Agência France-Presse
postado em 10/09/2019 10:37
O Parlamento britânico foi suspenso nesta terça-feira (10), uma decisão anunciada como um "ultraje constitucional", mas antes rejeitou - pela segunda vez - o pedido do premiê Boris Johnson de convocar eleições antecipadas para sair do impasse do Brexit.
Por decisão de Johnson, os trabalhos das câmeras baixa e alta foram suspensos esta madrugada e até 14 de outubro, duas semanas antes da data do Brexit, o que seus detratores denunciaram como uma estratégia de mordaça.
A tradicional cerimônia de suspensão, cercada de grande pompa, foi boicotada pela imensa maioria dos Lordes em sinal de protesto, enquanto alguns deputados gritavam "vergonha! vergonha".
"Esta não é uma decisão normal", denunciou John Bercow, presidente da Câmara dos Comuns, que deixará o cargo no dia 31 de outubro, por motivos familiares.
Antes da suspensão, os deputados derrubaram a moção governamental para organizar eleições em meados de outubro, que exigia o apoio de dois terços da Câmara de 650 assentos. A proposta obteve apenas 293 votos favoráveis.
Na quarta-feira passada, os deputados já tinham rejeitado uma primeira proposta neste sentido e, assim como ocorreu naquela ocasião, a maioria da oposição se absteve.
"Não só se negaram a eleger um caminho a seguir, mas agora negaram duas vezes ao povo britânico o direito a se expressar em uma eleição", denunciou um Johnson cada vez mais encurralado.
Após meses pedindo eleições, a oposição agora vê o risco de uma "armadilha" de Johnson ou de que os eleitores pró-Brexit reforcem o Partido Conservador para não ter que pedir um novo adiamento para sair da União Europeia.
"Apoiaremos eleições quando estiver claro que evitaremos sair abruptamente" da UE, afirmou o líder trabalhista Jeremy Corbyn.
Johnson chegou ao poder em julho, prometendo que tiraria o Reino Unido do bloco em 31 de outubro a qualquer preço.
Mas diante do temor de um Brexit caótico sem acordo, os legisladores aprovaram em caráter de urgência na semana passada uma lei que o obriga a pedir uma nova prorrogação se até 19 de outubro não alcançar um acordo aceitável com Bruxelas ou obter luz verde do Parlamento para uma saída brusca.
O texto entrou em vigor nesta segunda-feira com a aprovação formal da rainha Elizabeth II.
Além de evitar um Brexit sem acordo, eleições após a prorrogação teriam a vantagem para a oposição de colocar Johnson diante dos eleitores tendo descumprido sua grande promessa.
Mas o primeiro-ministro voltou a insistir nesta segunda-feira: "Não pedirei outro adiamento". Isto alimenta especulações sobre suas opções. Demitir-se? Ignorar a lei e acabar perante os tribunais?
"Nenhuma proposta ;realista;"
Em um novo golpe para o premiê, os deputados também aprovaram nesta segunda-feira exigir ao governo que publique seus documentos confidenciais sobre um Brexit sem acordo e comunicações privadas, inclusive mensagens de texto, entre funcionários governamentais sobre seus planos de suspensão do Parlamento.
Por decisão de Johnson, as duas câmaras serão fechadas entre a madrugada desta terça e 14 de outubro, duas semanas antes da data para o Brexit, o que seus críticos denunciaram como uma estratégia para amordaçá-los.
A tradicional cerimônia de suspensão, cercada de grande pompa, será boicotada por vários Lordes em sinal de protesto.
Para adicionar drama na situação do Parlamento, John Bercow, que presidiu a Câmara dos Comuns nos últimos 10 anos e qualificou a suspensão parlamentar de "ultraje constitucional", anunciou que deixará o cargo até 31 de outubro, alegando vagos motivos familiares.
Johnson, que expulsou do seu partido 21 deputados rebeldes, perdeu a maioria parlamentar sete semanas depois de chegar ao poder e esperava que as eleições lhe dessem um mandato antes do Conselho Europeu de 17 e 18 de outubro, no qual esperava arrancar um novo acordo dos 27 parceiros da UE.
Mas estes afirmam que o Reino Unido não apresentou alternativas reais ao Tratado de Retirada, assinado por May em novembro e rejeitado três vezes pelo Parlamento.
A UE não recebeu até o momento nenhuma proposta "realista" de Londres, afirmou o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, em uma coletiva de imprensa conjunta com Johnson em Dublin pela manhã.
Johnson pediu à UE para eliminar do acordo a "salvaguarda irlandesa", um mecanismo para evitar uma nova fronteira na ilha da Irlanda que ameace o frágil acordo de paz de 1998, que pôs fim a três décadas do sangrento conflito na Irlanda do Norte.
O Executivo britânico propõe substituí-la por "acertos alternativos", mas ainda deve detalhar em que consistirão.
"Apresentaremos ideias, temos tempo para fazê-lo e o abordaremos com muito entusiasmo", afirmou Johnson em Dublin.
Mas a verdade é que o Reino Unido não está sequer certo de que a UE vai lhe conceder uma nova prorrogação. Todo novo adiamento deve ser aprovado por unanimidade pelos outros 27 países-membros da UE e o chanceler francês, Jean-Yves le Drian, advertiu que nas "circunstâncias atuais", a resposta de Paris seria "não".