Mundo

Americanos acusados de terrorismo

Ministério Público acusa formalmente Luke Denman e Airan Berry pela tentativa de invasão marítima ao país. Crime prevê penas de 25 a 30 anos de prisão. Regime de Maduro ordena captura de estrategista político do presidente autodeclarado Juan Guaidó

Correio Braziliense
postado em 09/05/2020 04:04
Denman, Berry e outros mercenários presos pelas forças de segurança ao tentarem desembarcar na Venezuela

 

 

 

 

 

O Ministério Público da Venezuela acusou formalmente, ontem, os militares norte-americanos Luke Alexander Denman, 34 anos, e Airan Berry, 41, por crimes de terrorismo, conspiração, tráfico ilícito de armas de guerra e associação criminosa. Além deles, o regime de Nicolás Maduro imputou acusações a outras 29 pessoas suspeitas de participar da Operação Gideão, uma tentativa de invasão marítima ao território venezuelano, na noite de domingo, na região costeira de Macuto (estado de Vargas). O procurador-geral Tarek William Saab também solicitou a ordem de detenção contra Jordan Goudreau, diretor da empresa privada de segurança Silvercorp, com  sede na Flórida; Juan José Rendón, estrategista político do presidente autodeclarado do país, Juan Guaidó; e o deputado opositor Sergio Vergara. De acordo com Saab, o trio estaria implicado no planejamento, no financiamento e na execução desta “ação bélica contra o território, as autoridades e o povo da Venezuela.”

 

Maduro insiste que a Justiça venezuelana julgará os dois cidadãos dos Estados Unidos. Em caso de condenação, a pena para o crime de terrorismo prevê penas de 25 a 30 anos de prisão. O ministro da Comunicação e Informação da Venezuela, Jorge Rodríguez, apresentou à imprensa um suposto áudio em que Guaidó conversaria, em inglês, com Goudreau. “Já consultamos um calígrafo, e esta é a assinatura de Juan Guaidó. Goudreau não começaria nenhum trabalho se não tivesse a assinatura”, afirmou, ao citar um contrato que teria sido firmado entre a Silvercorp e Guaidó para o pagamento de mercenários. Na quinta-feira, Rendón confessou à emissora CNN em espanhol que assinou o documento com a Silvercorp e adiantou um pagamento de US$ 50 mil.

 

Assassinatos

 

Rodríguez explicou que o documento ordenava o assassinato de Maduro; do presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Diosdado Cabello; do ministro da Defesa, Vladimir Padrino López; da vice-presidente, Delcy Rodríguez e de outros funcionários da Força Armada Nacional Bolivariana (Fanb). As execuções teriam o preço estimado em US$ 212,9 milhões. A realização da primeira fase do contrato custaria US$ 50 milhões. “O que as autoridades de Washington estão fazendo é ver como livrar Juan Guaidó, que está profundamente envolvido por causa do contrato que ele assinou”, disse Rodríguez.

 

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, adotou o sarcasmo ao negar qualquer envolvimento com a Operação Gideão. “Se eu quisesse ir à Venezuela, não faria isso em segredo. Entraria e nada fariam a respeito. Dariam a volta”, declarou à emissora de tevê Fox News. “Não enviaria um grupo pequeno. Não, não, não. Seria um exército (…) e isso seria chamado de invasão.” Ontem, Guaidó anunciou que enviaria uma mensagem à Venezuela sobre as “mentiras da ditadura” (de Maduro).

 

Por volta das 22h, Guaidó divulgou um vídeo no qual denunciou uma “encenação” por parte da “ditadura”. “O pior de tudo é que não se conformaram em plantar armas ou provas falsas. Chegaram ao extremo de matar venezuelanos e usar seus corpos para montar uma história. (...) Queriam assassinar e aprisionar, covardemente, venezuelanos que se encontravam no exílio”, acusou o opositor, que enviou um recado a Maduro. “Você é um ditador e, lamentavelmente, aqui não existe Estado de direito. (...) Assuma sua responsabilidade. Ninguém crê em suas mentiras.”

 

Deputado da Assembleia Nacional (oposição) pelo estado de Lara, integrante do partido Acción Democrática e ex-preso político, Edgar Zambrano disse ao Correio que uma eventual prisão de Guaidó seria uma “ameaça argumentativa para o discurso de confronto”. “Uma ação desse tipo aceleraria, brutalmente, o desencadeamento de episódios contrários à paz social”, comentou. “É um elemento no xadrez político nacional em desenvolvimento. O fato veio à tona quando Guaidó apareceu como ator na linha de frente no cenário do concerto político venezuelano”, acrescentou, por meio do WhatsApp.

 

De acordo com Dimitris Pantoulas, consultor político da Faculdade de Negócios IESA, em Caracas, Maduro deseja manter em voga o assunto da Operação Gideão. “Para a força política que Maduro representa, a fracassada operação demonstra que havia alguma veracidade em seus argumentos de ingerência estrangeira em assuntos internos do país e que a oposição estava envolvida em planos violentos”, afirmou. Ele acredita que, com a ordem de captura de Goudreau, de Rendón e de Vergara, Maduro quer colocar os países aliados de Guaidó em situação complicada. “Essas nações têm de justificar porque dão abrigo a pessoas envolvidas em operações desse tipo. Ao mesmo tempo, Maduro quer causar divisões nas fileiras da oposição. Finalmente, o ponto central da estratégia de Maduro é manter a agenda pública no tema da Operação Gideão e não nos enormes problemas socioeconômicos enfrentados pela Venezuela.” 

 

 

» Eu acho... 

 

“A imagem de Juan Guaidó está debilitada depois de se tornar público que ele tinha conhecimento sobre a empresa Silvercorp e sobre seus planos. Por dias, Guaidó negava ou evitava responder claramente sobre o assunto, enquanto informações eram divulgadas em meios independentes. Agora, Guaidó terá de enfrentar até figuras da oposição, que pedem explicações sobre esses planos.”

Dimitris Pantoulas, analista e consultor político da Faculdade de Negócios IESA, em Caracas 

 

 

 

» Tuitada 

 

“Solicitamos ordens de detenção contra Juan José Rendón e Sergio Vergara, assim como contra Jordan Goudreau, por sua implicação no planejamento, financiamento e execução desta ação bélica contra o território, as autoridades e o povo 

da Venezuela.”

Tarek William Saab, procurador-geral da Venezuela 

 

 

 

Duas perguntas para 

Edgar Zambrano, deputado da Assembleia Nacional (oposição) pelo estado de Lara, membro do partido Acción Democrática e ex-preso político 

 

Como o senhor vê a ordem de captura imputada ao empresário Jordan Goudreau, ao estrategista político Juan José Rendón e ao seu colega deputado Sergio Vergara?

Ante um fato público e notório, o governo de Maduro oferece uma resposta que o mantém no roteiro da confrontação. Episódios abertamente divulgados pela mídia com bastante antecedência, o que indica, sem dúvida, que estamos ante um fato que provoca mais atrito no choque entre oposição e governo. A estratégia do Executivo nacional se enfoca em atores assinalados publicamente, inclusive o capítulo em que Goudreau reconhece a participação nesses episódios. Isso facilita a ação governamental.

 

Maduro aproveitou esse fato para culpar Juan Guaidó e desacreditar a oposição?

A principal dicotomia que enfrentamos, o fracasso do modelo político frente à proposta de um governo de transição, localiza-se nas estratégias em pleno desenvolvimento. Por isso, em todas as oportunidades que puder, Maduro usa o discurso para castigar a imagem do presidente Guaidó. Isso forma parte de um esquema exausto, muito mediático e pouco eficaz diante do legado de problemas herdados em 20 anos de fracassos. (RC) 

 

 

 

 

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