Agência France-Presse
postado em 30/10/2019 15:50
[FOTO1]Pela primeira vez em oito anos de guerra, o governo sírio e a oposição aceitaram se reunir para tratar da Constituição, mas o presidente Bashar al-Assad, mais forte do que nunca, não parece disposto a fazer concessões - consideram analistas ouvidos pela AFP.
O enviado especial da ONU para a Síria, Geir Pedersen, inaugura, nesta quarta-feira (30/10) em Genebra, a primeira reunião do Comitê Constitucional. O órgão é composto por 150 representantes do governo sírio, da oposição e da sociedade civil, distribuídos de maneira igual.
O presidente Bashar al-Assad aceitou participar desta nova rodada de negociações pressionado por seu aliado russo, que deseja normalizar as relações da Síria com a comunidade internacional e dar uma "legitimidade" aos acordos firmados com a Turquia, principal apoio da oposição síria.
Pedersen classificou esta reunião de "luz de esperança" para o povo sírio e disse esperar que possa abrir caminho para uma solução política de um conflito que já deixou mais de 370 mil mortos.
Para Aaron Lund, pesquisador na Century Foundation, com sede nos Estados Unidos, o presidente Assad chega a estas negociações "em posição de força".
"Tem pouco a perder", disse Lund à AFP.
As forças do governo já controlam cerca de 60% do território e, recentemente, foram enviadas para as antigas zonas curdas, no nordeste do país, após a ofensiva turca.
As outras sessões de negociação organizadas pela ONU em Genebra não deram qualquer resultado.
As contradições entre governo e oposição continuam intactas. A presença de um representante da Síria no Comitê Constitucional não significa, porém, que o governo esteja disposto a aceitar uma mudança da Constituição.
"Ajustes"
Tão enfraquecida que já não pode impor suas condições, a oposição reivindica uma nova Constituição. Há algumas semanas, o ministro sírio das Relações Exteriores, Walid al Mualem, declarou que as negociações serão apenas sobre a atual Constituição, adotada em 2012.
O pesquisador Sam Heller, do International Crisis Group, avalia que a Síria aceitará "apenas algumas emendas à Constituição atual" e descarta "uma reformulação completa" do texto.
Segundo ele, a Síria aceitou participar desta reunião sob pressão de Moscou, mas "sem fazer grandes concessões".
A partir da semana que vem, um grupo reduzido de 45 pessoas que representam os três grupos sírios começará a trabalhar na Constituição.
Nenhuma agenda foi estabelecida para o andamento das discussões. As emendas precisam obter pelo menos 75% dos votos para evitar que uma parte "imponha" sua posição.
Segundo analistas, estas duas condições foram impostas pela Síria à ONU.
A seleção dos representantes da sociedade civil no Comitê também levou a longas negociações entre a Síria e o enviado da ONU.
Qualquer que seja o formato da reunião, afirma Lund, "nenhuma negociação poderá forçar Assad a fazer o que não quer fazer".
Lund está convencido de que Assad "buscará usar esta plataforma de discussões para tentar normalizar suas relações com a comunidade internacional".
"Rússia e Turquia serão os principais atores deste processo", afirmou Lund.
"Na melhor das hipóteses, o Comitê Constitucional dará uma legitimidade internacional a qualquer acordo nebuloso obtido nos bastidores", completou.