postado em 11/10/2019 04:15
Cerca de 64 mil moradores do nordeste da Síria abandonaram suas casas, com medo dos bombardeios turcos a posições rebeldes curdas, depois que Ancara decidiu intensificar a operação militar. Um correspondente da agência France-Presse relatou ter visto mulheres e crianças empoleiradas em caminhonetes, carregando com elas geladeiras, sacolas de juta, colchões e botijões de gás, chegarem à cidade de Tall Tamr, mais ao sul e distante dos combates. Até o fechamento desta edição, pelo menos 24 pessoas tinham sido mortas nos confrontos, sendo 16 combatentes curdos e oito civis.
Misty Buswell, diretor de comunicações para o Oriente Médio do Comitê de Resgate Internacional (IRC), estima que o número de desalojados pode chegar a 300 mil. Analistas temem que a ofensiva da Turquia provoque uma fuga em massa de extremistas do Estado Islâmico mantidos em prisões improvisada pelas Forças Democráticas da Síria (FDS), integradas às principais milícias curdas da Síria, as Unidades de Proteção do Povo (YPG).
Em meio ao clamor mundial contra a operação militar, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou ;abrir as portas; da Europa para 3,6 milhões de refugiados sírios, caso outros governos classifiquem a incursão de ;invasão;. ;Ei, União Europeia, volte à razão! Volto a repetir: se vocês tentarem apresentar nossa operação como uma invasão, abriremos as portas e enviaremos a vocês 3,6 milhões de migrantes;, declarou o chefe de Estado, durante discurso em Ancara. ;Vocês nunca foram sinceros. Agora dizem que bloquearão 3 bilhões de euros (prometidos à Turquia no âmbito do acordo migratório). Por acaso alguma vez vocês respeitaram alguma promessa que nos fizeram? Não;, reclamou Erdogan. ;Com a ajuda de Deus, continuaremos nossa jornada, mas abriremos as portas; aos migrantes.
Preocupação
O secretário-geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres, expressou ;profunda preocupação com a escalada de conflitos; no nordeste da Síria. Por sua vez, o presidente norte-americano, Donald Trump, determinou que diplomatas do Departamento de Estado atuem em prol de um cessar-fogo entre a Turquia e os curdos, depois da retirada de tropas de Washington. ;Recebemos a missão do presidente de tentar estabelecer um campo de entendimento entre os dois lados e se há como obter um cessar-fogo;, informou um funcionário, que pediu para não ser identificado, à agência France-Presse.
;Nós temos três opções: enviar milhares de tropas e ganhar militarmente, atingir a Turquia de forma muito dura financeiramente e com sanções, ou mediar um acordo entre a Turquia e os curdos;, escreveu Trump, mais cedo, no Twitter. ;Nós derrotamos 100% do califado do ISIS (Estado Islâmico) e não temos mais tropas na área sob ataque da Turquia, na Síria. Fizemos nosso trabalho perfeitamente! Agora, a Turquia está atacando os curdos, com quem tem lutado por dois séculos.;
Morador de Al-Qamishli, na fronteira com a Turquia, o fotógrafo freelancer e intérprete curdo-sírio Baderkhan Ahmad, 22 anos, afirmou que, por volta das 20h de ontem (14h em Brasília), antes de três morteiros turcos atingirem a cidade, as mesquitas orientaram a população a se esconder em porões. ;Hoje, três pessoas foram mortas na vizinhança. Uma idosa, uma jovem e uma criança;, lamentou ao Correio. ;Não tenho medo. Tenho experiência em lidar com a cobertura de guerras. Eu me preocupo com mulheres e crianças.; O presidente da França, Emmanuel Macron, exortou a Turquia a encerrar ;o mais rápido possível; a ofensiva no Curdistão sírio.
No front
;A situação por aqui é grave. A Turquia bombardeia civis de forma indiscriminada a todo o momento. Todas as cidades curdas da Síria estão sendo bombardeadas. As tropas turcas não progridem, pois encontram resistência considerável das Forças Democráticas Sírias (SDF, pela sigla em inglês). Desde ontem, somente em
Al-Qashmili, oito civis foram mortos, incluindo crianças. Vilarejos com minorias cristãs e yazidis, no interior de Al-Qashmili, também estão sendo desocupados. Estou com medo. Não sei como proteger meus filhos. Tive de
levá-los para a zona rural.;
Arin Sheikhmos, 31 anos, jornalista curdo, morador da cidade síria de Al-Qashmili, na fronteira com a Turquia