Agência Estado
postado em 08/10/2019 07:47
Menos de 24 horas depois de o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciar a retirada das tropas que guardavam a fronteira norte da Síria, a Turquia começou a atacar alvos curdos e a milícia Forças Democráticas da Síria (FDS), que se apõem ao ditador sírio Bashar Assad e ocupam posições em território sírio e iraquiano.
No domingo, 6, em uma grande mudança de diretriz, Trump declarou que os EUA não se oporiam a uma operação de Ancara contra os curdos. A decisão conseguiu um fato raro: unir democratas e republicanos contra uma medida da Casa Branca - em um momento delicado, em que Trump enfrenta um processo de impeachment na Câmara dos Deputados.
Ao justificar sua decisão, Trump argumentou que seu objetivo é acabar com as "guerras sem fim" nas quais os EUA estão envolvidos e disse que cabe aos atores da região resolver a situação. Imediatamente, a Turquia informou que preparava um ataque no norte da Síria para "limpar" a região dos "terroristas" que ameaçam sua segurança.
O problema é que os "terroristas" aos quais o governo turco se refere - os curdos - foram os maiores aliados dos EUA na luta contra os jihadistas do Estado Islâmico (EI), no norte da Síria e do Iraque. A medida de Trump foi considerada por curdos, aliados europeus e congressistas americanos como um gesto de traição, que emitiria um sinal negativo para outros aliados que se arriscam a lutar ao lado dos americanos na região.
Tentando reverter o mal-estar, Trump ameaçou nesta segunda-feira, 7, "aniquilar" a economia da Turquia, caso o país passe dos limites na Síria. "Como disse antes, e só para reiterar, se a Turquia fizer algo que eu, em minha grande e inigualável sabedoria, considerar fora do limite, destruirei e aniquilarei totalmente a economia da Turquia", escreveu Trump no Twitter.
"Já fiz isso antes", acrescentou o republicano, em referência à queda da lira turca, que perdeu 25% do valor em agosto, quando os EUA pressionavam pela libertação do missionário Andrew Brunson, que estava preso na Turquia desde outubro de 2016, acusado de colaborar com terroristas.
O início da retirada das tropas americanas, no fim de semana, deixou o caminho livre para uma operação turca contra a milícia curda das Unidades de Proteção Popular (YPG). A decisão foi denunciada como uma "facada nas costas" pelas forças lideradas pelos curdos.
A primeira ação foi além e atingiu também o território iraquiano. Os curdos são a mais relevante minoria do Oriente Médio sem um Estado próprio. São entre 25 milhões e 35 milhões de pessoas espalhadas por Turquia, Irã, Iraque e Síria.
Segundo a agência oficial síria Sana, as forças turcas atacaram posições curdas na cidade de Al-Malikiyah, no norte da Síria. A agência turca Anadolu informou que a Força Aérea turca "neutralizou" três alvos do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), na região de Gara, segundo o Ministério Nacional da Defesa da Turquia.
As YPG são o principal grupo na luta contra o EI e contam com apoio dos EUA e de outros países ocidentais. Mas a Turquia considera as YPG um grupo "terrorista" por seus laços com o PKK, organização curda que, desde 1984, trava uma sangrenta luta no território turco.
Os curdos da Síria haviam advertido nesta segunda que uma invasão militar turca provocará o ressurgimento do EI. As FDS afirmaram que a operação terminará com anos de cooperação para derrotar os jihadistas e permitirá o retorno de alguns dos líderes do EI que sobreviveram.
Em decisão repentina no ano passado, Trump anunciou a retirada das tropas americanas da Síria - cerca de 2 mil soldados - após dizer que os EUA tinham derrotado o EI. O anúncio acabou levando à renúncia de seu então secretário de Defesa, Jim Mattis, que não concordava com a medida.
O Senado, liderado pelo republicano Mitch McConnell, conteve o ímpeto do presidente ao aprovar uma resolução condenando a retirada, da qual Trump desistiu em janeiro. Nesta segunda-feira, McConnell voltou a condenar a saída da Síria. "A retirada precipitada das forças americanas só beneficia a Rússia, o Irã e o regime de Assad. E aumentaria o risco de o EI e de outros grupos terroristas se reagruparem", afirmou McConnell. (Com agências internacionais).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.