Agência France-Presse
postado em 15/09/2019 19:23
O empresário detido Nabil Karoui e o universitário Kais Saied, dois candidatos antissistema, afirmam ter passado para o segundo turno das eleições na Tunísia, após terem sido encerradas as votações neste domingo (15), marcadas pela fraca participação.Segundo os institutos de pesquisa privados Sigma Conselho e Emrhod, Saied estaria à frente, com 19% dos votos, enquanto Karoui, empresário da mídia acusado de lavagem de dinheiro, teria obtido 15%.
Se forem confirmados, estes resultados representarão um verdadeiro terremoto para a classe política no poder desde a revolução de 2011, e abrirão um período de forte incerteza neste país pioneiro da Primavera Árabe.
Os resultados oficiais preliminares serão anunciados na terça-feira pela Isie, instância encarregada da organização das eleições.
O magnata e o ;Robocop;
"É um dia extraordinário para a democracia e para a história do país", escreveu Karoui em uma carta lida por sua esposa, Salwa Smaoui, no quartel-general do seu partido, Qalb Tounes."Esperamos que seja libertado amanhã (segunda) e possa fazer campanha", acrescentou a mulher.
Karoui, de 56 anos, ganhou popularidade nos últimos anos organizando distribuições de alimentos e eletrodomésticos, atos divulgados pela emissora de televisão que ele mesmo fundou, a Nessma.
Seus críticos o veem como um mafioso, inspirado no ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, enquanto seus simpatizantes destacam o fato de ter percorrido a Tunísia mais desfavorecida como nenhum outro dirigente político.
Mas faltando apenas dez dias para o início da campanha eleitoral, Karoui foi detido no âmbito de uma investigação por lavagem de dinheiro e evasão de divisas desde 2017.
Seu adversário, o acadêmico independente Saied, de 61 anos, apelidado de "Robocop" por sua dicção dura e suas feições impassíveis, reivindicou ter sido "o primeiro do primeiro turno".
"Se for eleito presidente, vou executar o meu programa", disse à AFP, em um pequeno apartamento deteriorado do centro de Túnis, cercado por 15 pessoas que participaram de sua campanha.
Conhecido pelos tunisianos por comentar a situação política do país nos programas de TV desde a revolução de 2011, Saied não tem partido e nunca havia disputado uma eleição.
Segundo as pesquisas, o primeiro candidato do partido de viés islamita Ennahdha, Abdelfattah Mourou, aparece em terceiro lugar, com 11% a 12% dos votos, muito à frente do primeiro-ministro Youssef Chahed, com 7% a 8%.
Teste democrático
Sete milhões de pessoas foram convocadas a eleger seu próximo presidente entre 26 candidatos neste primeiro turno da segunda eleição presidencial livre desde a revolução de 2011.A participação foi de 45,02%, segundo a Isie, qualificando-a de "aceitável". Em 2014, nas primeiras eleições livres da Tunísia, a mesma foi de 64% no primeiro turno.
Enquanto nas eleições de 2011, a questão era o apoio ou o repúdio à revolução, e em 2014 a questão-chave fosse o apoio ou não aos islamitas, desta vez alguns candidatos tentaram se apresentar como "antissistema", como forma de se diferenciarem de uma elite política desacreditada pelas disputas, o que favoreceu o aparecimento de figuras independentes.
"É sinal de uma profunda desavença, o desgaste com uma classe política que não respondeu às expectativas econômicas e sociais", declarou à AFP o cientista político Hamza Meddeb.
A principal preocupação dos tunisianos é a crise social, em um país em que o desemprego corrói os sonhos de muitos jovens e a inflação pesa em rendimentos já baixos.
O primeiro-ministro Youssef Chahed se vê limitado pelo controverso balanço de seus três anos no poder, marcados por uma clara melhora da segurança, mas também pela queda no poder aquisitivo dos tunisianos.
Estas eleições "são um teste para a jovem democracia tunisiana, pois poderia ter que aceitar a vitória de um candidato que gere divisão", afirmou a pesquisadora Isabelle Werenfels.
Durante o dia de votação foram mobilizados 70.000 membros das forças de segurança, segundo o ministério do Interior, e milhares de observadores foram enviados por partidos e instituições internacionais aos centros de votação.
Agora, os partidos têm o desafio de preparar simultaneamente as legislativas de 6 de outubro e o segundo turno das presidenciais antes de 23 de outubro.