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O surto, agora, é de gripe aviária

Em meio à crise do novo coronavírus, Pequim confirma o registro de H5N1 na província de Hunan, o que pode agravar o clima de desconfiança internacional e aprofundar o isolamento do gigante asiático. EUA e Austrália vetam a entrada de chineses em seus territórios

Correio Braziliense
postado em 02/02/2020 04:27
Rua deserta na capital chinesa: medo de contágio faz com que as pessoas permaneçam em suas residências e só saiam com máscaras de proteção


Isolada pelo restante do mundo devido à epidemia do novo coronavírus, a China poderá ser alvo de mais desconfiança nos mercados internacionais com o anúncio, confirmado pelo governo, do ressurgimento do micro-organismo H5N1, o causador da gripe aviária. Por enquanto, o vírus foi identificado apenas em aves — mais de 22 mil foram abatidas, sendo 4,5 mil em Hunan, apontado como epicentro do novo surto.

Em humanos, a gripe aviária é altamente letal: 60% dos infectados morrem, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Contudo, diferentemente do novo coronavírus, que contaminou 11.791 na China, o H5N1 não passa facilmente para pessoas. Além das ameaças à saúde pública, a economia do país sente os impactos dos patógenos. Há dois anos, o setor pecuário luta contra um surto de febre suína africana, que dizimou a produção de porcos — principal fonte de proteína na nação de 1,3 bilhão de habitantes. A carência do produto elevou os preços em geral, provocando a maior inflação em oito anos.

Ontem, Austrália e Estados Unidos aderiram à lista de países que anunciaram vetos à entrada de pessoas procedentes do gigante asiático, onde a epidemia deixou mais de 300 mortos até agora. Por enquanto, o vírus afeta mais de 20 países, incluindo Espanha, Reino Unido, Rússia e Suécia, as nações mais recentes a anunciar casos, enquanto África e América Latina parecem livres, até o momento, da epidemia. Somente na sexta-feira passada, 2,1 mil novos casos foram diagnosticados na China, afirmou ontem a Comissão Nacional da Saúde.

Restrições

Diante da gravidade da situação, a OMS decidiu, na quinta-feira, declarar a epidemia emergência de saúde pública de alcance internacional, a classificação mais séria para um surto do tipo. Mesmo antes disso, vários países enviaram aviões à região em que surgiu o foco da doença, a província de Hubei, para repatriar seus cidadãos, enquanto outros optaram por fechar as fronteiras e impor restrições à circulação.

O governo dos Estados Unidos ordenou medidas excepcionais para impor o isolamento dos passageiros procedentes da China, e sobretudo do epicentro da epidemia, a cidade de Wuhan, sejam norte-americanos ou não. A partir das 19h de hoje (horário de Brasília), Washington proibirá a entrada em seu território de todas as pessoas não norte-americanas que tenham passado pela China nas últimas duas semanas, anunciou o secretário de Saúde, Alex Azar.
Os cidadãos dos EUA que visitaram Hubei nas duas semanas anteriores serão obrigados a passar por um período de isolamento de até 14 dias. A Austrália também anunciou a proibição de entrada em seu território de qualquer pessoa não residente procedente da China, uma medida similar às anunciadas por outros países, como Itália, Cingapura e Mongólia, o que provoca mal-estar em Pequim.

“Não é necessário entrar em pânico de maneira inútil, nem adotar medidas excessivas”, afirmou o embaixador da China em Genebra, Xu Chen, antes de recordar que a OMS tem “plena confiança na China”. O governo chinês apontou diretamente para Washington em suas críticas, ao reprovar o fato de ter recomendado a seus cidadãos que não viajem ao país asiático ou que o abandonassem o mais rápido possível. “As palavras e os atos de algumas autoridades norte-americanas não estão baseados em fatos nem são apropriados”, afirmou a porta-voz da diplomacia chinesa, Hua Chunying.

A OMS advertiu que as restrições à circulação poderiam ser contraproducentes durante uma emergência de saúde, pelo risco de prejudicar a distribuição de ajuda e de abalar a economia dos países afetados.

Origem

Ao que tudo indica, a epidemia do novo coronavírus surgiu em dezembro em um mercado de Wuhan, uma metrópole que, de fato, está de quarentena desde 23 de janeiro. Tanto a cidade como sua região, onde vivem quase 56 milhões de pessoas, estão isoladas do mundo. Os hospitais da cidade estão lotados. O governo decidiu construir um novo centro de saúde com capacidade para 1 mil pacientes, que deve ser inaugurado amanhã.

Em outras regiões do país, o medo de contágio domina os chineses, que têm receio de sair de casa e, quando saem, utilizam máscaras de proteção. Na entrada de um grande parque de Pequim, praticamente deserto, um guarda mede a temperatura dos poucos visitantes com um termômetro digital. “Se você superar 37,3 ºC, determinamos o isolamento”, advertia.

Muitos cidadãos criticaram as autoridades pela demora em informar sobre o vírus e, na sexta-feira, o principal dirigente político de Wuhan admitiu que sentia “culpa” por ter ordenado restrições aos deslocamentos de maneira tardia. “Estou repleto de culpa e de remorso”, admitiu Ma Guoqiang, secretário local do Partido Comunista Chinês.

» Núpcias adiadas
 O governo chinês pediu o adiamento dos casamentos planejados para hoje e que funerais sejam encurtados, como forma de tentar impedir a propagação do coronavírus. O dia 2 de fevereiro é considerado este ano como um dia de sorte para o matrimônio, pois o “02022020” é um número palíndromo. Antes do surto, Pequim, Xangai e outras cidades haviam decidido abrir os cartórios hoje, mesmo sendo um domingo. Em outro comunicado, foi solicitado que os velórios aconteçam “de maneira simples e rápida para evitar a congregação de pessoas” e que os corpos das vítimas do coronavírus sejam cremados o mais 
rápido possível.
 
 

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