postado em 17/11/2019 04:15
[FOTO1]Estimulado pela queda do presidente esquerdista da Bolívia, Evo Morales, aliado do regime chavista, o líder da oposição na Venezuela, Juan Guaidó, voltou ontem às ruas de Caracas para convocar seus partidários a ;seguir o exemplo;. ;A Bolívia ficou 18 dias, nós ficamos anos;, discursou Guaidó, proclamado em janeiro presidente interino pela Assembleia Nacional e reconhecido oficialmente por mais de 50 países, entre eles o Brasil.
Os 5 mil manifestantes que acompanharam Guaidó em uma marcha até a Embaixada da Bolívia em Caracas eram uma imagem pálida das manifestações de dezenas de milhares de opositores comandadas no início do ano pelo presidente interino autoproclamado. Ainda assim, foi o maior protesto contra o governo chavista desde 1; de maio ; o dia seguinte a uma tentativa fracassada de Guaidó para comandar um levante militar e derrubar Maduro.
;Não vamos desmaiar, desfalecer;, apelou o líder oposicionista. Está na hora de continuar. Peço a toda a Venezuela para que nos mantenhamos em protesto.; Antes de liderar a marcha até a representação diplomática boliviana, Guaidó conversou por telefone com Jeanine Áñez, que se proclamou presidente interina de seu país após a renúncia de Morales, que partiu em exílio para o México. De acordo com o líder antichavista, Áñez pediu a ele que ;liberte o povo venezuelano;.
;Rua sem volta significa que temos uma agenda de conflito permanente;, disse o presidente interino. ;Aqui, a luta é até o fim da usurpação, até conseguirmos eleições livres;, afirmou, para em seguida reforçar o apelo aos militares venezuelanos. ;Estou pedindo que se coloquem ao lado da Constituição. Precisamos que as Forças Armadas atendam o chamado do povo inteiro.;
Depois de mais de seis meses praticamente fora do noticiário internacional e sem ter conseguido avanços práticos na campanha para tirar Maduro do poder, Guaidó enfrenta contestações dentro do próprio campo antichavista ; de maneira semelhante com o que ocorreu com o ex-governador Henrique Capriles, derrotado pelo chavismo na disputa presidencial de 2013. Uma pesquisa recente do instituto Delphos indicou que 38% dos venezuelanos que se identificam como partidários da oposição defendem a escolha de um novo líder. ;Se não acontecer nada extraordinário, a liderança de Guaidó pode ir para a geladeira;, disse à agência de notícias France-Presse o cientista político Jesús Castillo-Molleda.
Sintomaticamente, Caracas assistiu ontem também a uma concentração de simpatizantes do governo. Vestidos de vermelho, como de hábito, centenas de chavistas foram ao centro da capital manifestar apoio a Maduro e ao aliado Evo Morales, a quem consideram vítima de um golpe de Estado. ;Mobilizados e alertas! Hoje, as ruas de Caracas se enchem com a alegria de nosso povo para defender seu direito sagrado à democracia, à liberdade, à convivência e à felicidade;, escreveu no Twitter o presidente chavista. ;Digamos ao mundo que a Venezuela está de pé e em paz, construindo a pátria socialista.;
Invasão
Na noite de sexta-feira, homens armados e mascarados invadiram a sede do partido de Juan Guaidó, e roubaram computadores, denunciaram dirigentes e testemunhas. Vestidos de preto, com armas longas e pistolas, os encapuzados entraram à força nos escritórios do Vontade Popular, no setor leste da capital venezuelana, onde cerca de 30 pessoas estavam presentes.
;Foram vítimas de um sequestro;, denunciou à imprensa o presidente interino, que chegou ao local minutos depois da partida dos assaltantes. ;Chega de a ditadura continuar amedrontando nossa gente;, disse Guaidó em um vídeo que gravou para as redes sociais, reforçando a convocação para a marcha de ontem.
Análise da notícia
"A Bolívia ficou 18 dias, nós ficamos anos. Aqui, a luta é até o fim da usurpação, até conseguirmos eleições livres;
Juan Guaidó,
líder da oposição na Venezuela
Análise da notícia
Tempo curto
para Guaidó
; Silvio Queiroz
O ultimato dado a Evo Morales pelos chefes militares, na Bolívia, não é a única diferença com o impasse na Venezuela, mas ajuda a entender por que Juan Guaidó caminha para se tornar, possivelmente, mais um líder ;aposentado; pela oposição ao governo chavista.
Antes dele, o nome da vez foi Henrique Capriles, governador do estado de Miranda e candidato à eleição presidencial de 2013 ; após a morte do ;patriarca; do socialismo bolivariano, Hugo Chávez. Capriles foi derrotado por margem mínima pelo herdeiro designado de Chávez, Nicolás Maduro. Destituído do posto, perdeu espaço e foi excluído, com o restante da oposição, do pleito de 2018, no qual Maduro foi reeleito.
Dinâmico, jovem, com uma presença de palanque inspirada na imagem do ex-presidente americano Barack Obama, Juan Guaidó despontou como esperança dos antichavistas em janeiro. Presidente da Assembleia Nacional, órgão legislativo de maioria oposicionista cujos poderes foram esvaziados pelo regime, Guaidó foi proclamado presidente interino, em janeiro, e prontamente apoiado por um respeitável elenco na região: Estados Unidos, Brasil, Colômbia e Argentina estiveram entre os primeiros a lhe dar reconhecimento formal.
Tudo parecia caminhar bem até o ensaio de levante militar, na véspera do 1; de maio. Guaidó chegou a aparecer para os simpatizantes diante de um quartel supostamente amotinado, mas logo teve de se recolher ; e, desde então, praticamente não foi mais visto nem ouvido.
Os ecos da queda do presidente boliviano, praticamente o ;último moicano; da safra de governantes esquerdistas que teve como expoentes Chávez, Lula e Pepe Mujica, podem representar a última chance do presidente interino. A tentativa fracassada dos seus emissários para ocupar a embaixada venezuelana em Brasília demonstrou a fragilidade do apoio com o qual pode contar.