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Sob críticas, China corrige números

Pequim revisa balanço de vítimas do novo coronavírus, admite mais 1.300 mortes e rejeita suspeitas de que doença teve origem em laboratório da cidade de Wuhan. Trump diz que total de infectados no país asiático é %u201Cmuito maior%u201D

Correio Braziliense
postado em 18/04/2020 04:05
Pintura em mural do Hospital Leishenshan, que ofereceu leitos para tratar a Covid-19, em Wuhan: 4.512 pessoas teriam morrido na província de Hubei

 

 

 

Uma revisão do total de mortes provocadas pelo novo coronavírus aumentou as suspeitas sobre a real dimensão da pandemia na China. Em meio a fortes críticas da comunidade internacional e a acusações de falta de transparência, as autoridades de Pequim anunciaram 1.300 óbitos adicionais. Até então, a China reconhecia 3.342 mortes e mais de 82 mil contágios em uma população de quase 1,4 bilhão de habitantes. Com a correção, os números de mortes e de infectados subiram, respectivamente, para 4.636 e 83.760. 

O anúncio dos chineses despertou a desconfiança dos Estados Unidos. “A China acaba de anunciar uma duplicação no número de mortes devido ao inimigo invisível. É muito maior do que isso e muito mais alto do que nos EUA, nem mesmo perto!”, escreveu, no Twitter, o presidente norte-americano, Donald Trump. Até o fechamento desta edição, os EUA somavam 692.169 casos de Covid-19 e 36.721 mortes. Em todo o mundo, 2.234.109 pessoas tinham sido infectadas e 153.379 morreram.

 

O governo chinês insiste que não ocultou dados sobre a pandemia e atribuiu a discrepância a “atrasos” e “omissões”. Segundo autoridades de Pequim, alguns óbitos não foram contabilizados por terem ocorrido nos estágios iniciais da pandemia, dentro de residências. Além disso, os médicos sobrecarregados se esforçaram mais em tratar as infecções pela Covid-19 do que em reportar mortes ao Estado. Também teria existido uma demora na coleta de dados de organizações govermamentais e privadas. Das 4.636 mortes reconhecidas pela China, 4.512 ocorreram na província central de Hubei.

 

O ajuste nos números ocorre no momento em que aumentam as dúvidas em relação à origem do novo coronavírus, o Sars-Cov-2. Uma reportagem do jornal The Washington Post revelou que, em 2018, a Embaixada dos Estados Unidos em Pequim externou sua preocupação em relação às insuficientes medidas de segurança em um laboratório que estuda o coronavírus em morcegos. Por sua vez, a emissora Fox News citou “vários fontes” que disseram acreditar que o Sars-Cov-2 partiu do mesmo laboratório, o Instituto de Virologia de Wuhan, situado na cidade de Wuhan — foco do novo coronavírus, em Hubei. As mesmas fontes disseram crer que o vírus natural teria fugido do laboratório exatamente devido aos protocolos de segurança ruins.

 

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, assegurou que “nunca houve acobertamento, nem se permitiu nenhuma ocultação” de informações. “Estão exaltando a questão das origens, insinuando que o vírus tivesse algo a ver com o Instituto de Virologia de Wuhan. Não é difícil de ver através de seus truques que eles pretendem turvar as águas, desviar a atenção e transferir a culpa para outros”, comentou Lijian, em referência direta aos Estados Unidos. “Como declaramos repetidamente, o rastreamento da origem do vírus é uma séria questão de ciência, onde precisamos prestar atenção e respeitar as visões baseadas na ciência”, acrescentou.

 

Professor de biologia computacional da Universidade de Berkeley (Califórnia), Rasmus Nielsen disse ao Correio não ver qualquer evidência sugerindo que o Sars-Cov-2 tenha sido geneticamente modificado no laboratório. “Em relação às origens do Sars-Cov-2, o que podemos dizer é que ele está mais intimamente ligado a alguns vírus presentes em morcegos e mais distante daqueles relacionados aos pangolins”, explicou, em alusão ao mamífero ameaçado de extinção cuja carne é consumida em algumas regiões da China. “A origem do vírus no pangolim é muito improvável. Não há evidências de que ele tenha sido transmitido do pangolim para o humano. Como ocorreu a transferência zoonótica dos morcegos para os humanos é pura especulação no momento”, disse Nielsen.

 

Além dos Estados Unidos, França e Reino Unido também criticaram o gerenciamento da crise, por parte da China. O presidente francês, Emmanuel Macron, fez coro com os americanos e afirmou: Não tenhamos essa espécie de inocência que consiste em dizer que foi muito mais forte” — em alusão à reação chinesa à pandemia. “Não sabemos e claramente ocorreram coisas que desconhecemos”, declarou, em entrevista ao jornal britânico Financial Times. 

 

 

 

» No centro da polêmica 

 

Situado entre as colinas que rodeiam a cidade chinesa de Wuhan, onde surgiu o novo coronavírus, um laboratório de tecnologia chinês está no centro de uma polêmica mundial. Entenda: 

 

O que dizem cientistas chineses

De acordo com eles, o novo coronavírus pode ter passado dos animais para o homem em um mercado que vendia animais vivos em Wuhan. A existência do laboratório alimenta especulações de que foi ali onde o vírus surgiu.

 

Instituto de Virologia de Wuhan

O instituto abriga o Centro de Cultivo de Vírus, o maior banco de vírus da Ásia, onde são preservadas mais de 1,5 mil variedades, segundo seu site. Dentro do complexo, encontra-se o maior laboratório da Ásia de segurança máxima, capaz de manipular patógenos de classe 4 (P4), vírus perigosos transmitidos entre pessoas, como o ebola. O laboratório custou US$ 42 milhões e foi concluído em 2015, embora não tenha sido aberto até 2018. O laboratório P4, de 3 mil metros quadrados, está localizado em um prédio quadrado com um anexo cilíndrico, aos pés de uma colina, nos arredores de Wuhan.

 

Versão comprometedora

O jornal The Washington Post e o canal de TV Fox News citaram fontes anônimas que indicam que o vírus pode ter saído, acidentalmente, do complexo. Segundo documentos diplomáticos aos quais o Post teve acesso, autoridades estavam preocupadas com a segurança inadequada dos pesquisadores ao manipularem vírus parecidos com o da Sars.

 

O que diz o governo da China

O porta-voz da chancelaria chinesa, Zhao Lijian, descartou as suspeitas sobre o laboratório. “Uma pessoa entendida compreenderá que a intenção é criar confusão, desviar a atenção do público e se esquivar da responsabilidade”, criticou Zhao, que citou rumores de que o Exército americano poderia ter levado o vírus para a China.

 

O que se sabe sobre o vírus

Cientistas acreditam que o vírus tenha surgido de um morcego e sido transmitido para o homem por meio

de uma espécie intermediária, possivelmente o pangolim. Mas um estudo de um grupo de cientistas chineses publicado em janeiro na revista The Lancet revela que o primeiro paciente com Covid-19 não tinha nenhuma ligação com o mercado de animais de Wuhan, tampouco 13 dos primeiros 41 pacientes. 

 

 

 

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