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A três passos do "divórcio"

Em votação histórica, Parlamento dá o sinal verde para a saída britânica da União Europeia. O acordo passará na próxima semana pelo crivo da Câmara dos Lordes, antes de ser submetido ao endosso da rainha e de Bruxelas para ruptura no dia 31

Correio Braziliense
postado em 10/01/2020 04:14
Boris Johnson (C) sorri diante da vitória na Câmara dos Lordes: fim de três anos e meio de crise política


No embalo da esmagadora vitória conquistada pelos conservadores nas eleições de dezembro do ano passado, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, obteve ontem o sinal verde da Câmara dos Comuns ao texto que permitirá que o Reino Unido deixe a União Europeia no próximo dia 31. Na sessão histórica, que encerra três anos e meio de impasse, o governo obteve 330 votos favoráveis — 231 se manifestaram contra o acordo negociado por Johnson com o bloco europeu.

Depois de ser examinado pela Câmara dos Lordes, na próxima semana, o texto, que traduz em lei os termos acertados para o Brexit, será enviado ao Palácio de Buckingham para o consentimento da rainha Elizabeth II. O documento, então, terá que ser ratificado pelo Parlamento Europeu em 29 de janeiro, dois dias antes da data final para o divórcio.

Por um ano, o texto inicialmente negociado pela ex-primeira-ministra Theresa May e modificado por Johnson depois que ele chegou ao poder em julho, foi repetidamente rejeitado pelo Parlamento, que forçou três adiamentos e causou uma profunda crise política.

A votação de ontem se deu após três dias de debates tranquilos, num cenário bem diferente ao dos acalorados embates que, desde 2016, marcaram um processo caótico em uma câmara dividida entre apoiadores e críticos do Brexit.

“Esse projeto garantirá nossa saída da União Europeia com um acordo que dá segurança às empresas, protege os direitos de nossos cidadãos e garante que recuperemos o controle de nosso dinheiro, nossas fronteiras, nossas leis e nossa política comercial”, afirmou ao encerrar as discussões, o ministro encarregado do Brexit, Steve Barclay.

Inédito
O Brexit encerrará 47 anos de um complicado relacionamento entre o Reino Unido e a UE. Será a primeira vez, desde a sua criação, que o bloco europeu perderá um país-membro e conquistará um poderoso concorrente comercial e financeiro à sua porta.

Johnson, de 55 anos, acumulou derrotas políticas e judiciais nos primeiros meses de seu mandato, quando herdou o frágil governo minoritário de May. Ainda assim, o premiê conseguiu negociar com a UE um acordo que os 27 afirmavam imutável. Mais tarde, impulsionado por eleitores cansados do bloqueio político, conseguiu os 365 deputados que, em uma câmara de 650, permitiram a aprovação do acordo.

O pacto permite um divórcio tranquilo e prevê uma transição até dezembro de 2020 para evitar rupturas abruptas, especialmente para as empresas, e dar tempo para negociar a futura relação entre Londres e Bruxelas, fase mais complicada e que se anuncia muito difícil no tempo disponível.

Segundo o acordo, o período pode ser prorrogado até o fim de 2022, no máximo. Johnson, que antes de primeiro-ministro foi chanceler e prefeito de Londres, rejeita essa possibilidade e incluiu no projeto de lei apresentado aos deputados um dispositivo que proíbe qualquer extensão da transição.

A nova presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deixou claro, porém, que o tempo é insuficiente para se chegar a um acordo completo de livre-comércio.

O acordo inclui, entre outras questões, os direitos dos 3,2 milhões de cidadãos europeus que vivem no Reino Unido e o 1,2 milhão de britânicos residentes no continente. Pela negociação, eles poderão seguir estudando, trabalhando, recebendo subsídios e reunindo suas famílias como atualmente.

Outro ponto é a conta de cerca de 39 bilhões de libras que Londres deve pagar para honrar seus compromissos financeiros com o bloco. O Reino Unido cumprirá os compromissos assumidos no âmbito do orçamento europeu (2014-2020), que também envolve o período de transição. Em troca se beneficiará dos Fundos Estruturais Europeus e da Política Agrícola Comum.

Pelo negociado, a província britânica da Irlanda do Norte permanecerá no território alfandegário britânico, mas respeitará as regulamentações do mercado único europeu para manter aberta a fronteira terrestre com a vizinha República da Irlanda, país-membro da UE.

Isso implicará controles regulamentares entre a ilha da Grã-Bretanha e a Irlanda do Norte. O dispositivo provocou a revolta dos unionistas norte-irlandeses do DUP, que o consideram um ataque à integridade do Reino Unido.


330

Total de votos obtidos para a conclusão do processo do Brexit — 231 parlamentares foram contra o acordo




Para saber mais

Processo conturbado


Em 23 de junho de 2016, em um referendo que terminou com 52% de votos a favor e 48% contra, os britânicos decidiram deixar a União Europeia. O resultado levou o então primeiro-ministro conservador, David Cameron, a renunciar. Depois disso, se seguiram mais de três anos de adiamentos, caos e confusão. Sem conseguir levar o Brexit adiante, Theresa May, substituta de Cameron, deixou o cargo e Boris Johnson assumiu o governo, em julho do ano passado.

Em 28 de outubro, a União Europeia aprovou o terceiro adiamento do “divórcio” e, um dia depois, ao fim de um acalorado debate, os deputados britânicos aceitaram por maioria de dois terços o pedido de Johnson de convocar eleições legislativas antecipadas em 12 de dezembro. O líder conservador venceu as eleições com uma esmagadora maioria de 365 deputados em uma câmara de 650.

Em 20 de dezembro, Johnson apresentou à nova Câmara dos Comuns o projeto de lei que deve traduzir o Tratado de Retirada em lei britânica. O texto recebeu aprovação inicial histórica de 358 votos contra 234. As discussões continuaram no retorno das festas de fim de ano para cumprir o prazo fixado para a ruptura, 31 de janeiro.

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