postado em 30/08/2019 04:06
Partidários e adversários do Brexit mobilizam suas forças e traçam planos para a batalha política e jurídica que se anuncia para a semana que vem em torno da suspensão das sessões do parlamento britânico entre setembro e outubro. A oposição trabalhista e grupos de ativistas convocaram manidestações para amanhã, em Londres e outras cidades, em protesto contra o que chamam de ;golpe; do primeiro-ministro Boris Johnson, determinado a garantir que o Reino Unido saia da União Europeia (UE) na data marcada ; 31 de outubro ;, com ou sem acordo. Os deputados retornam das férias de verão na próxima terça-feira, mas terão apenas uma semana para tentar reverter o recesso requerido por Johnson e formalizado pela rainha Elizabeth II. Caso contrário, a Câmara dos Comuns só voltará a se reunir em 14 de outubro, quando faltarão duas semanas para que o ;divórcio; seja consumado.
Na frente legal, foi encaminhada aos parlamentares uma petição com mais de 1,5 milhão de assinaturas, 15 vezes o mínimo necessário para que seja colocada em pauta. Ela pede que a sspensão das sessões seja anulada para que a Câmara dos Comuns tenha tempo hábil para decidir sobre o Brexit. A empresária Gina Miller, ativista pela permanência do país na UE, entrou com petição na Justiça denunciando a manobra do premiê como ;manifestamente utilizada para impedir o parlamento de legislar; sobre o tema. Uma audiência foi marcada para a próxima sexta-feira, mas um grupo de 75 legisladores pró-UE apresentaram apelo ao principal tribunal da Escócia para que seja marcada uma audiência urgente, em data anterior.
Da Escócia, onde a maioria votou contra o Brexit no referendo de 2016, que aprovou a separação, veio ontem uma notícia ruim para Boris Johnson, que assumiu no fim de julho a liderança do Partido Consevador e, por extensão, a chefia do governo. A líder dos tories (como são chamados) na região, Ruth Davidson, que se opõe ao Brexit sem acordo, anunciou sua demissão do cargo. Alegou ;razões políticas e familiares;, mas não deixou dúvidas sobre a crise e renovou o apelo ao premiê para que evite um ;divórcio litigioso; com a UE.
Na frente parlamentar, o líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, articula os demais adversários do ;Brexit duro; em duas linhas de ação que possam permitir um novo adiamento do prazo fatal de 31 de outubro. Com apenas uma semana de sessões antes do recesso e mais duas no retorno aos trabalhos, parece difícil conseguir propor, debater e aprovar uma legislação que vete ao governo conduzir a saída da UE sem acordo. A outra possibilidade derrubar Johnson por meio de uma moção de desconfiança. Embora mais simples na tramitação, ela dependeria de uma maioria com que a oposição ainda não conta.
Na avaliação do ex-ministro da Justiça David Gauke, um conservador que se opõe ao Brexit sem acordo, a semana entre 3 e 10 de setembro será ;a única oportunidade; para barrar os planos de Boris Johnson. ;As opções se afunilaram, e isso sugere que temos de fazer alguma coisa antes que seja tarde.;
Análise da notícia
Jogada de
duas mãos
Silvio Queiroz
Com a ousada manobra de forçar um recesso do parlamento por cinco semanas, no período mais crítico da marcha para o Brexit, Boris Johnson parece jogar uma partida de pôquer em duas mesas.
Na frente doméstica, fecha portas para os que tentam impedi-lo de cumprir a promessa que o levou à liderança do Partido Conservador e à chefia de governo ; a assegurar que em 31 de outubro o Reino Unido estará fora da União Europeia, com ou sem acordo. Na prática, deixou os adversários sem tempo para aprovar uma lei que obrigue o governo a pedir novo adiamento no prazo. Assumiu o risco de ver seu apoio parlamentar se erodir e seu governo ser derrubado, com ou sem Brexit.
Paralelamente, nas cinco semanas de recesso parlamentar, poderá desafiar o comando da UE a alterar o acordo negociado com a antecessora, Theresa May, e recusado três vezes pelos deputados. Em troca, oferecerá a possibillidade de obter apoio para a proposta, ainda que isso exija uma breve prorrogação do prazo. Caso não receba de Bruxelas uma resposta afirmativa, terá na manga a carta de empurrar para o outro lado a responsabilidade pelas consequências de um ;divórcio litigioso;.