Agência France-Presse
postado em 18/11/2019 16:25
[FOTO1]O acesso ao aborto seguro progrediu de forma geral no mundo desde o início dos anos 1990, mas também deu alguns passos atrás em alguns países onde essa prática é criminalizada.
Em 1994, 179 países adotaram um programa sobre direitos reprodutivos das mulheres, na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (ICPD), organizada no Cairo.
;Vinte e cinco anos se passaram desde a conferência do Cairo, e o aborto seguro segue sendo uma meta incompleta;, lamentou Shilpa Shroff, da ONG Campanha Internacional pelo Direito das Mulheres ao Aborto Seguro, em uma cúpula da ICPD25, organizada em Nairóbi, de terça a quinta-feira, pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
;Muitos países legalizaram o aborto, eu diria então que sim;, responde a epidemiologista indiana à AFP, quando questionada se a situação melhorou em relação ao acesso ao aborto seguro, um quarto de século depois.
No entanto, ;algumas leis foram revogadas;, afirma. ;Mas pelo menos as pessoas começaram a falar sobre isso, neste ponto progredimos. (Há 25 anos) era um tabu;.
Segundo estimativas da organização, difíceis de estabelecer em certos países, 56 milhões de abortos foram realizados todos os anos no mundo entre 2010 e 2014, dos quais cerca da metade (aproximadamente 25 milhões) não foi realizada com segurança.
Essas práticas, realizadas por pessoas não qualificadas ou com poucas equipes médicas, contribuem para a mortalidade materna, cuja erradicação é um dos principais objetivos da ICPD.
A grande maioria desses abortos ;não seguros; (97%) ocorre em países em desenvolvimento da África, Ásia e América Latina, acrescenta Shilpa Shroff, enfatizando que ;tornar o aborto ilegal não reduz o número de abortos, só faz com que sejam mais perigosos;.
Na América Latina, o aborto só é totalmente descriminalizado no Uruguai, Cuba e Cidade do México. Em outros países, como o Brasil, o acesso é muito limitado e só é possível interromper a gravidez em caso de estupro, risco de vida para a mãe ou malformação grave do feto.
- Primavera árabe -
Desde 1994, o saldo é desigual na Ásia, onde apenas cinco países, incluindo a China, legalizaram totalmente a interrupção da gravidez. A situação também é desigual no Magrebe e no Oriente Médio onde, por exemplo, o Iraque e a Argélia reforçaram os limites dessa prática, dizem especialistas.
Atualmente, no Oriente Médio, ;80% das mulheres em idade fértil vivem em um país que restringiu o acesso ao aborto;, declarou Hedia Belhadj, presidente da associação tunisiana Tawhida Bem Cheikh, a qual milita pela defesa da saúde das mulheres. Segundo ela, a primavera árabe, apesar de autorizar maior liberdade de expressão, também permitiu que ;lobbies conservadores; usassem redes sociais contra os direitos das mulheres.
Na África, as leis em torno desse assunto são muito restritivas em um quarto dos países. Seis deles, como a República Democrática do Congo e o Senegal, proibiram completamente, independentemente das circunstâncias, de acordo com um relatório da Federação Internacional para o Planejamento Familiar (IPPF), publicado em junho de 2018.
;Nosso maior desafio é que o aborto está criminalizado. Uma mulher pode ser presa por isso (...) O que nós procuramos não é a legalização, mas a descriminalização;, conta à AFP Ernest Nyamato, responsável para a África do IPAS, ONG que promove o acesso ao aborto.
;A barreira mais importante é a religião;, assegura o médico queniano.
;Outra luta é que, mesmo em países onde é legalizado, como na África do Sul, existem obstáculos: o sistema de saúde não oferece esse serviço, os profissionais não são qualificados...;, continua.