Mundo

Protestos abafados

Em meio à recessão econômica e à pandemia do novo coronavírus, manifestações pelos direitos dos trabalhadores ocorrem com cartazes nas janelas e convocações virtuais. Alguns países registram carreatas, prisões e atos isolados, apesar do confinamento obrigatório

Correio Braziliense
postado em 02/05/2020 04:14
Ativista em Pamplona (Espanha):







Todos os anos, as principais capitais do planeta fervilham em manifestações para marcar as conquistas e exigir os direitos dos trabalhadores. Pela primeira vez em mais de um século, o clamor das ruas no 1º de Maio deu lugar ao silêncio e a poucos atos que, com raras exceções, atenderam às ordens de distanciamento social. A pandemia do novo coronavírus deixou motivos de sobra para protestos, com a perda de milhões de postos de trabalho em todo o mundo — apenas nos EUA, onde a Covid-19 fez pelo menos 237 mil vítimas, mais de 30 milhões de pessoas estão desempregadas. Por causa  do confinamento, que atinge mais da metade da população do planeta, os trabalhadores de vários países foram convocados a celebrar o dia com “manifestações virtuais” nas redes sociais ou com cartazes nas janelas das casas.

Em Cuba, bandeiras do país surgiram nas varandas e nas fachadas dos prédios. A multidão, acostumada a se reunir na Praça da Revolução, um dos locais icônicos de Havana, dessa vez ficou em casa. Sob chuva, a emblemática praça, que tem como pano de fundo os rostos dos guerrilheiros Ernesto Che Guevara e Camilo Cienfuegos, estava deserta. Todos os anos passam por ali cerca de 1 milhão de pessoas por causa dessa data, segundo números oficiais. A tradicional marcha anual pelas ruas da cidade também foi cancelada.

Na França, avenidas vazias e protestos solitários, com o uso de cartazes. “Macronavírus, quando isso acabará?”, estava escrito em um deles, numa alusão ao presidente Emmanuel Macron, e “Hoje confinados; amanhã, revoltados”, afirmava outro. “Esse 1º de maio é diferente de qualquer outro”, resumiu Macron. A última vez em que não houve aglomerações nas ruas francesas foi nos anos 1950 e 1960, com a proibição das manifestações durante as guerras da Indonésia e da Argélia.



Em várias nações, para evitar a propagação do novo coronavírus, sindicatos convidaram os trabalhadores a se mobilizarem de outra forma: conferências ou shows sem público por meio da internet ou da divulgação de fotos nas redes sociais, como instrumento de protesto. Para eles, a epidemia evidenciou o papel essencial de algumas profissões até há pouco valorizadas — seja na saúde, no comércio ou na limpeza — e contribuiu para o aumento das tensões sociais.

A pandemia atinge fortemente a economia, com a suspensão das atividades da indústria, comércio e serviços, além do aumento de desemprego. Apesar do risco de infecção, ativistas de algumas regiões escolheram não permanecer em casa. Na Turquia, a polícia prendeu vários líderes sindicais que, com máscaras, desfilavam por Istambul até a simbólica Praça Taksin.

Nas Filipinas, pequenos grupos desafiaram igualmente a ordem para pedir ajuda pública e melhores condições trabalhistas. A polícia anunciou a prisão de, pelo menos, três pessoas. Ao som de músicas como Bella ciao, os gregos desafiaram o adiamento, pelo governo, de qualquer manifestação até 9 de maio. O sindicato PAME, de inclinação comunista, organizou uma concentração em frente ao Parlamento de Atenas, obedecendo ao espaçamento entre as pessoas.

Em Berlim, capital da Alemanha, cerca de 5 mil policiais foram destacados para vigiar se a proibição para a ocorrência de manifestações com mais de 20 pessoas seria respeitada. A cidade de Zaragoza, no norte da Espanha, assistiu a um desafile planejado pela organização Intersindical de Aragón. Os trabalhadores se manifestaram dentro de seus carros, com máscaras e luvas, e cartazes colados nos veículos. O país registra o segundo maior número de casos de Covid-19 (213.435 infectados), além de 24 mil mortes. Na última quinta-feira, a Justiça espanhola autorizou as concentrações “in extremis”, com a condição de limitar o número de carros a 60, com apenas um participante por veículo.

América Latina

Em Santiago do Chile, 57 manifestantes foram detidos durante a dispersão a um protesto que descumpria a proibição de aglomerações com mais de 50 pessoas. Na Guatemala, cerca de 100 membros de organizações sociais marcharam pelas ruas da capital e exigiram melhores condições de trabalho. Também pediram mais proteção para os profissionais da saúde que atuam no combate ao novo coronavírus. No Uruguai, caravanas de veículos percorreram pontos distintos do país, após a convocação de uma central sindical para marcar a data.



Os ricos ganham com a tragédia
O confinamento não afeta igualmente ricos e pobres: entre 18 de março e 10 de abril, a fortuna dos bilionários americanos aumentou cerca de 10%, ou seja, US$ 282 bilhões, principalmente devido aos ganhos no mercado de ações de empresas de tecnologia, de acordo com um estudo americano. Na Europa, continente que paga o preço humano mais alto, com mais de 140 mil mortes, o Banco Central Europeu (BCE) afirma estar “pronto” para fortalecer seu arsenal de apoio à economia. No Reino Unido, o pico da pandemia foi atingido, de acordo com o primeiro-ministro Boris Johnson, que prometeu revelar um plano de desconfinamento durante a próxima semana.
 
 
 



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