postado em 25/08/2019 04:05
Segundo Martha Medeiros, atualmente, ;é um luxo poder sofrer sem ter ninguém nos observando;. A frase da escritora brasileira pode ser usada para resumir a influência das redes sociais no cotidiano. As plataformas tecnológicas têm sido usadas para compartilhar exaustivamente momentos felizes, mas a tristeza não é totalmente ofuscada, segundo cientistas norte-americanos. Em um estudo, pesquisadores concluíram que pessoas que postam muitas selfies são vistas como mais inseguras e menos agradáveis por outros usuários da rede. Outra equipe concluiu que grande parte dos adultos que faz postagens sobre o uso de drogas acaba se arrependendo, o que pode maximizar os danos causados pelos entorpecentes. Para especialistas, resultados como esses reforçam a necessidade de uma maior atenção à forma como temos nos comportado nas redes virtuais.
Pesquisadores da Universidade Estadual de Washington estudaram o efeito das famosas selfies por cinco anos. Eles suspeitavam que os autores das imagens poderiam sofrer algum tipo de efeito comportamental em decorrência das postagens. ;Em nossos trabalhos anteriores sobre esse tipo de foto tão comum, nos concentramos em saber se a autopercepção estava relacionada à publicação, mas não encontramos muitas relações. Então, nos perguntamos se a percepção de quem via essas fotos sofreria alguma alteração;, conta ao Correio Chris Barry, professor do Departamento de Psicologia da universidade e principal autor do estudo, publicado, na última terça-feira, no Journal of Research in Personality.
Chris Barry e seus colegas analisaram dados de dois grupos de estudantes. O primeiro era composto por 30 alunos de graduação de uma universidade pública no sul dos Estados Unidos. Eles foram convidados a preencher um questionário de personalidade e concordaram em deixar os pesquisadores usarem as 30 postagens mais recentes em uma rede social de exposição de fotos. As postagens foram divididas em selfies e poses normais. O segundo grupo tinha 119 alunos de graduação de uma universidade no noroeste do país. Para eles, os cientistas pediram que classificassem os perfis de fotos do primeiro grupo considerando 13 atributos ; entre eles, autoabsorvido (focado em si), baixa autoestima, extroversão e sucesso.
A análise mostrou que os estudantes que postaram mais fotos com poses eram vistos como relativamente mais autoconfiantes, mais aventureiros, menos solitários, mais extrovertidos, mais confiáveis, mais bem-sucedidos e com alto potencial de ser um bom amigo. O inverso foi registrado com relação aos participantes que tinham publicado um número maior de selfies. ;Em outras palavras, postar selfies pode não informar muito sobre a personalidade ou os motivos de quem publicou. Mas há o risco de haver percepções ou julgamentos de terceiros em relação a esse comportamento;, detalha Chris Barry.
O autor do estudo ressalta que os questionários de personalidade resultaram em classificações negativas para os respondentes que postavam mais fotos com culto à aparência física, como realizando uma flexão no espelho. O estudo mostrou ainda que os alunos do primeiro grupo classificados pelos do segundo grupo como altamente autoabsorvidos tenderam a ter mais seguidores na rede social, e também seguiam mais usuários. ;Uma das coisas que devemos ressaltar é que nenhum desses estudantes se conhecia ou estava ciente do número de seguidores das pessoas que estavam avaliando, o que ajuda a dar mais validade aos nossos dados;, ressalta Chris Barry.
Contrastes
Para o psicólogo Vladimir Melo, a pesquisa mostra dados interessantes e um contraste inesperado. ;O estudo permite compreender a contradição que existe entre a exposição dos jovens nas redes sociais e o ponto de vista crítico que eles adotam observando os seus pares;, explica. O especialista também observa que, mesmo com uma ;imagem negativa;, o compartilhamento de imagens é mantido. ;A exposição gerada pelo excesso de selfies tem resultados negativos para a imagem dos jovens dentro de um grupo, mas isso não inibe esse comportamento. As pessoas, em geral, reconhecem o prejuízo pela excessiva exposição de dados e da própria imagem na internet, mas têm dificuldade de se relacionar fora dessas redes;, diz.
Para os autores do estudo, as reações geralmente positivas às fotos postadas podem ter ocorrido devido ao fato de as imagens parecerem mais naturais, similares à forma como as pessoas são vistas na ;vida real;. A equipe, porém, não descarta a contribuição de outros fatores e ressalta que os resultados obtidos podem ter efeitos práticos. ;Embora as descobertas sejam apenas uma pequena peça do quebra-cabeça, elas podem ser importantes. A pessoa pode se lembrar delas antes de fazer o próximo post;, ilustra Chris Barry. ;Mesmo que não tenhamos a intenção de que uma publicação seja percebida pelos outros de uma certa maneira, é interessante sabermos que certas sugestões em nossas postagens podem estar relacionadas ao modo como nossos seguidores/amigos nos percebem;, complementa.
Segundo Vladimir Melo, a exposição excessiva pode se tornar um problema para a imagem de quem está nas redes sociais. ;Isso faz com que as pessoas busquem novas atrações, novos espetáculos, pois se trata de um meio extremamente volátil. Encontrar a medida certa de exposição na rede social se tornou um trabalho, por exemplo, para muitos influenciadores, que criam cada vez mais recursos para manter a atenção dos internautas. Portanto, permanecer sempre em evidência e sem entediar é um desafio para quem busca reconhecimento no mundo virtual;, frisa.
O especialista brasileiro também acredita que o tema merece ser mais investigado. ;O estudo ajuda a compreender como as pessoas se percebem nas redes sociais, mas essa ainda é uma questão recente, que precisa ser analisada profundamente. De qualquer modo, esses são dados preciosos, que podem ser usados para aperfeiçoar as redes sociais;, diz.
Para o psicólogo, a análise do comportamento on-line pode contribuir para a pesquisa.;A tecnologia vem sendo bem explorada para influenciar as pessoas e tem sido decisiva, por exemplo, em eleições e na economia mundial. É difícil dizer onde a tecnologia não influencia. O interesse maior, para os pesquisadores, é saber como ocorre essa influência e que tipo de ganhos ela pode proporcionar;, diz.
"As pessoas, em geral, reconhecem o prejuízo pela excessiva exposição de dados e
da própria imagem na internet, mas têm dificuldade de se relacionar fora dessas redes;
da própria imagem na internet, mas têm dificuldade de se relacionar fora dessas redes;
Vladimir Melo, psicólogo