontrar caminhos para contornar o impasse é empreitada que está entre as missões clássicas da diplomacia. No caso, porém, a ação do Itamaraty esbarra nas definições e nos pronunciamentos do Planalto. Mantido o tom de confronto adotado até ontem, será difícil interceder de maneira a acolchoar os atritos entre uma Europa com ecologistas em alta, como mostraram as eleições de maio para o parlamento continental, e um Mercosul que terá em outubro eleições em dois de seus países-membros: a Argentina de Mauricio Macri, aliado de Bolsonaro, mas sob forte desafio da oposição peronista, e o Uruguai, onde o último governo de esquerda remanescente no bloco enfrenta uma parada difícil contra a direita.

Linguagem diplomática
Em meio ao impacto da crise provocada pelas queimadas, a resposta intempestiva do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) ao presidente francês mereceu comentário irônico de um diplomata insatisfeito com os rumos do Itamaraty sob o novo governo. Pelo Twitter, o ;filho 03;, indicado pelo pai para ocupar a Embaixada do Brasil em Washington, classificou o presidente francês como ;idiota;. Sob forte contestação pela falta de experiência diplomática, sem falar nas restrições ao que adversários apontam como um ato de nepotismo, Eduardo e o pai se aferram à nomeação com base em alegada proximidade com a família de Donald Trump, além da familiaridade construída com o país em um período passado em intercâmbio.

;Bom, de uma coisa ninguém pode mais duvidar;, comentou o diplomata, algo incrédulo depois de ter lido tuíte disparado contra Emmanuel Macron. ;Ele (Eduardo) provou que é fluente na língua dos Trump;.

;É nossa;
A linha de tensão com as críticas externas sobre a condução do delicado tema do desmatamento não foi inaugurada pelo governo Bolsonaro. Desde os anos 1970, a esquerda brasileira levantou o slogan ;A Amazônia é nossa;. No caso, para condenar a ocupação de vastas regiões da floresta por grnades empreendimentos agropecuários concebidos por multinacionais, em especiais americanas. O ícone desses programas era o Projeto Jari, que ocupava a área de vários municípiosno Amapá. Na ocasião, com o país sob regime militar, a campanha fez parte da contestação a um modelo de exploração da região considerado lesivo não apenas ao meio ambiente, mas também à soberania nacional.

Mais recentemente, por volta de 2009, quando o Brasil se via sob pressão nas negociações que resultaram no Acordo de Paris sobre o aquecimento global, Lula reagiu irritado, durante almoço oferecido no Itamaraty a um governante estrangeiro, diante de um relatório de ONG europeia sobre o desmatamento na Amazônia. ;Eles queimaram tudo de floresta que tinham e agora querem vir dar lição pra gente?;, disparou o então presidente.

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