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O vírus da discórdia

Washington e Pequim em rota de colisão depois que o presidente norte-americano passou a se referir ao Sars-Cov-2 como %u201Cchinês%u201D, em referência ao fato de ter surgido no país asiático, que considera a nomenclatura xenófoba e racista

Correio Braziliense
postado em 18/03/2020 04:14
Médicos de Wuhan, primeiro epicentro da Covid-19, se preparam para atendimento de pacientes infectados pelo novo coronavírus:  fim do pico de contágios




Estados Unidos e China elevaram o tom das acusações mútuas acerca da origem do novo coronavírus, cuja pandemia já provocou mais de 7 mil mortes em todo o mundo. No mais recente capítulo de uma série de desacordos entre os dois países nessa crise global da saúde, autoridades de Pequim protestaram, ontem, depois que o presidente americano, Donald Trump, descreveu o Sars-Cov-2 como um “vírus chinês”.

Nos últimos dias, várias autoridades chinesas divulgaram teorias sobre uma suposta conspiração e até apontaram que o novo coronavírus foi levado para a China pelos militares dos EUA. Por sua vez, membros do governo Trump usam termos para descrevê-lo que têm estigmatizado Pequim.

“Os Estados Unidos apoiarão fortemente as indústrias, como companhias aéreas e outras, que são particularmente afetadas pelo vírus chinês”, escreveu Trump, no Twittter, na segunda-feira.

Horas depois, o presidente americano foi ainda mais explícito. “(O vírus) veio da China. Acho que essa é uma fórmula muito precisa”, disse o chefe da Casa Branca. “A China difunde informações erradas de que nosso Exército teria transmitido o vírus. Em vez de me meter em polêmica, disse: eu o chamarei usando o país de onde vem”.

Vários aliados de Trump já se referiram à pandemia como “coronavírus chinês”. O primeiro deles foi o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, que o nomeou “vírus de Wuhan”.

Estigma

A China reagiu ontem, dizendo que está “indignada” com essa expressão, que considera uma forma de “estigmatização”. Porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores, Geng Shuang advertiu que os EUA devem “cessar imediatamente suas acusações injustificadas” contra Pequim.

A agência de notícias chinesa Xinhua afirmou que usar “termos racistas e xenófobos para culpar outros países pelo surto revela a irresponsabilidade e incompetência dos políticos que apenas intensificam o medo do vírus”.

A guerra de declarações reacende as tensões entre os dois países, constantes desde a chegada de Trump à Presidência, principalmente em relação ao comércio.

Os comentários do republicano também foram criticados nos Estados Unidos, ante o risco de criação de novos conflitos com a comunidade asiática no país.

“Nossa comunidade asiático-americana — pessoas a quem você serve — está sofrendo muito. Elas não precisam de você para alimentar a intolerância”, tuitou o prefeito de Nova York, o democrata Bill de Blasio, cujo estado é um dos mais afetados pelo vírus nos EUA.

A primeira detecção mundial do novo coronavírus ocorreu na China, em dezembro do ano passado. As autoridades disseram que ele apareceu em um mercado de Wuhan, onde animais vivos estavam à venda. Mas, desde então, a China tem mantido reserva sobre a natureza do vírus e diz que sua origem é desconhecida.

Em conversa telefônica com Yang Jiechi, uma autoridade chinesa, Mike Pompeo expressou seu descontentamento pelo fato de os canais oficiais chineses “agora acusarem os Estados Unidos pela Covid-19”, segundo o Departamento de Estado.

O chefe da diplomacia americana enfatizou que “não é o momento de espalhar desinformação e rumores, mas de unir todos os países para combater essa ameaça comum”, segundo seu gabinete.

Na sexta-feira passada, o Departamento de Estado chamou o embaixador chinês nos Estados Unidos, Cui Tiankai, para denunciar as teorias da conspiração espalhadas por Pequim, muito presentes nas redes sociais.

Um porta-voz da diplomacia chinesa, Zhao Lijian sugeriu na semana passada no Twitter que o “paciente zero” da pandemia pode ter sido exportado dos Estados Unidos.

Por sua parte, Pompeo vinculou o vírus à China, falando várias vezes do “vírus de Wuhan”, apesar dos profissionais da saúde refutarem esse tipo de apelo geográfico e preferirem um nome neutro para se referir à doença.

De acordo com a OMS, em todo o mundo, houve 173.344 casos confirmados e 7.019 mortes em decorrência do novo coronavírus em 152 países e territórios.

Nos EUA, são mais de 3,8 mil casos confirmados da Covid-19, com 69 mortes. Por outro lado, na China, a sensação é de que o pior já passou. O país asiático, primeiro epicentro do vírus, anunciou, na semana passada, o fim do pico de infecções. Quase ao mesmo tempo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretava que o surto se tornara uma pandemia.



“A China difunde informações erradas de que nosso Exército teria transmitido o vírus. Em vez de me meter em polêmica, disse: eu o chamarei usando o país de onde vem”
Donald Trump, presidente dos EUA



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