Correio Braziliense
postado em 14/01/2020 04:17
O Irã lida com a onda de insatisfação interna, deflagrada pela confissão de que as Forças Armadas do país derrubaram o Boeing da Ukraine Airlines, na semana passada, sem perder de vista o enfrentamento com os Estados Unidos. Ontem, no terceiro dia consecutivo de protestos populares, o governo iraniano negou que tenha mentido ou tentado “acobertar” as responsabilidades pela tragédia com o voo PS 572, que matou todas as 176 pessoas a bordo. E reagiu ao apoio que o presidente americano, Donald Trump, tem dado aos manifestantes. “Lágrima de crocodilo”, classificou o porta-voz Ali Rabiei, ao comentar os tuítes do chefe da Casa Branca.
Segundo vídeos que circulavam, ontem, nas redes sociais, as forças iranianas dispararam bombas de gás lacrimogêneo e teriam usado de violência, na noite da véspera, para dispersar protestos contra o governo. A mobilização popular começou no sábado, logo após o governo admitir — após três dias de negativa — que a aeronave foi abatida por um míssil disparado “por engano”, enquanto a defesa do país estava em alerta de “guerra” por medo de um ataque americano.
Em um dos vídeos, uma mulher parece ter caído na calçada, manchada de sangue e é levantada por várias pessoas, algumas das quais gritam “ela foi baleada”. Em outros, publicados como imagens de uma manifestação na cidade de Amol, junto ao Mar Cáspio, se pode ver uma multidão desfilando nas ruas aos gritos de “não queremos a República Islâmica”. As agências internacionais de notícias não conseguiram, porém, verificar a autenticidade dos vídeos.
Em sua conta oficial no Twitter, Trump exaltou os manifestantes. “O governo do Irã deve permitir que os grupos de Direitos Humanos monitorem e relatem os fatos sobre os protestos em curso do povo iraniano. Não pode haver outro massacre de manifestantes pacíficos, nem um apagão da internet. O mundo está atento”, escreveu, em inglês e em farsi. Elogiou ainda o fato de que “os maravilhosos manifestantes iranianos se recusaram a pisar, ou denegrir de alguma forma, nossa grande bandeira americana”.
Também a Alemanha pediu ao Irã que permita a realização de “protestos de forma pacífica e livre”. A porta-voz do Ministério alemão das Relações Exteriores, Maria Adebahr, classificou como “muito preocupantes” as imagens de vídeo, nas quais se vê as forças de segurança iranianas reprimindo a multidão.
O chefe da Polícia de Teerã declarou que recebeu ordens de agir com “moderação” durante as manifestações. “A polícia tratou as pessoas que se concentraram com paciência e tolerância. A polícia não disparou durante as manifestações, porque foram dadas ordens de moderação aos policiais da capital”, disse o general Hossein Rahimi, citado pela televisão estatal.
Investigação
Na tentativa de aplacar os ânimos da população, o governo se defendeu da tese de premeditação. “Nesses dias de tristeza, houve críticas aos responsáveis e às autoridades do país. Alguns responsáveis foram, inclusive, acusados de mentir e de tentar acobertar o ocorrido, quando, sincera e honestamente, esse não foi o caso”, disse Ali Rabii.
“A verdade é que não mentimos. Mentir é disfarçar a verdade de maneira intencional e consciente. Mentir é acobertar informações. Mentir é conhecer um fato e não dizê-lo, ou deformar a realidade”, acrescentou o porta-voz.
Segundo ele, a posição manifestada inicialmente pelo governo estava baseada em informações que desvinculavam os ataques a bases usadas por americanos no Iraque, em resposta ao assassinato de Qassem Soleimani, à queda do avião. Em conversa com o primeiro-ministro sueco, Stefan Lofven, o presidente iraniano, Hassan Rohani, prometeu uma “exaustiva investigação” sobre o desastre aéreo, conforme anúncio feito por sua assessoria.
“A verdade é que não mentimos. Mentir é disfarçar a verdade de maneira intencional e consciente. Mentir é acobertar informações. Mentir é conhecer um fato e não dizê-lo, ou deformar a realidade”
Ali Rabiei, porta-voz do governo iraniano
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