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Entre a pandemia e a crise política

Sob pressão, o premiê da Espanha, Pedro Sánchez, é acusado de subestimar o número real de vítimas do novo coronavírus, fica distante de um pacto nacional e garante que foi o primeiro líder a agir contra a doença

Correio Braziliense
postado em 10/04/2020 04:04
Médicos do governo regional de Madri socorrem paciente com Covid-19 transferido pelo Serviço de Emergência de Risco Biológico

Enfraquecido, o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, precisa se equilibrar entre a resposta à pandemia e a grave tensão política, provocada pelas denúncias de que o governo tem subestimado o balcanço real de vítimas da Covid-19. Com 153.222 infectados, o país amargava na noite de ontem um total de 15.447 mortes — 638 novos óbitos em 24 horas. Ao todo, 52.156 pacientes se recuperaram. Ainda que os números de casos positivos de infecções pelo novo coronavírus e de falecimentos tenham apresentado tímida redução, a Espanha é a segunda nação em número de doentes e de mortos. Depois de uma sessão no Parlamento que se arrastou por 11 horas de debates, o socialista Sánchez prorrogou o estado de alarme até 26 de abril e admitiu que pode solicitar uma terceira extensão, até 10 de maio. No entanto, analistas creem que o premiê ficou mais distante de costurar um “grande pacto nacional de reconstrução social e econômica”.

De acordo com a agência de notícias France-Presse, o balanço de óbitos motivados pela Covid-19 inclui apenas as vítimas que testaram positivo para o novo coronavírus — a checagem de diagnóstico não é realizada em todos os casos suspeitos. O sentimento entre os políticos da oposição é de desconfiança. “Os espanhóis merecem saber a verdade. A Espanha é o país do mundo com mais mortes por milhão de habitantes. (…) Você não vai pedir perdão?”, disparou Pablo Casado, líder do Partido Popular (PP, de direita). Em seu pronunciamento no Parlamento, Sánchez tentou defender sua gestão. “Nenhum governo pode dizer que foi bem. Tampouco o nosso. Mas a Espanha foi o primeiro país a agir”, declarou.

Professor de ciência política da Universidade de Salamanca, Manuel Alcantara Sáez explicou ao Correio que as críticas na Espanha sobre a gestão da crise seguem as linhas da profunda polarização presente no país desde  a posse do governo de Sánchez, em 2 de junho de 2018. “A direita, a extrema direita e, em menor medida, algumas forças independentistas aproveitam a crise para atacar um governo que se mostra estruturalmente frágil. Sobre essa base é muito difícil que Sánchez consiga firmar um grande pacto nacional. Este é o principal erro do premiê”, comentou.

Sáez lembra que o coronavírus começou a atingir a Europa em fevereiro e que as medidas tomadas pelo Palácio de Moncloa, sede do governo espanhol, passaram a vigorar em 9 de março. “O principal problema enfrentado pela Espanha é o transbordamento do sistema de saúde, resultado do pouco investimento realizado ao longo da última década. Em casos como o de Madri, a culpa recai sobre medidas de precarização do governo regional de direita, colocadas em marcha nos últimos 20 anos.” As autoridades da região da capital espanhola, a mais afetada, reconheceram na quarta-feira que o número de mortes em casas de repouso pode inflar as estatísticas oficiais, pois foram excluídas quase 3.500 óbitos de pessoas com sintomas da Covid-19. A justificativa do governo de Sánchez é de que o método de contagem adotado pela Espanha é mais completo do que o adotado por nações vizinhas e atende aos parâmetros formulados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).



O primeiro-ministro sentiu a pressão. Em seu discurso, Pedro Sánchez cobrou “lealdade e unidade” dos políticos espanhois. “Enquanto em todos os países a pandemia serviu para minimizar as rivalidades políticas, na Espanha está servindo para agravar o confronto político”, lamentou. A oposição também o acusa de colocar em risco os profissionais de saúde, ao não municiá-los de equipamentos de proteção individual suficientes, e de arruinar a nação, ao paralisar a atividade econômica não essencial por 10 dias.

“Não baixar a guarda”

Após quase um mês de confinamento, as autoridades destacam ter contido a epidemia, mas pedem à população que respeite as medidas de distanciamento social, a fim de “achatar a curva” e aliviar a pressão nos hospitais. “A taxa de crescimento e a velocidade com que a doença está se espalhando estão diminuindo”, afirmou a médica María José Sierra, do centro de emergências em saúde. As infecções e mortes, agora, aumentam menos de 5%, mas o saldo diário de contaminações continua a superar os que recebem alta.

“Nossa prioridade agora é não retornar sob nenhuma circunstância ao ponto de partida, não baixar a guarda”, disse Pedro Sánchez. Desde 14 de março, os quase 47 milhões de espanhóis não podem sair de casa, exceto para trabalhar ou realizar atividades básicas, como comprar alimentos ou remédios.



Eu acho...


“O governo de Pedro Sánchez é frágil. Qualquer cálculo sobre quando e como a crise terminará é prematuro. Em todo o caso, o papel da União Europeia na gestão da pandemia será muito importante.”
Manuel Alcantara Sáez, professor de ciência política da Universidade de Salamanca
 
 
 
 
 




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