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Antiviral rompe ciclo de replicação

Duas pesquisas independentes mostram que o remdesivir, remédio usado contra o ebola, impede que o Sars-Cov-2 se espalhe, o que pode amenizar os efeitos da Covid-19. Quase a metade de pacientes em estado grave tratados com a droga recebeu alta

Correio Braziliense
postado em 14/04/2020 04:06
Pacientes receberam ao menos uma dose do remédio e foram acompanhados ao longo de 18 dias: observações %u201Cesperançosas%u201D

 

 

 

Desenvolvido originalmente para combater o ebola, o medicamento antiviral remdesivir apresentou bons resultados em testes contra o Sars-Cov-2, vírus que causa a Covid-19. Dois estudos independentes relataram que a substância é eficaz para quebrar o ciclo de replicação do micro-organismo. Um deles, baseado em testes com um pequeno número de pessoas, mostrou índice alto de recuperação de pacientes que estavam internados em estado grave.

 

No fim de fevereiro, pesquisadores da Universidade de Alberta, no Canadá, haviam descoberto que o remdesivir era eficaz contra o vírus da síndrome Respiratória do Oriente Médio (Mers), um coronavírus relacionado ao Sars-Cov-2. A substância é um dos vários medicamentos que estão tendo os ensaios clínicos acelerados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em pacientes com Covid-19 hospitalizados em diversos países.

 

Um dos hospitais que testam o medicamento é o Cedars-Sinai, nos Estados Unidos. Em um artigo publicado na revista The New England Journal of Medicine, pesquisadores dessa e de outras instituições nos EUA, na Europa, no Canadá e no Japão relatam que, em um pequeno grupo de pacientes internados em estado grave e tratados com a substância, 68% tiveram melhora clínica e 47% receberam alta hospitalar.

 

Jonathan Grein, diretor de Epidemiologia Hospitalar do Cedars-Sinai e um dos autores do estudo, explica que a terapia experimental foi fornecida aos pacientes por uso compassivo. Esse programa permite, nos Estados Unidos, acesso a tratamentos ainda não aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) quando um paciente tem uma condição com risco de morte e nenhuma outra opção está disponível.

 

A análise incluiu dados de 53 pacientes, que receberam pelo menos uma dose de remdesivir até 7 de março. Os resultados mostraram que 68% das pessoas tratadas com a substância apresentaram melhora no nível de suporte de oxigênio ao longo dos 18 dias de acompanhamento. Além disso, das 34 que foram intubadas e necessitaram de ventiladores mecânicos, 57% tiveram os tubos respiratórios retirados. Quase metade (47%) recebeu alta hospitalar.

 

“Atualmente não há tratamento comprovado para a Covid-19. Não podemos tirar conclusões definitivas desses dados, mas as observações sobre esse grupo de pacientes são esperançosas”, afirma Grein. “Estamos ansiosos pelos resultados de ensaios clínicos controlados para validar potencialmente essas descobertas.”

O pesquisador ressalta que programas de uso compassivo são menos rigorosos do que um estudo controlado randomizado — no qual se compara pacientes que estão recebendo o tratamento experimental àqueles que foram submetidos à terapia padrão. Porém, durante a pandemia de Covid-19, os dados de uso compassivo podem ajudar os cientistas a entender os riscos potenciais, além de dar uma ideia sobre a viabilidade de um tratamento experimental, destaca Grein. “É fundamental que a comunidade médica encontre um tratamento seguro e eficaz para a Covid-19 e que seja suportado por dados sólidos”, afirma o pesquisador.


"Ação direta"

 

Em outro estudo, publicado ontem na revista Journal of Biological Chemistry, pesquisadores da Universidade da Alberta relatam que o remdesivir é “altamente eficaz para interromper o mecanismo de replicação do coronavírus que causa a Covid-19”. Matthias Götte, chefe de microbiologia médica e imunologia da instituição, conta que dados de pesquisas anteriores deram esperança à equipe de que o mecanismo de ação da substância teria um bom efeito contra o novo coronavírus.

 

“Estávamos otimistas de que veríamos os mesmos resultados do vírus da Mers contra o Sars-Cov-2”, diz Matthias Götte. “Obtivemos resultados quase idênticos aos relatados anteriormente com a Mers. Portanto, vemos que o remdesivir é um inibidor muito potente das polimerases de coronavírus”, diz. Polimerases são enzimas usadas pelos vírus para se replicarem dentro das células dos hospedeiros. “Se você atingi-las, o vírus não pode se espalhar, por isso é um alvo muito lógico para o tratamento da Covid-19.”

 

No laboratório, os cientistas demonstram como o remdesivir confunde o vírus, imitando seus blocos de construção. “Conseguimos enganá-lo incorporando um inibidor de polimerase no coronavírus, de forma que ele não consegue se replicar”, explica o cientista.

 

Götte afirma que as descobertas do estudo, com resultados de pesquisas publicadas anteriormente em modelos celular e animal, significam que o remdesivir pode ser classificado como um “antiviral de ação direta” contra o Sars-Cov-2. Esse termo foi usado pela primeira vez para descrever novas classes de antivirais que interferem em etapas específicas do ciclo de vida do vírus da hepatite C (HCV).

 

De acordo com Götte, a descoberta dessa ação direta reforça a promessa de ensaios clínicos para o remdesivir em pacientes com Covid-19. Porém, ele alerta que os resultados obtidos em laboratório não podem ser usados para prever como o medicamento funcionará com as pessoas. “Temos que ser pacientes e aguardar os resultados dos ensaios clínicos randomizados”, destaca. 

 

68 %

dos 53 pacientes em estado grave submetidos ao tratamento experimental apresentaram melhora clínica 

 

 

 

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