postado em 30/11/2019 04:15
[FOTO1]Vento a favor para a bolsodiplomacia
O cenário internacional que se descortina para 2020, especialmente na vizinhança mais imediata, oferece condições favoráveis para o desenvolvimento da política externa traçada para o governo de Jair Bolsonaro. O presidente entra no segundo ano de mandato, em janeiro, com o mapa político sul-americano significamente alterado e a balança claramente pensa para a direita ; a despeito de o peronismo ter voltado ao poder na Argentina, com Alberto Fernández e Cristina Kirchner. A confirmação da vitória de Luis Lacalle Pou (foto), no Uruguai, tirou de cena aquele que era praticamente o último da safra de governos da esquerda nacionalistas que deram o tom para o subcontinente na primeira década e meia do século.
O terreno onde esse quadro se mostra mais nítido é justamente o dos foros de integração regional. A Unasul, cria dos presidentes Lula, Néstor Kirchner e Hugo Chávez, subsiste apenas formalmente, despojada até da sede no Equador ; o edifício cedido por Rafael Correa foi requisitado pelo sucessor, Lenín Moreno, cristão-novo do bloco de centro-direita que predomina hoje do Caribe à Patagônia. Como exceções, a Venezuela chavista e a Argentina peronista vislumbram um período de isolamento, no qual tendem a ser constrangidos a manobras de acomodação e sobrevivência.
Para o presidente brasileiro, que não faz segredo sobre a meta de erradicar a influência de esquerda no horizonte visível, a paisagem dificilmente poderia ser mais fotogênica.
Pelas raízes
Na sequência de viradas políticas experimentadas desde o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, a que se consumou na Bolívia, no início do mês, se apresenta emblemática e sintetiza alguns dos muitos desdobramentos da troca de comando político. Antes de mais nada, a renúncia forçada de Evo Morales pôs fim ao mandato do primeiro representante da maioria indígena a governar o país em quase dois séculos de vida independente. Mas, antes mesmo de convocada nova eleição, da qual o ex-presidente está excluído, o governo interino operou em tempo recorde uma guinada diplomática que reposiciona o país nos pontos nevrálgicos da política externa ; em linha com a reorientação imprimida ao Brasil por Bolsonaro e pelo chanceler Ernesto Araújo.
De saída, a presidente Jeanine Áñez anunciou o envio de embaixador a Washington retomando uma presença interrompida em 2008, quando Evo expulsou o embaixador americano, acusado de apoiar um movimento da direita acusado pelo governo de promover o separatismo na rica província de Santa Cruz. Em outra iniciativa para romper com o que chamou de ;política externa extraviada;, Jeanine reatou as relações com Israel, rompidas em 2009. Rússia e China, importantes parceiros comerciais, não passaram impunes: sem rasgar dinheiro, a presidente deixou patente a ideia de ;redirecionar; as relações ; em outras palavras, esfriar o componente político.
Três a um
No âmbito do Mercosul, o placar se inverteu radicalmente em relação a 2012, quando o Brasil de Dilma, a Argentina de Cristina Kirchner e o Uruguai de Pepe Mujica suspenderam o Paraguai, em represália pelo impeachment relâmpago de Fernando Lugo, e abriram caminho para a integração plena da Venezuela ; na época, ainda governada por Hugo Chávez. Um por um, os governos de esquerda foram saindo de cena, até que restou o de Tabaré Vázquez, sucessor de Mujica. A essa altura, Nicolás Maduro, herdeiro de Chávez, já tinha sido afastado do bloco.
A chapa Fernández-Kirchner, na Argentina, apeou da Casa Rosada o direitista Mauricio Macri, mas toma posse tendo no entorno uma frente sólida alinhada com o perfil defendido para o Mercosul pelo Brasil de Bolsonaro e Araújo. Não por acaso, o presidente eleito peronista acenou com a bandeira branca: buscará uma convivência pragmática com a maioria dos sócios. Vale lembrar que, ainda durante a campanha para o segundo turno entre Macri e Fernández, o Planalto indicou claramente que estará sempre pronto a isolar a dupla peronista ; ;a turma do Foro de São Paulo; ;, caso se disponha a ;atrapalhar; a reconversão do Mercosul.
Grupo de Lima
A incógnita que persiste é o espaço que caberá ao Grupo de Lima, articulação diplomática inicialmente voltada a coordenar a pressão externa sobre a Venezuela chavista. Mais recentemente, os países integrantes cerraram fileiras com os governos do Chile e do Equador, abalados por uma onda de manifestações e inquietação social. Na prática, o grupo ocupou o vácuo aberto pelo desmanche da Unasul. O presidente eleito da Argentina, porém, chegou a sinalizar que deixaria a articulação para se somar a México e Uruguai, que buscam com a Europa uma ;terceira via; no impasse venezuelano.
Feliz ano-novo
A Conexão entra em período de recesso a partir da próxima semana. Antecipo, então, os votos de boas festas para leitores e interlocutores, com a expectativa de que tenhamos todos um 2020 de realizações e de novas informações e perspectivas a compartilhar.