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Primeiros resultados positivos em humanos

Aplicada em duas doses, vacina provoca reação imunológica à presença do novo coronavírus em oito voluntários. Farmacêutica americana planeja finalizar os próximos testes, voltados para a eficácia e a segurança da abordagem, até o fim do ano

Correio Braziliense
postado em 19/05/2020 04:06
Doze grupos de pesquisa estão na fase de testes de vacina em humanos. Alguns querem produzir doses em larga escala antes dos resultados finais

Uma vacina para a covid-19 pode estar mais próxima de se tornar realidade. A empresa farmacêutica Moderna finalizou os primeiros testes de uma fórmula imunizadora em humanos e divulgou os resultados iniciais da fase clínica, considerados “positivos” pela equipe. Segundo a companhia norte-americana, após receber duas doses, oito voluntários apresentaram níveis de anticorpos semelhantes aos de pessoas que foram curadas da doença. Os criadores da vacina acreditam ser possível concluir toda a pesquisa e ter uma imunização disponível ainda neste ano.

Os pesquisadores ressaltam que o teste sinaliza que a vacina, chamada mRNA-1273, desencadeia uma resposta imune à presença do novo coronavírus e “tem potencial para prevenir a covid-19”. “A fase provisória 1, embora em estágio inicial, demonstrou que a vacinação com o mRNA-1273 produz uma resposta imune da mesma magnitude que a provocada pela infecção natural”, explica Tal Zaks, diretor médico da companhia, em comunicado.

Os investigadores também destacaram que não foram observados efeitos colaterais fortes, uma das maiores preocupações em testes do tipo. No ensaio, os voluntários foram divididos em três grupos, que receberam doses diferentes da vacina (alta, média e baixa), com reforço após 28 dias. Como a reação imune ocorreu em todos os participantes, os cientistas decidiram eliminar as mais fortes.

Prevista para junho, a segunda etapa dos ensaios clínicos será voltada para a eficácia da fórmula e terá 600 voluntários. A fase 3, quando serão avaliadas eficácia e segurança da fórmula, deve ocorrer em julho, enquanto a agência que regula medicamentos nos Estados Unidos, o FDA, finaliza o protocolo necessário para as análises. “Se esses testes derem certo, uma vacina poderá ficar disponível para uso generalizado até o fim deste ano ou no início de 2021”, afirma Tal Zaks.

Cautela


Stephen Evans, professor de Farmacoepidemiologia da Escola de Medicina Tropical e Higiene de Londres, recebeu a notícia com cautela. O especialista ressaltou que os testes foram feitos em pessoas relativamente jovens e que o vírus é mais perigoso para populações acima de 70 anos de idade. “Também é difícil ter certeza dos resultados a partir de um comunicado de imprensa”, frisa, em entrevista à agência France-Presse de notícias (AFP). A pesquisa não foi divulgada em uma revista científica, condição que depende da revisão do estudo por especialistas na área, entre outros critérios.

O especialista britânico acrescentou que apenas os resultados clínicos da terceira fase poderão confirmar a eficácia da abordagem. Maria Elisa Bertocco Andrade, coordenadora do Departamento Científico de Provas Diagnósticas da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), concorda. “Os pesquisadores explicam que pretendem acompanhar todos os participantes do estudo por um ano. Só com esse tempo poderemos ter certeza de que a proteção vista é realmente duradoura, não temos outra saída a não ser esperar”, justifica.

A imunologista brasileira também pondera que é importante observar se a vacina conseguirá gerar os mesmos resultados em pessoas mais velhas. “Esse primeiro grupo foi formado por indivíduos de 18 a 55 anos. Os cientistas destacam que pretendem vacinar pessoas acima de 55 anos e até um grupo acima de 71 anos. Esse é um passo essencial, já que a doença atinge de forma severa principalmente os idosos”, diz.

Uso de RNA

O procedimento usado para fabricar a vacina é conhecido como RNA mensageiro, que, até o  momento, não resultou na produção de uma vacina liberada para uso em humanos, mas é testado por outros grupos de estudo. Nessa estratégia, utiliza-se uma forma sintética da molécula RNA mensageiro, que é a responsável por transmitir informações contidas no DNA para os ribossomos. Isso possibilita a produção de proteínas. No caso da covid-19, o RNA sintético estimula o corpo a produzir proteínas semelhantes à do vírus para que o organismo da pessoa infectada saiba identifique a ameaça e comece a combatê-la.

No momento, há 12 ensaios clínicos de vacinas para a Covid em andamento, sendo que metade é da China, segundo levantamento da Escola de Medicina Tropical e Higiene de Londres. Nos EUA, o governo apoia o projeto da Moderna,a pesquisa da farmacêutica Johnson & Johnson e a do laboratório francês Sanofi, que tem centros de estudos no país.

Além de buscar uma fórmula que funcione, cientistas e empresas correm contra o tempo para ter condições de produzi-la em grande escala. Com essa preocupação, os laboratórios envolvidos na empreitada anunciaram que começarão a produzir doses antes do fim dos testes em humanos. A Moderna anunciou uma parceria com a gigante Lonza para aumentar sua capacidade de produção e poder fabricar até 1 bilhão de doses em um ano.



  • Ações em alta

    Os impactos financeiros da pesquisa já começam a ser contabilizados, como tem ocorrido com outras companhias que buscam uma forma eficaz de conter a pandemia. Ontem, após anunciar os resultados dos primeiros testes, a Moderna viu suas ações dispararem até 30% em Nova York. Até sexta-feira, a companhia americana acumulava alta de mais de 200% no ano. O estudo clínico é realizado pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, onde o governo investiu US$ 500 milhões para se chegar a uma fórmula protetiva.

  • Descobertas enzimas que ajudam o vírus

    Pesquisadores italianos descobriram duas enzimas humanas que “editam” o RNA do Sars-CoV-2 quando ele entra no corpo de um paciente, ajudando o coronavírus a se replicar no organismo humano. Os cientistas da Universidade de Florença identificaram as moléculas ao comparar fluidos extraídos do pulmão de voluntários saudáveis e voluntários que tiveram covid-19. A equipe detectou alterações de composição nas duas enzimas, que podem ser atribuídas à edição do RNA. A descoberta fornece um primeiro passo para entender como a edição de RNA desse micro-organismo afeta a sua replicação, o que pode ajudar no desenvolvimento de tratamentos para a doença.

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