Mundo

Começa na Alemanha o 1° julgamento de membros do governo sírio por tortura

Dois supostos ex-oficiais de inteligência sírios vão a julgamento acusados de crimes contra a humanidade no primeiro processo judicial em todo o mundo por tortura patrocinada pelo Estado do regime de Bashar al-Assad

Correio Braziliense
postado em 23/04/2020 10:06
O réu sírio Anwar Raslan, 57, chega à corte para um julgamento sem precedentes de tortura patrocinada pelo Estado na Síria, em 23 de abril de 2020 na corte em Koblenz, oeste da Alemanha.O julgamento de dois supostos membros dos serviços de inteligência da Síria, o primeiro no mundo por tortura atribuída ao regime de Bashar Al-Assad, começou nesta quinta-feira (23/4) na Alemanha.

O principal suspeito, Anwar Raslan, 57 anos, se apresenta como um ex-coronel da Segurança de Estado e é acusado de crimes contra a Humanidade.

A Justiça atribui a ele a morte de 58 pessoas, a tortura de pelo menos 4 mil outras, um estupro e um ataque sexual agravado cometido entre 29 de abril de 2011 e 7 de setembro de 2012 no centro de detenção Al Khatib em Damasco, pelo qual ele era responsável.

O outro acusado é Eyad Al Gharib, 43 anos, que compareceu na audiência com o rosto coberto por uma máscara.

Ele é acusado de cumplicidade em crimes contra a Humanidade por ter participado da prisão de manifestantes que foram levados para essa prisão, entre 1 de setembro e 31 de outubro de 2011. 

Os dois homens, detidos provisoriamente desde 12 de fevereiro de 2019, fugiram de seu país e foram para a Alemanha, onde pediram asilo, como milhares de sírios fizeram desde 2011, quando a guerra no país começou.

Anwar Raslan afirma ter desertado no final de 2012 e, de acordo com vários meios de comunicação, se juntou à oposição no exílio antes de chegar à Alemanha em 26 de julho de 2014.

O julgamento, que acontece sob rigorosas medidas de segurança, irá até pelo menos meados de agosto no Tribunal Superior de Koblenz.

"É um passo importante, o início de um exame dos crimes [do regime sírio] perante uma alta corte alemã", disse à AFP Wolfgang Kaleck, secretário-geral da ONG ECGR.

Esta organização apoia 16 vítimas sobreviventes e algumas das quais são partes civis no julgamento.

Para julgar os sírios, a Alemanha aplica o princípio jurídico da jurisdição universal, que permite que um Estado julgue autores de crimes independentemente de sua nacionalidade e de onde os crimes foram cometidos.

Atualmente, é a única maneira de julgar crimes contra a Humanidade cometidos na Síria, porque, segundo as ONGs, o veto da Rússia e da China torna impossível recorrer ao Tribunal Penal Internacional (TPI).

Este julgamento "deve servir como um aviso para aqueles que cometem abusos na Síria. Ninguém está acima da Justiça", disse a Human Rights Watch (HRW).

A Anistia Internacional considera, por sua vez, "uma etapa importante na luta contra a impunidade nas violações dos direitos humanos cometidas na Síria". 

Os investigadores se baseiam nos testemunhos das vítimas que sobreviveram às condições "desumanas e degradantes" de detenção, segundo a Justiça, e que conseguiram chegar à Europa.

Durante o julgamento, é esperado o comparecimento de vítimas e testemunhas dos eventos. 

Também serão mostradas imagens das dezenas de milhares de fotos feitas por um ex-fotógrafo da polícia militar, que deixou o país sob o pseudônimo de "César", e que mostram corpos torturados.

Apesar do fato de o governo sírio negar tortura, o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH) garante que pelo menos 60.000 pessoas morreram sob tortura ou devido às duras condições de detenção nas prisões do regime.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags