Correio Braziliense
postado em 26/01/2020 09:58
Ao lado do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, Jair Bolsonaro reforçou neste sábado, 25, uma velha reivindicação da diplomacia brasileira: uma vaga de membro permanente no Conselho de Segurança da ONU - posto que a Ãndia também deseja.
"São dois grandes paÃses. Estamos entre as dez maiores economias do mundo, juntos somos 1,5 bilhão de habitantes", comentou Bolsonaro a jornalistas após chegar ao hotel em que está hospedado na capital indiana para uma missão presidencial de quatro dias. "Acredito que seria bom para o mundo Brasil e Ãndia estarem nesse clube".
As declarações foram dadas após a assinatura de 15 atos para promover e facilitar o comércio e os investimentos entre ambos os paÃses.
Em seu discurso, Modi disse que Brasil e Ãndia têm objetivos convergentes. "Nossas visões, em vários desafios enfrentados pelo mundo de hoje, são muito parecidas, incluindo nossa parceria no Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Ãndia, China e Ãfrica do Sul), a reforma do Conselho de Segurança da ONU e de outras organizações internacionais."
A reivindicação do Brasil é histórica. Antes mesmo da fundação da ONU, ainda no perÃodo da Liga das Nações, o Brasil manobrava por um assento no Conselho Executivo (a versão do CS na época). Em 1926, após uma tentativa frustrada de vetar a entrada da Alemanha no órgão, o presidente brasileiro Artur Bernardes abandonou a organização.
Os planos foram retomados pelo presidente José Sarney, nos anos 80. O esforço do Itamaraty se intensificou durante as gestões dos dois chanceleres de Itamar Franco: Fernando Henrique Cardoso e Celso Amorim. No entanto, o clima de pós-Guerra Fria, favorável a uma reforma da ONU, mudou com os atentados de 11 de setembro de 2001, nos EUA.
Os ataques recolocaram a segurança na agenda global e a ONU entrou em crise. Na esteira da guerra ao terror, declarada pelo presidente americano, George W. Bush, os EUA atacaram o Iraque sem a aprovação do Conselho de Segurança, em março de 2003.
Em agosto do mesmo ano, um atentado em Bagdá matou 22 pessoas, entre elas o alto comissário para os direitos humanos, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, um dos mais influentes funcionários da ONU e amigo pessoal do secretário-geral, Kofi Annan. "Chegou a hora de a ONU se renovar", disse Annan. "Sob o risco de se tornar irrelevante."
Durante os meses seguintes, o Secretariado da ONU recebeu mais de cem propostas para reformar a organização. Na ocasião, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se identificou com o tema e aproveitou a abertura dada por Annan para reforçar a reivindicação brasileira.
Em 2005, o Brasil formou o G-4, ao lado de Alemanha, Japão e Ãndia, para atuar em conjunto pela reforma do CS da ONU. A manobra, porém, não avançou em razão do contra-ataque diplomático de rivais regionais: México, Argentina, Itália, Espanha, Coreia do Sul e Paquistão criaram um grupo batizado de "Unidos pelo Consenso", que barrou a reforma.
Hoje, o Conselho de Segurança da ONU tem 15 membros, sendo 5 permanentes e com poder de veto: EUA, Rússia, China, Reino Unido e França. Os outros dez integrantes são eleitos pela Assembleia- Geral para mandatos de dois anos.
Brasil pode rever ação por subsÃdio ao açúcar contra Ãndia na OMC, diz Bolsonaro
Bolsonaro também afirmou neste sábado que pode rever a ação que o Brasil move contra a Ãndia na Organização Mundial do Comércio (OMC) por conta de subsÃdios à produção e exportação de açúcar. Modi pediu ao Brasil para que retire a ação referente ao açúcar e recebeu um aceno positivo.
Questionado por jornalistas sobre o tema, Bolsonaro respondeu que fará o possÃvel para atender ao pedido. "Ele me disse que o açúcar comercializado para fora equivale a 2% do montante. Isso é pequeno. Pedi para o Ernesto Araújo (ministro das Relações Exteriores) a possibilidade de rever essa posição do Brasil".
O presidente disse que o Brasil não vai exigir nada em contrapartida, mas ressaltou que seria importante que a Ãndia aumentasse sua produção de etanol. "O etanol... essa tecnologia nossa vindo pra cá, eles querem isso aÃ, acaba nos favorecendo também. Daà produz menos açúcar aqui, ajuda a equilibrar o mercado e é um sinal de aproximação com a Ãndia muito forte".
Brasil, Austrália e Guatemala pediram a abertura de um painel da OMC para analisar os subsÃdios do governo indiano para produção e exportação de açúcar. O contencioso foi iniciado em fevereiro de 2019 e o Brasil apresentou seu pedido para o estabelecimento de um painel em julho de 2019, tudo já durante a gestão de Bolsonaro. O governo brasileiro argumentou, na ocasião, que as polÃticas indianas geraram prejuÃzos aos agricultores do Brasil, ao ajudar a derrubar as cotações do produto.
"Eu sou um capitão, ele é um pacifista"
Em seu primeiro dia de agenda oficial na Ãndia, Jair Bolsonaro visitou neste sábado o local onde estão as cinzas de Mahatma Gandhi. Na cerimônia, estavam presentes duas visões de mundo diferentes: o presidente brasileiro, conhecido pela retórica agressiva e belicosa, lançando flores para o pacifista indiano, lÃder da resistência contra o domÃnio britânico e "patriarca" do paÃs.
"Olha, eu sou um capitão do Exército. Ele é um pacifista, tá certo? Mas, obviamente, a gente reconhece o seu passado sempre pregando a paz, a harmonia, a liberdade", disse Bolsonaro.
A tradição de lÃderes estrangeiros oferecem flores a Gandhi é uma forma de demonstrar a importância do indiano. "Os valores da paz e do pacifismo influenciaram vários ativistas de direitos humanos e pensadores em todo o planeta. A filosofia de Gandhi é muito apolÃtica e ele é uma figura admirada por quase todas as pessoas", disse o professor Umesh Mukhi, da FGV-SP. "A visita ao memorial é um sinal de honra e respeito aos valores e tradições da cultura indiana."
Gandhi é também um sÃmbolo de unidade da Ãndia, paÃs de 1,3 bilhão de habitantes com distintas etnias, idiomas e religiões. Os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, em 1996, e Luiz Inácio Lula da Silva, em 2004, também homenagearam o lÃder pacifista indiano.
Em sua viagem de quatro dias à Ãndia, Bolsonaro já foi a um templo hindu e visitou o mercado de Dilli Haat. Antes de voltar a BrasÃlia, amanhã, ele tem programada uma visita ao Taj Mahal, um dos pontos turÃsticos mais conhecidos do paÃs.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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