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Pressão no Congresso

Após noite de incêndios e de saques em várias cidades, presidente Sebastián Piñera apressa o Legislativo a aprovar projetos de lei contra encapuzados e saqueadores. Câmara de Deputados avaliza redução salarial de altas autoridades, inclusive do chefe de Estado

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 28/11/2019 04:06
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Depois de uma noite caótica, em que foram registrados incêndios e ataques a ônibus, estações de metrô e redações de um jornal, o presidente chileno, Sebastián Piñera, reuniu ontem o gabinete de emergência e advertiu que ;a violência está causando um dano que pode ser irreparável ao corpo e à alma de nossa sociedade;. ;Ela está destruindo sonhos e projetos de vida. (;) Está destruindo valioso patrimônio, tanto público como privado. (;) Está danificando profundamente nossa economia;, declarou. O líder direitista exortou todos os setores sociais a condenarem a radicalização e colocou o Legislativo contra a parede, ao lembrar que enviou quatro projetos de lei ao Congresso para tentar proibir a ação de encapuzados, coibir saques e barricadas, e autorizar o uso das Forças Armadas na proteção de ;infraestrutura crítica;. ;Esses projetos devem se transformar agora, em questão de dias, em leis da República. São absolutamente urgentes e necessários.; Com uma saída pacífica para a crise cada vez mais distante, a Câmara dos Deputados aprovou uma redução da remuneração dos congressistas e de altas autoridades do Estado, incluindo o presidente Piñera, ministros, subsecretários, intendentes e governadores. Os integrantes do Poder Judiciário e os prefeitos não foram atingidos pela medida de austeridade.

Para Miguel Ángel López, professor de estudos internacionais da Universidad de Chile, os protestos que assolam o país não têm mais a característica multitudinária do início. ;Agora, envolvem jovens marginalizados e se espalharam para a maior parte das cidades do Chile. As jornadas de violência, quase sempre noturnas, estão vinculadas à criminalidade. Também haveria ligações muito fortes com grupos anarquistas;, explicou ao Correio.

O especialista afirmou que, por volta das 13h15 de ontem, o presidente divulgou os projetos de lei em discussão para tentar frear a onda de violência. ;Um dos textos sugere que os militares perderam as ruas e, agora, protegeriam a infraestrutura. Vários monumentos nacionais e igrejas foram destruídos;, observou. López aconselha Piñera a se engajar em um governo de unidade e a convocar todas as lideranças políticas e a Igreja. Na opinião dele, o chefe de Estado foi impactado com violações dos direitos humanos cometidas pelos carabineiros (a força especial da polícia), incluindo lesões oculares permanentes sofridas por manifestantes.

Rotina
A rotina de vários chilenos mudou no último mês. Tamara Flores Oróstegui, 36 anos, comerciante da cidade de La Serena (500km a noroeste de Santiago), é obrigada a conviver com barricadas montadas diante de sua casa. Por volta das 23h de terça-feira, ela viu vários manifestantes fugindo do Hotel Costa Real, a apenas 800m de seu portão. Um dos hotéis mais luxuosos do centro do balneário tinha acabado de ser invadido e vandalizado. Vidraças quebradas, quartos incendiados, carros destruídos, objetos saqueados. ;O caos sempre ocorre após as 19h. As pessoas se reúnem na Plaza Buenos Aires e, depois, começam os distúrbios e os saques. O comércio somente funciona até as 17h. As escolas reduziram a jornada, pois o gás lacrimogêneo se alastra pela avenida principal;, contou à reportagem.

Do lado de fora do Hotel Costa Real, encapuzados celebraram o ato e publicaram fotos nas redes sociais. ;Os hóspedes estão bem, mas os funcionários ficaram muito afetados, pois perderam sua fonte de renda. Em um raio de 1km houve destruição;, relatou ao Correio a vereadora Jocelyn Lizana, que visitou o prédio na manhã de ontem. ;O Chile passa por um conflito profundo. Os adeptos da violência queimam e destroem o país. Por aqui, vivemos algo horrível, incendiaram um hotel com hóspedes e funcionários dentro, e a fachada da Secretaria da Educação;, acrescentou. A vereadora de La Serena lembrou que Piñera fez um acordo pela paz. ;O Executivo e o Legislativo entendem as demandas e trabalham em uma resposta, mas os grupos organizados e os saqueadores estão descontrolados. Lamentavelmente, não se visualiza outra opção que não seja a força militar O custo político disso seria altíssimo.;


Eu acho...

;O futuro do meu país é de incerteza. Nenhuma medida é tomada. É como viver em uma cidade sem lei, onde ninguém tem autoridade para nada. Somos muitos os que desejam construir um país melhor e mais justo. Sobretudo, ter paz. Não queremos viver com medo de encapuzados, como um dia tememos os militares na ditadura.;


Tamara Flores Oróstegui, 36 anos, comerciante da cidade de La Serena


;Piñera foi muito afetado pelas críticas de que não estaria preparado para enfrentar crise dessa magnitude. A oposição e o governo apontam incapacidade de reação do líder. Piñera possui uma popularidade de 10%, a mais baixa da história do Chile.;


Miguel Ángel López, professor de estudos internacionais da Universidad de Chile


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