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Vírus: baixa mortalidade na Rússia gera dúvidas sobre estatísticas oficiais

Vários testemunhos publicados na imprensa russa explicam que houve mortes classificadas como "pneumonia", apesar dos testes positivos para o coronavírus

Correio Braziliense
postado em 07/05/2020 09:42
Trabalhadores do cemitério usando equipamento de proteção enterram uma vítima de coronavírus em um cemitério nos arredores de São Petersburgo.A Rússia registra poucas mortes pelo novo coronavírus, 1.625, segundo o último balanço divulgado nesta quinta-feira (7/5), apesar de o número de infecções ter disparado, levantando dúvidas sobre as estatísticas oficiais.

As autoridades garantem que isso se deve às medidas impostas precocemente e aos testes em massa, mas outros consideram que se deve aos métodos de contagem.

Nesta quinta-feira, as autoridades anunciaram um novo recorde diário de infecções, 11.231, que eleva o saldo total para 177.160 casos declarados oficialmente e coloca a Rússia entre os países com o maior número de infecções no mundo.

Mas a mortalidade é notavelmente baixa: apenas 1.625 mortes (88 nas últimas 24 horas).

Isso representa uma taxa de cerca de 0,9%, de longe a menor entre os dez países mais afetados pela pandemia.

A Alemanha, cujo sistema de saúde foi elogiado por sua eficácia no enfrentamento da crise, tem uma taxa de mortalidade de 4,2%.

O Ministério da Saúde e a agência de saúde Rospotrebnadzor justificam esses resultados, enfatizando a rapidez da reação da Rússia à epidemia.

Em um comunicado, Rospotrebnadzor explicou que "a Rússia ocupa o segundo lugar no mundo em número de testes: mais de 4,46 milhões".

Para a agência, isso permitiu "a detecção e o isolamento precoces de pacientes afetados por formas benignas, além de pacientes assintomáticos, o que reduz consideravelmente a circulação do vírus entre a população e certos grupos de risco".

Testes em massa
 
Embora haja dúvidas sobre sua confiabilidade, os testes são acessíveis a todos, através de laboratórios privados. Desde o final de abril, o gigante das novas tecnologias Yandex se propõe a realizá-los gratuitamente em casa.

O fato de realizar mais testes permite contabilizar mais pacientes e reduz automaticamente as estatísticas de mortalidade.

Um representante da Rospotrebnadzor disse à AFP que a baixa taxa de infecção entre pessoas com mais de 65 anos é outro indicador da boa gestão russa.

Os idosos foram confinados a partir da segunda quinzena de março, principalmente em Moscou, maior foco da doença.

"A Rússia fez todo o possível para garantir que a epidemia chegasse o mais tarde possível: fechamos as fronteiras e começamos a monitorar as pessoas infectadas imediatamente", estima Yevgeny Timakov, especialista em doenças infecciosas e consultor do Ministério da Saúde.

Essas semanas permitiram à Rússia se preparar, "isolando pessoas em risco e planejando leitos em hospitais".

Segundo Timakov, a taxa de mortalidade no final da epidemia será de cerca de 3%, "três vezes menos do que na Europa".

Mas a opacidade no sistema de contagem levanta dúvidas. Vários testemunhos publicados na imprensa russa explicam que houve mortes classificadas como "pneumonia", apesar dos testes positivos para o coronavírus.

É o caso de Anastasia Petrova, jornalista de 36 anos que morreu em 31 de março em Perm (Ural). A causa de sua morte foi "pneumonia dupla" até que uma de suas amigas revelou que ela havia testado positivo, forçando as autoridades a revisarem a causa da morte.

A primeira paciente falecida de covid-19 na Rússia, uma mulher de 79 anos, reflete essas deturpações.

Sua morte foi anunciada em 19 de março pela manhã, devido ao coronavírus, mas as autoridades mais tarde alegaram que ela morreu de um "coágulo sanguíneo", e não do vírus.

O vice-diretor do Laboratório Internacional de Pesquisa sobre População e Saúde, Serguei Timonin, lembra que, "se alguém morre de ataque cardíaco, mas foi diagnosticado com COVID-19, a causa oficial da morte será ataque cardíaco".

"Em outras palavras, nem todos os mortos infectados por coronavírus serão incluídos na lista de mortes por coronavírus", disse à AFP.

No final, será preciso aguardar a publicação de estatísticas demográficas para verificar se houve uma sobremortalidade significativa.

"Somente no final de maio, quando chegarem as estatísticas de abril, conheceremos os verdadeiros números de mortalidade na Rússia", diz o especialista.

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