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Grito pelo planeta

Mais de 4 milhões de pessoas em 156 países participam do maior protesto da história. Greve para conscientizar adultos sobre riscos do aquecimento global foi organizada pela sueca Greta Thunberg, 16 anos, que comparou a Terra a "casa em chamas"

postado em 21/09/2019 04:15
Em Bruxelas, belgas lotaram avenidas do centro














Foi um dia para entrar na história. Em 156 países de todos os continentes, cerca de 4 milhões de manifestantes ; em sua maioria estudantes ; atenderam ao apelo da jovem ativista sueca Greta Thunberg, 16 anos, e tomaram as ruas com um objetivo: conscientizar os adultos sobre a urgência de agir contra o aquecimento global e de tratar a crise climática como uma obrigação ética. A greve global pelo clima ocorreu a três dias da Cúpula de Ação Climática, organizada pelas Nações Unidas, em Nova York. ;As cifras são incríveis, quando você vê as imagens, é difícil de acreditar. Espero que seja um ponto de inflexão para a sociedade, que mostre quantas pessoas estão envolvidas, quantas pessoas estão pressionando os líderes, especialmente antes da cúpula climática da ONU;, declarou Greta à agência France-Presse. Entidades humanitárias, organizações ambientais e companhias privadas se uniram aos mais de 5 mil protestos, que ecoaram o grito pelo planeta desde as remotas ilhas do Pacífico, como Kiribati e Vanuatu, até as metrópoles dos Estados Unidos e da Europa.

Em Islamabad, capital do Paquistão, coube à ativista Manahil Qader, 14 anos, organizar os protestos em 25 cidades, os quais reuniram 100 mil pessoas. ;Vejo essa greve global como uma faísca que mudará o mundo e fará diferença. Esse movimento visa pedir aos líderes mundiais para que atuem contra as mudanças climáticas. Também pretende espalhar a consciência nos países desenvolvidos;, declarou ao Correio. Ela contou que iniciou a mobilização no país em dezembro de 2018. ;Conversei com as pessoas e conseguimos entre 4 mil e 5 mil pessoas em Islamabad.;

Vice-presidente da Federação de Estudantes da Universidade do Chile, Nicole Andrea Martínez Aranda, 29, integrou o grupo de ativistas responsáveis pelos protestos de ontem. ;Em âmbito mundial, vemos como estão surgindo distintos movimentos socioambientais. Apesar da diversidade muito positiva, eles trazem um desafio: tirar a responsabilidade dos ombros dos jovens e comprometer a sociedade inteira;, disse à reportagem. Segundo Aranda, todas as gerações são responsáveis pelas mudanças climáticas, pois os efeitos das decisões já impactam a sociedade. ;Creio que o principal é o que defende Greta ; uma luta pacífica, pois tudo tem a ver com o modelo extrativista e neoliberal.; Ela estima em 15 mil os manifestantes em Santiago e centenas de milhares em todo o país.

A criatividade marcou várias das manifestações. Em Berlim, diante do Portão de Brandemburgo, ativistas simularam um triplo enforcamento, com os corpos apoiados sobre blocos de gelo. Enquanto 270 mil alemães cobravam uma postura mais incisiva do governo, a chanceler Angela Merkel prometia pelo menos 100 bilhões de euros para 2030, a fim de enfrentar as emissões nos setores energético e industrial, promover os carros elétricos e incentivar o uso do trem no lugar do avião. Em Tóquio, quase 3 mil pessoas protestaram de maneira pacífica. ;O que nós queremos? Justiça climática! Quando queremos? Agora!”, gritaram os participantes. Em Sydney, moradores de ilhas do Pacífico ; que correm o risco de desaparecer por causa do aquecimento global ; protestaram vestidos a caráter. Cerca de 350 mil pessoas protestaram na Austrália, a maior ação climática da história do país.


Discurso
Sob aplausos e bastante ovacionada, Greta Thunberg fez um discurso, no fim da tarde, em Nova York. ;Em todo o mundo, cerca de 4 milhões estiveram em greve, e ainda estamos contando os números. Esta é a maior greve climática de todos os tempos e todos devemos nos orgulhar de nós mesmos, pois fizemos isso juntos;, disse. ;Não estamos na escola hoje e dessa vez não estamos sozinhos. Temos adultos que não estão no trabalho. E por quê? Porque esta é uma emergência. Nossa casa está em chamas. E não é apenas a casa dos jovens. Nós todos vivemos aqui, isso afeta a todos nós. Não ficaremos de lado e assistiremos a isso.; De acordo com Greta, os olhos do planeta estarão sobre os líderes mundiais na cúpula da ONU. ;Estamos fazendo isso para fazê-los com que acordem, para que ajam. Merecemos um futuro seguro e exigimos um futuro seguro. Isso é pedir muito?;

Em entrevista ao Correio, por telefone, o indiano Rajendra Pachauri, ex-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e Prêmio Nobel da Paz em 2007, advertiu que a humanidade tem uma ;janela de oportunidade muito pequena;. ;Continuo afirmando às pessoas que temos dois minutos para a meia-noite. Se não agirmos imediatamente, teremos sérios problemas com o planeta;, disse. ;O Brasil certamente pode mostrar o caminho, pois vocês têm um enorme potencial técnico e energia hidrelétrica. O que vocês precisam é de escutar as vozes dos povos indígenas. Vocês não podem permitir que a Amazônia seja destruída da forma como está sendo feita.;

De acordo com as últimas estimativas publicadas pela ONU, para se ter alguma chance de conter o aquecimento global em 1,5; grau Celsius acima da temperatura média do século 19, o mundo teria de zerar as emissões de carbono até 2050.


;Espero que este seja um ponto de inflexão para a sociedade, que mostre quantas pessoas estão envolvidas, quantas essoas estão pressionando os líderes, especialmente antes da cúpula climática da ONU;
Greta Thunberg, 16 anos, ativista sueca


Duas perguntas para

Rajendra Pachauri, ex-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e Prêmio Nobel da Paz em 2007


Como o senhor vê a greve global contra a mudança climática?
Eu acho que esta greve global é um episódio maravilhoso, mas eu apenas espero que ela leve a alguma ação. É muito bom despertar a consciência, protestar e se engajar em greves. No entanto, em última análise, nós precisamos de uma ação muito urgente. Espero que algo surja disso. É particularmente notável o fato de esse movimento ter sido iniciado pelos jovens do mundo. Eu acredito que os jovens é quem farão a diferença. Por essa razão, nós lançamos, em 2016, o movimento pop ;Protejam o nosso planeta;, que tem recebido muita atenção e esforços de jovens interessados em tentar reduzir a emissão de carbono. É disso que precisamos.

O mundo não tem feito o suficiente para mitigar os efeitos do aquecimento global?
O mundo não está fazendo o bastante, porque o IPCC fracassou. Nós tivemos de limitar o aumento médio da temperatura em 1,5 grau Celsius até o fim deste século. Qualquer coisa acima disso trará graves riscos para as futuras gerações. Uma razão pela qual acredito não estarmos tomando uma ação é porque temos líderes no mundo que não têm visão. Sinto informar que este é o caso dos presidentes do Brasil e dos Estados Unidos. Também devo enfatizar a existência de muitos lobbies do setor de combustíveis fósseis, bastante ativo, que influenciam o processo político. Por isso, o movimento que vimos hoje (ontem) pode fazer muita diferença. Espero que possa trazer motivação para os tomadores de decisões para agirem. Se não agirmos logo, a humanidade será afetada muito fortemente no futuro. (RC)

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