postado em 03/09/2019 04:06
"Eu não quero uma eleição, vocês não querem uma eleição;
;Eu quero que todos saibam que em circunstância alguma pedirei a Bruxelas um adiamento (do Brexit);
Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido
Não bastou suspender a Câmara dos Comuns, a câmara baixa do Parlamento, para dificultar a aprovação de pacto sobre o Brexit ; a saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Horas depois de ameaçar um expurgo de parlamentares conservadores que votarem contra um divórcio sem acordo, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, avisou que declarará eleições legislativas antecipadas para 14 de outubro, se o Parlamento impuser uma derrota ao governo. A expectativa é de que vários deputados tories (conservadores) votem com a oposição, hoje, em prol do adiamento do Brexit. Eles esperam postergar a separação até 31 de janeiro. ;Eu não quero uma eleição, vocês não querem uma eleição;, declarou o premiê.
Johnson advertiu que, caso os tories escolham bloquear o chamado Brexit duro (sem acordo), ;claramente cortarão as pernas da posição do Reino Unido;. A impressão dentro do próprio governo é a de que uma derrota nesta terça-feira ;destruiria; sua capacidade de negociação e tornaria impossível Londres costurar um pacto com Bruxelas.
O primeiro-ministro também reiterou que não pedirá um novo adiamento do Brexit ; o prazo para o divórcio expira em 31 de outubro, com ou sem acordo. ;Eu quero que todos saibam que em circunstância alguma pedirei a Bruxelas um adiamento (do Brexit);, afirmou. De acordo com a emissora britânica BBC, os parlamentares podem tentar introduzir uma legislação para frustrar um Brexit sem acordo; convocar um voto de desconfiança contra Johnson; ou permitir que o governo tente negociar um novo pacto com a União Europeia.
Antes de uma reunião de emergência de seu gabinete, Johnson admitiu que as chances de um acordo aumentaram. ;Mas, se há algo que pode nos impedir nessas negociações, é a sensação em Bruxelas de que os deputados podem encontrar uma maneira de cancelar o referendo, ou que amanhã (hoje) os deputados votem com o (opositor) Jeremy Corbyn a favor de outro adiamento sem significado;, explicou o premiê. ;Se fizerem isso, toda nova negociação será absolutamente impossível;, acrescentou. Corbyn, líder do Partido Trabalhista, acusou o chefe de governo de ameaçar a própria população. ;O que Boris Johnson fez foi essencialmente ameaçar o povo. Ameaçar o povo com um Brexit sem acordo, se ele não conseguir o que deseja no Parlamento. Nós os desafiaremos no Parlamento amanhã (hoje), e continuaremos com esse desafio;, prometeu o opositor.
Escolha
Para Thomas Eason, doutorando da Faculdade de Política e de Relações Internacionais da Universidade de Nottingham (Reino Unido), todos os indicadores apontam que Johnson se prepara para eleições antecipadas. ;A questão real é se ele tentará convocar o pleito (isso requer maioria de dois terços na Câmara dos Comuns) ou se os parlamentares da oposição buscarão forçar um voto de desconfiança (o qual exige maioria simples. A resposta é incerta. Os parlamentares da oposição que pretendem bloquear o Brexit não têm muito tempo para agir;, disse ao Correio. O especialista lembra que um número cada vez maior de deputados apoia a permanência na UE. ;À medida que o tempo passa, um Brexit sem acordo parece o resultado mais provável desse fiasco.;
Eason reforça que o expurgo de parlamentares contrários ao Brexit duro pode ser contraproducente e prejudicar o próprio governo. Isso porque, segundo ele, o premiê detém maioria ínfima na Câmara dos Comuns. ;Em caso de rebelião de alguns deputados, tal maioria desaparecerá. A expulsão de conservadores significaria a remoção da maioria governista e minaria a capacidade de Johnson de governar;, explicou. O analista acredita que tal manobra aumenta a expectativa de que o premiê estaria pronto para uma eleição, na expectativa de reconquistar esta maioria.
Por sua vez, Anthony Glees ; professor da Universidade de Buckingham ; espera que Johnson firme um novo acordo com Bruxelas antes de 31 de de outubro. ;Ele pretende se manter como premiê pelos próximos 10 ou 20 anos. A curto e a médio prazos, especialmente no caso de um Brexit sem acordo, a escassez de alimentos e de medicamentos arruinará as suas chances de ganhar uma eleição;, afirmou à reportagem. ;O Reino Unido é um país onde pessoas telefonam para a polícia se o entregador da pizza se atrasa por 10 minutos. A escassez de alimentos por uma semana causará inquietação social significativa.; Glees acredita que Johnson tem cometido muitos erros e cita a suspensão do Parlamento como o mais grave. ;A soberania parlamentar é um princípio da Constituição do Reino Unido e torna o Parlamento a autoridade legal suprema. Johnson atacou o sistema e causou profundo embaraço na rainha Elizabeth II. Isso não é nada bom.;
Pontos de vista
Por Thomas Eason
Divórcio litigioso
;O premiê afirmou que um acordo é possível, mas foi enganoso ao dizer isso. O Reino Unido e a União Europeia (UE) negociaram um pacto para o divórcio, durante o governo de Theresa May. O Parlamento rejeita o acordo, e a UE tem sido clara que não está disposta a negociar novo pacto. Por isso, restam as opções de permanência no bloco ou de Brexit sem acordo. Se os parlamentares não aprovarem o acordo, o Reino Unido sairá da UE sem um pacto. Esta parece a opção preferida de Johnson.;
Doutorando da Faculdade de Política e de Relações Internacionais da Universidade de Nottingham (Reino Unido)
Por Andrew Blick
Aposta nas urnas
;Johnson ameaça os deputados com uma eleição antecipada se votarem em um projeto de lei destinado a bloquear o Brexit sem acordo. Para ele, uma eleição geral antecipada pode não ser uma perspectiva ruim, pois há pelo menos uma chance de que o premiê ganhar maioria absoluta. A maior preocupação para Johnson é perder votos no Parlamento, especialmente na Câmara dos Comuns. Sua posição no Partido Conservador parece, pelo menos por agora, segura. ;
Diretor do Centro para Política e Governo Britânicos e do Departamento de História e Política do King;s College London
Por Anthony Glees
Alienação partidária
;A ideia de expurgo de parlamentares conservadores, por parte de Boris Johnson, foi tola. Principalmente pelo fato de a maior parte de seu gabinete ter votado contra o próprio partido. O premiê parece pronto a arriscar uma ruptura com o Partido Conservador, e isso não será bom para a moral da legenda. Ao mesmo tempo, Johnson terá fortalecido a oposição entre os conservadores. O primeiro-ministro tem sido criticado pelos adeptos de um Brexit sem acordo, pelos simpatizantes do Brexit e por aqueles que desejam a permanência no bloco.;
Professor da Universidade de Buckingham (Reino Unido)
Por Rob Dover
Manobra esperta
;Foi uma manobra esperta de Johnson. A oposição deverá apoiar a eleição, e ela tem acenado positivamente em relação a isso. No entanto, uma eleição em outubro seria apresentada como uma escolha binária entre o Brexit e um governo de Jeremy Corbyn (algo que não atrairá um imenso apoio). A noção de um acordo ser algo possível é ilusória: nem Johnson nem sua equipe de conselheiros desejam isso. É difícil determinar se Johnson está incitando os parlamentares a encerrar o governo e forçar uma eleição, ou se ele tenta enfrentar os rebeldes.;
Professor de inteligência e segurança nacional pela Universidade de Leicester
33%
Intenção de votos para os conservadores em uma eventual eleição, contra 22% para os trabalhistas, segundo pesquisa do instituto YouGov