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Sangue pelos direitos

Protestos contra a corrupção, o desemprego e a escassez dos serviços públicos se espalham e se tornam atos de repúdio ao governo. No quinto dia de levante, repressão deixou 99 mortos e mais de 4 mil feridos. Especialista vê influência do Irã

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 06/10/2019 04:15
Em Bagdá, próximo à Praça Tahrir, manifestantes carregam colega ferido durante confrontos com as forças de segurança: uso de munição letal


Apesar do bloqueio à internet imposto pelas autoridades, os iraquianos buscam formas de romper o silêncio. Com o uso de um servidor VPN ; mecanismo que impede o acesso aos dados por terceiros ;, muitos deles espalharam vídeos e apelos por socorro nas redes sociais. Até o fechamento desta edição, a repressão ao levante popular contra o governo do premiê Adel Abdul Mahdi tinha deixado 99 mortos e cerca de 4 mil feridos, segundo a Comissão Iraquiana Independente de Direitos Humanos. Pelo menos 600 pessoas foram presas. A onda de protestos contra a corrupção, o desemprego e os serviços públicos escassos entrou ontem no quinto dia e se espalhou por sete províncias do sul.

O clérigo xiita Moqtada Al-Sadr, líder religioso influente e cuja coalizão participa do governo, exigiu que Mahdi renuncie e defendeu a realização de eleições antecipadas monitoradas pela Organização das Nações Unidas (ONU). O governo suspendeu o toque de recolher. ;Cinco dias de relatórios de mortos e feridos, isso tem que acabar. Peço a todas as partes uma pausa para refletir;, escreveu no Twitter Jeanine Hennis-Plasschaert, representante especial da ONU no Iraque.

Em vídeo divulgado pelo Twitter, iraquianos se refugiam no chão, junto a um ativista morto, sob uma grande poça de sangue. Mais adiante, outros manifestantes se protegem atrás de um colchão, enquanto se escuta vários tiros. Um segundo vídeo mostra o que seriam soldados quebrando os dedos de um prisioneiro sobre um blindado na Praça Tahrir, em Bagdá.

;As tropas têm adotado força excessiva, com o uso de munição letal e gás lacrimogêneo. Os manifestantes têm protestado contra a falta de serviços básicos, como energia elétrica e água. Desta vez, é diferente. Muitos insistem em uma mudança do regime. Recebemos denúncias de que os responsáveis pelas mortes não são soldados iraquianos, mas milicianos ligados a facções influenciadas pelo Irã;, afirmou ao Correio a jornalista iraquiana Suadad Al-Salhy, correspondente do jornal Arab News em Bagdá, que ontem visitava o Cairo.


;Por favor, façam algo pelo Iraque. Meu povo está em perigo;, desabafou à reportagem a iraquiana Tamara Alazawi, que vive na Turquia e mantém contato permanente com a família em Bagdá. ;Papai me disse que as estradas em Bagdá estão com o tráfego interrompido. Eles cortaram a internet. Não há eletricidade nem água. O gás de cozinha está sendo vendido a preços exorbitantes. As pessoas têm saído às ruas para exigir seus direitos legítimos e são reprimidas por forças ligadas ao Irã.;

Por telefone, Louay Bahry ; ex-professor de ciência política da Universidade de Bagdá ; explicou que, com a ocupação militar dos Estados Unidos, os iraquianos buscavam uma vida melhor, com empregos e mais oportunidades. ;Eles estão muito decepcionados, depois de aguardarem tantos anos. A estrutura do atual governo não conseguiu atender às aspirações do povo. Alem disso, a corrupção é muito grande, o que reduz as oportunidades para que as pessoas tenham trabalho e moradia;, afirmou. Segundo ele, os xiitas, sunitas e curdos não demonstram um senso de cooperação para atuar em prol do Iraque. ;O Irã tem buscado aumentar a influência no vizinho, cooptando políticos. Eu também ouvi relatos de que iranianos, vestidos com uniformes do Exército do Iraque, têm assassinado iraquianos;, acrescentou. Um dos vídeos difundidos pela internet mostra ativistas segurando supostos passaportes iranianos.


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