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Autonomia por um fio

Congresso Nacional do Povo, órgão equivalente ao Parlamento da China, aprova polêmica Lei de Segurança Nacional para a antiga colônia britânica. Ativistas temem aumento de repressão e riscos aos direitos humanos

Correio Braziliense
postado em 29/05/2020 04:05
O presidente chinês, Xi Jinping, vota durante a sessão histórica, na Praça da Paz Celestial

Por 2.878 votos a favor e apenas um contrário, os deputados do Congresso Nacional do Povo, em Pequim, aprovaram a polêmica Lei de Segurança Nacional em Hong Kong. Para ativistas, o texto representa o fim da autonomia da antiga colônia britânica e uma carta branca para a China intensificar a repressão contra o movimento pró-democracia no território. O presidente norte-americano, Donald Trump, deverá se pronunciar sobre o tema em uma entrevista coletiva marcada para hoje.

No entanto, em declaração conjunta na Organização das Nações Unidas, os embaixadores dos EUA, do Reino Unido, da Austrália e do Canadá acusaram o governo de Xi Jinping de violar obrigações internacionais. “A lei recém-aprovada limitaria as liberdades da população de Hong Kong e minaria drasticamente a autonomia e o sistema que a tornavam tão próspera”, advertiram os signatários, ao expressarem sua “profunda preocupação” com divisões na sociedade de Hong Kong.

“É o fim de Hong Kong”, lamentou à agência France-Presse Claudia Mo, deputada pró-democracia no Conselho Legislativo local.  “A nova lei imposta a Hong Kong simboliza o fim da autonomia de Hong Kong e do princípio ‘um país, dois sistemas’. O futuro de Hong Kong parece-me extremamente sombrio”, concordou Wilson Leung, advogado e ativista pró-demcoracia em Hong Kong, em entrevista por telefone ao Correio. Ele teme que, a curto prazo, a ex-colônia britânica tornar-se-á mais uma cidade chinesa, “despojada de todas as coisas bonitas e únicas que fazem do território um centro financeiro internacional, onde as pessoas podem fazer negócios com a China, mas com a proteção dos padrões internacionais e de uma Justiça comum”. “Isso tudo está ameaçado e, possivelmente, destruído”, acrescentou.

Para Leung, conceitos muito draconianos utilizados pela China na repressão a dissidentes e no controle da retórica serão importados para Hong Kong e aplicados. “Tais medidas poderão ser implementadas pelos agentes de segurança chineses, por meio de uma subversão do poder estatal de Pequim”, disse.

Sobrevivente do massacre da Praça da Paz Celestial, em 4 de junho de 1989, e morador de Hong Kong, o assistente social Chan Ching Wa Jonathan afirmou ao Correio que ele e outros ativistas lutarão “até o fim”. “Os detalhes da Lei de Segurança Nacional de Hong Kong serão discutidos nas próximas reuniões do Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo. A resistência dos cidadãos de Hong Kong unir-se-á à pressão internacional, principalmente por parte dos EUA, para vermos se podemos reduzir um pouco a letalidade da lei.”



Imposição

Sob condição de anomimato, um escritor e ativista de Hong Kong comparou a nova lei a “uma imposição ditatorial sobre um povo colonizado”. “De acordo com o artigo 23 da Lei Básica de Hong Kong, as mesmas leis redigidas pelo Partido Comunista Chinês (PCC) terão de ser feitas em Hong Kong, após processo legislativo e consulta popular. No entanto, Hong Kong não é uma democracia. O seu Conselho Legislativo é equipado para assegurar o controle pró-comunista”, contou à reportagem. “O propósito da legislação resume-se em reforçar o controle do PCC sobre Hong Kong e intimidar as pessoas.”

Carrie Lam, chefe do Executivo de Hong Kong aliada a Pequim, comemorou o resultado da votação no Congresso Nacional do Povo. Ela prometeu “reforçar a aplicação da lei e a educação em defesa da segurança nacional”.


  • Vozes do território


    Wilson Leung,  37 anos, advogado e ativista pró-democracia em Hong Kong

    “Haverá um impacto extremamente severo sobre os direitos humanos em Hong Kong. Essa lei será utilizada para restringir o movimento pró-democracia e para limitar críticas aos governos de Pequim e de Hong Kong. Temos escutado autoridades afirmarem que a vigília em memória das vítimas do massacre da Praça da Paz Celestial poderá ser proibida, e jornais pró-democracia de Hong Kong serão perseguidos.”



    Chan Ching Wa Jonathan, 59 anos, assistente social e sobrevivente do massacre da Praça da Paz Celestial

    “Não creio que a lei aprovada pela China represente o fim de Hong Kong. Isso porque Hong Kong não é apenas um lugar, mas uma ideia e um ideal que nos unem em uma luta contra essa hegemonia tirânica. Por enquanto, o clima por aqui é de calma, antes da tempestade.”

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