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Reforma policial à mesa

Bancada de congressistas afro-americanos democratas apresenta projeto de lei para coibir excessos cometidos pelas forças de segurança e responsabilizar agentes. Presidente Donald Trump reage com indignação e descarta corte de financiamento

Correio Braziliense
postado em 09/06/2020 04:06
Bancada de congressistas afro-americanos democratas apresenta projeto de lei para coibir excessos cometidos pelas forças de segurança e responsabilizar agentes. Presidente Donald Trump reage com indignação e descarta corte de financiamento
  • Homenagem a George Floyd no “Salão da Emancipação” do Capitólio
    A homenagem durou 8 minutos e 46 segundos, tempo que o cidadão negro George Floyd levou para morrer, asfixiado por um policial branco. Cerca de 20 legisladores do Partido Democrata se ajoelharam, ontem, em  memória a Floyd e a outros afro-americanos “que perderam a vida injustamente”. Todos os congressistas usavam, no pescoço, kente — um tecido africano típico no norte de Gana e antes restrito à nobreza. A presidente democrata do Congresso, Nancy Pelosi (E), o líder da minoria de seu partido no Senado, Chuck Schumer, assim como cerca de 20 parlamentares opositores, incluindo vários representantes negros, se reuniram no “Salão da Emancipação”, assim nomeado em honra aos escravos que trabalharam na construção da sede legislativa em Washington, o Capitólio, no século 18. “Estamos aqui para honrar George Floyd. Vocês verão quanto tempo ele levou com um joelho sobre o pescoço”, afirmou Pelosi, antes do tributo em silêncio. “É doloroso ter uma ideia de como esse homem e tantos afro-americanos sofreram por tanto tempo”, desabafou Schumer.

Após deflagrar os maiores protestos antirracismo dos últimos 52 anos nos Estados Unidos, o assassinato do cidadão negro George Floyd, 46 anos, abriu os olhos do establishment de Washington para os excessos e os crimes cometidos pela polícia norte-americana. O Caucus Negro do Congresso, bancada que reúne 55 legisladores afro-americanos da Câmara dos Representantes e do Senado, apresentou um inédito projeto de lei que propõe ampla reforma da polícia dos Estados Unidos. Entre outras medidas, o texto proíbe policiais federais, estaduais e municipais de traçar perfis de suspeitos com base na raça ou na religião; bane o estrangulamento; exige o uso de câmera corporal e de painel (da viatura); cria um Registro Nacional de Conduta Policial, para impedir que oficiais problemáticos se mudem para outras jurisdições, sem punição. Floyd foi morto quando o policial branco Derek Chauvin, no último dia 25, pressionou-lhe o pescoço com o joelho, em Minneapolis (Minnesota).

“Estamos testemunhando a ascensão de um movimento no país, com milhares de pessoas se unindo para exigir uma mudança que ponha fim à brutalidade policial, responsabilize agentes e clame pela transparência”, declarou a deputada congressista Karen Bass, presidente do Caucus Negro do Congresso. “Hoje, divulgamos a Lei de Justiça no Policiamento, a qual criará uma visão transformadora ousada no trabalho da polícia. Nunca mais o mundo  estará sujeito a testemunhar o que vimos nas ruas de Minnesota, com George Floyd”, acrescentou.

Também membro da bancada, o deputado Jerrold Nadler — presidente do Comitê do Judiciário da Câmara dos Representantes — explicou que a violência policial é “um problema sistêmico que exige uma solução abrangente”. “Essa legislação ousada e transformadora finalmente proibirá os estrangulamentos em âmbito federal e incentivará os estados a fazer o mesmo; ajudará a acabar com o perfil racial; tirará armas de guerra das nossas ruas; culpará a polícia; aumentará a transparência e encorajará o maior uso de câmeras corporais”, comentou. De acordo com ele, as agências policiais serão obrigadas a cumprir com “os mais altos padrões de treinamento e contratação” e seguir estratégias de redução de tensões para lidar com o racismo sistêmico e mudar a cultura da aplicação da lei.

Para Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes, “o martírio de Floyd deu à experiência americana um momento de angústia nacional”. “Hoje, esse movimento está sendo transformado em um movimento de ação nacional”, afirmou, ao garantir que os democratas do Congresso estão ao lado daqueles que lutam por justiça e ação. Pelosi citou os nomes de outros afro-americanos mortos nas mãos da polícia e  também classificou-os de “mártires”.

O presidente Donald Trump reagiu com fúria à proposta de reforma das forças de segurança apresentada pelos democratas. Ao celebrar “os baixos índices de crimes” da história documentada dos EUA, ele disparou: “Agora, os democratas da esquerda radical querem retirar e abandonar nossa polícia”. “Desculpem-me, eu quero lei e ordem!”, escreveu no Twitter. Em outro momento, ao receber chefes de polícia e oficiais na Casa Branca, o magnata republicano assegurou que não iria cortar o financiamento, nem desmantelar a polícia. “Vocês podem ter algumas cidades que queiram tentar isso, mas será uma situação muito triste”, admitiu Trump, ao afirmar que, no geral, a polícia faz um “trabalho incrível”. Trump disse acreditar que “99% de todos os policiais são pessoas ótimas”. “Nossa polícia tem nos deixado viver em paz e queremos garantir que não haja atores ruins lá.”

George Floyd


Enquanto Trump recepcionava policiais em Washington, o candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden, foi até Houston e se reuniu por mais de uma hora com familiares de George Floyd, durante o primeiro dia de funeral em Houston. De acordo com o advogado Benjamin Crump, o ex-vice-presidente “ouviu, escutou a dor e compartilhou de sua angústia”. “Sua compaixão significou o mundo para esta família enlutada”, escreveu Crump no Twitter. “Escutar o outro é o que começará a curar a América.” Entre os participantes do encontro, estavam o reverendo Al Sharpton, o deputado democrata Cedric Richmond e Roger Floyd, tio de George. Biden deixou-se fotografar após a reunião, utilizando máscara. Até o fechamento desta edição, Trump não tinha feito menção de visitar Minneapolis ou de conversar com manifestantes e familiares de Floyd.


  • Fiança milionária para Derek Chauvin
    Derek Chauvin (foto), o policial branco de Minneapolis acusado de matar por asfixia o afro-americano George Floyd, compareceu pela primeira vez ao tribunal em uma audiência de videoconferência. Ele apareceu vestindo roupa de prisioneiro laranja em uma tela instalada em um tribunal de Minneapolis. A juíza Jeannice Reding, do condado de Hennepin, fixou a fiança em US$ 1,25 milhão (cerca de R$ 6,1 milhões) e agendou o próximo comparecimento de Chauvin, 44 anos, para daqui a 20 dias.  Se o policial cumprir uma série de exigências, como renunciar ao uso de armas e prometer não entrar em contato com membros da família de Floyd, a fiança será reduzida para US$ 1 milhão. Eric Nelson, advogado de Chauvin, não se opôs à quantia, que ele provavelmente não poderá pagar. O procurador do Estado, Matthew Frank, solicitou uma fiança elevada, considerando que Chauvin apresentava risco de fuga devido à seriedade das acusações e à forte reação do público ao caso. No vídeo da abordagem policial a Floyd, Chauvin aparece com o joelho sobre o pescoço da vítima.


  • TUITADA

    “Neste ano, temos visto os mais baixos índices de crimes da história registrada de nosso país. Agora, os democratas da esquerda radical querem retirar dinheiro e abandonar nossa polícia. Desculpem-me, eu quero lei e ordem!”

    Donald Trump, presidente dos Estados Unidos

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