Correio Braziliense
postado em 18/01/2020 04:14
Quem tem cachorro sabe que eles são altamente sintonizados com seus tutores e podem entender prontamente uma ampla gama de comandos e gestos. Mas essas habilidades são inatas ou aprendidas exclusivamente por meio de treinamento? Para descobrir, uma pesquisa publicada na Frontiers in Psychology investigou se cães vira-latas não adestrados seriam capazes de compreender o gestual humano.
Os cachorros foram domesticados entre 10 mil e 15 mil anos atrás, o que faz deles os mais antigos animais do planeta nessa situação. Os humanos, então, passaram a criar cães com as características consideradas mais desejáveis e úteis, para que pudessem servir de companheiros e auxiliar em trabalhos. Isso levou os animais a serem altamente receptivos a comandos e gestos.
No entanto, não estava claro se eles nos entendem apenas com o treinamento ou se isso é inato. Os cães podem interpretar um sinal sem treinamento específico ou mesmo sem conhecer a pessoa que gesticulou para eles? Segundo os pesquisadores, uma maneira de descobrir isso é verificar se cães que vivem nas ruas, sem treinamento, podem interpretar e reagir a gestos humanos.
O estudo revelou que cerca de 80% dos cães participantes que se aproximaram dos humanos entenderam o gesto de apontar para um local específico, apesar de nunca terem recebido treinamento prévio. Os resultados sugerem que os cachorros podem compreender sinais complexos simplesmente observando seres humanos, e isso, segundo os autores, tem implicações na redução do conflito entre cães que vivem nas ruas e pessoas.
Cães de rua são comuns em cidades ao redor do mundo, particularmente em muitos países em desenvolvimento. Embora possam observar e ocasionalmente interagir com as pessoas, eles nunca foram treinados e, normalmente, têm um comportamento mais “selvagem” que os animais de estimação. Conflitos entre eles e humanos são um problema, e entender como os seres humanos moldam seu comportamento pode ajudar a aliviar isso, sustentam os pesquisadores.
Adaptabilidade
Anindita Bhadra, do Instituto Indiano de Educação e Pesquisa em Ciências de Calcutá, na Índia, e os colaboradores estudaram o comportamento de cães de rua em várias cidades indianas. Os pesquisadores abordaram animais solitários e colocaram duas tigelas cobertas no chão, perto deles. Um pesquisador apontou para uma das duas vasilhas, momentânea ou repetidamente, e registrou se o cão se aproximava do objeto indicado. Eles também registraram o estado emocional percebido dos cães durante o experimento.
Aproximadamente metade dos cães não se aproximou de nenhuma tigela. No entanto, os pesquisadores notaram que esses animais estavam ansiosos e podem ter tido más experiências com seres humanos anteriormente. Os cães que chegaram perto das vasilhas se mostraram mais amigáveis e menos ansiosos, e aproximadamente 80% deles seguiram corretamente os sinais apontados, independentemente de a indicação ser momentânea ou repetida. Isso sugere que os cães podem decifrar gestos complexos.
“Achamos incrível que os cães possam seguir um gesto tão abstrato quanto apontar momentaneamente”, explicou Bhadra. “Isso significa que eles observam de perto a pessoa com quem estão se encontrando pela primeira vez e usam sua compreensão dos humanos para tomar uma decisão. Isso mostra sua inteligência e adaptabilidade”, afirma. Segundo ela, os resultados sugerem que os cães podem ter uma capacidade inata de entender certos gestos que transcendem o treinamento. No entanto, deve-se notar que os animais mais ansiosos e tímidos tendem a não participar. Portanto, estudos futuros são necessários para determinar com mais precisão como a personalidade de um cachorro afeta sua capacidade de entender os sinais humanos.
No geral, os cães podem ser mais perspicazes do que imaginamos, dizem os pesquisadores. “Precisamos entender que os cachorros são animais inteligentes que podem coexistir conosco”, diz Bhadra. “Eles são capazes de entender nossa linguagem corporal e precisamos dar espaço a eles. Um pouco de empatia e respeito por outras espécies podem reduzir muito os conflitos.”
80%
dos cães participantes que se aproximaram dos humanos entenderam o gesto de apontar para um local específico
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