Ativistas pró-democracia, legisladores de oposição e até mesmo políticos próximos ao governo pró-chinês de Hong Kong receberam com ceticismo e frieza o anúncio da chefe do Executivo local, Carrie Lam, que retirou definitivamente de tramitação um projeto de lei que permitiria a extradição de presos para a China continental. O texto, proposto em junho, deflagrou a mais séria onda de protestos no território desde que foi reincorporado à soberania de Pequim, em 1997, com status especial e relativa autonomia, após 150 anos como colônia britânica. Ontem, em meio às reações desfavoráveis, a governadora pediu a abertura de diálogo com os manifestantes.
;Se ela tivesse retirado o projeto de lei dois meses atrás, isso poderia ter significado uma solução rápida para o conflito;, disse uma ativista durante o que chamou de ;entrevista coletiva cidadã;. Emcapuzada, para preservar a própria identidade, ela lembrou que, desde o início dos protestos, o governo local e as forças de segurança promoveram uma escalada de repressão, com violência generalizada e centenas de prisões. ;Colocar um curativo meses depois, com a carne já em putrefação, não vai sarar a ferida.;
A retirada do projeto sobre as extradições atende a apenas uma das reivindicações que o movimento pró-democracia levanta agora, depois de 10 semanas ininterruptas de confrontos. As demais são: uma investigação independente sobre a violência cometida pelas forças de segurança; anistia para os manifestantes detidos; o fim do uso da palavra ;amotinados; para classificar os ativistas; e a instauração do sufrágio universal direto na cidade ; esta última, inadmissível para o regime comunista de Pequim.
;Radicais;
Lam não acenou com concessões sobre as outras demandas, mas apresentou a retirada do projeto como um gesto destinado a ;apaziguar por completo as preocupações da população;, e propôs aos manifestantes que tomem distância do que qualificou como a ;ala radical; do movimento, um setor ao qual o funcionário de Pequim encarregado de Hong Kong chegou a se referir como ;terrorista;. ;Devemos substituir os conflitos pela conversa e buscar soluções;, insistiu a governadora. Lam se disse determinada a ;impedir a violência, acabar com o caos, restabelecer a ordem social e ajudar nossa economia a progredir;.
A despeito do apelo, convocações para novos protestos foram publicadas em fóruns on-line usados pelos manifestantes. Algumas das mensagens chamavam a interromper os transportes, em especial a ligação com o aeroporto internacional, que está entre os 10 mais movimentados do mundo e chegou a ficar interditado por alguns dias, sob ocupação de ativistas. ;Cinco exigências principais, nem uma a menos. Libertem HK (Hong Kong), revolução agora!”, dizia uma das convocatórias, amplamente difundida pelo aplicativo Telegram.
O Legislativo local é parte do status especial reservado à cidade pelo acordo que permitiu a sua reincorporação à soberania chinesa. Mas, embora tenha relativa autonomia administrativa, a Assembleia tem parte de seus integrantes indicados diretamente por Pequim, de maneira a manter uma maioria favorável ao regime comunista ; que também controla a escolha do chefe do Executivo. A eleição direta para o governo local, sem limitações e imposições, tornou-se uma demanda central do movimento pró-democracia.
;Colocar um curativo meses depois, com a carne já em putrefação, não vai sarar a ferida;
Um dos manifestantes, durante entrevista coletiva
;Devemos substituir os conflitos pela conversa e buscar soluções;
Carrie Lam, chefe do Executivo de Hong Kong