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O aborto de volta ao debate

Presidente Alberto Fernández pretende encaminhar, esta semana, novo projeto ao Congresso para descriminalizar a interrupção da gravidez. Em 2018, proposta foi aprovada na Câmara, mas derrubada no Senado. O tema, polêmico, mobiliza a sociedade

Correio Braziliense
postado em 09/03/2020 04:35
Freiras participam de missa que reuniu uma multidão na Basília de Luján, a 75km de Buenos Aires, contra a mudança na lei

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, deve encaminhar esta semana ao Congresso um novo projeto para a legalização do aborto no país. Em 2018, o tema foi aprovado na Câmara, mas não passou pelo Senado. Agora, antes mesmo de a proposta ser reapresentada, ativistas contra e a favor iniciam a segunda batalha em torno do assunto.

Ontem, a Igreja Católica argentina celebrou uma missa “a favor da vida” para mobilizar seus fiéis contra a descriminalização da interrupção da gravidez.

“Milhões de argentinos e argentinas, crentes e não crentes, têm a profunda convicção de que existe vida desde a concepção”, ressaltou o monsenhor Oscar Ojea, presidente do Episcopado da Argentina, em sua homilia.

O cenário na política atualmente é bem diferente do que há dois anos. Desde então, houve uma renovação parcial nas duas câmaras legislativas e, agora, com o impulso de Fernández, o movimento feminista também retoma, ainda hoje, a agenda de manifestações nas ruas. “Entendemos que é um momento histórico e temos que seguir organizadas na rua”, disse Victoria Tesoriero, da Campanha Nacional pelo Direito ao Aborto.

Ao anunciar, na semana passada, sua decisão de levar ao Senado um projeto de legalização do aborto, Fernández foi enérgico. “O aborto acontece. É um fato. No século 21, toda sociedade precisa respeitar a decisão individual de seus membros a disporem livremente de seus corpos”, enfatizou.

Na missa de ontem, monsenhor Ojea classificou como “injusto e doloroso” chamar de “hipócritas” os que defendem a vida desde a concepção, em alusão à fala do presidente.

Crime
O aborto na Argentina é permitido apenas em casos de estupro ou quando a vida da mulher está em risco, conforme estabelecido no Código Penal, desde 1921. Fora dessas causas, é punível com sentenças de um a quatro anos de prisão.

Na América Latina, este país foi pioneiro em legalizar o matrimônio igualitário e a lei de identidade de gênero. Se o aborto for legalizado, será a quarta conquista para os pró-escolha na região, depois de Cuba, Uruguai e Cidade do México.

Segundo a última pesquisa sobre crenças e atitudes religiosas na Argentina, entre 2008 e 2019 duplicou a proporção de pessoas que dizem que o aborto é um direito da mulher. Assim, o número de argentinos que acreditam que “uma mulher deve ter direito ao aborto sempre que assim decidir” passou de 14,1%, em 2008, para 27,3%, no ano passado.

No entanto, ainda que em menor escala, também aumentou a quantidade de pessoas que pensam que o “aborto deve ser proibido sempre”: de 16,9%, em 2008, para 18,7%, em 2019.

Após a derrota de 2018, a campanha pelo aborto legal introduziu, no ano seguinte, outro projeto que não foi para frente e que terá de ser harmonizado com a futura proposta do governo. Os pontos principais para o movimento feminista consistem em garantir o aborto livre até a 14ª semana de gestação e o atendimento no sistema de saúde pública, completou.

Com bandanas verdes fazendo a identificação, as ativistas a favor da legalização do aborto preveem uma greve de mulheres e uma manifestação até o Congresso, hoje. “Estamos em uma nova etapa do feminismo, tanto no país quanto em toda região”, destacou Victoria Tesoriero.

Os ativistas pró-vida saíram na frente. A missa de ontem, que coincidiu com o Dia Internacional da Mulher, reuniu uma multidão na Basílica de Luján, principal local de culto da Argentina, a 75km de Buenos Aires, com o lema “sim às mulheres, sim à vida”.

“A Igreja está disposta a ter um papel de protagonista e a pressionar de alguma maneira o governo de Fernández, porque ele recebeu apoio durante a campanha de vários setores da igreja, especialmente em temas como a fome e a pobreza”, assinalou Camila Duró, porta-voz do movimento Frente Jovem.


"O aborto acontece. É um fato. No século 21, toda sociedade precisa respeitar a decisão individual de seus membros a disporem livremente de seus corpos”
Alberto Fernández, presidente da Argentina



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