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Após vozes dissonantes, Trump acena união com militares norte-americanos

Em discurso na Academia Militar de West Point, presidente Donald Trump tenta reaproximação com o Pentágono, lembra o papel do Exército no combate ''à terrível injustiça da segregação'', evita polêmicas e anuncia planos de pôr fim a ''guerras intermináveis''

Correio Braziliense
postado em 14/06/2020 07:00
O momento não poderia ser mais simbólico: véspera do 245º aniversário do Exército dos Estados Unidos, em meio a um choque de posições entre a Casa Branca e o Pentágono e na conjuntura dos maiores protestos antirracismo dos últimos 52 anos —  deflagrados pela morte do afro-americano George Floyd, assassinado pelo policial branco Derek Chauvin, em Minneapolis. Durante a formatura de 1.107 cadetes da prestigiada Academia Militar de West Point, no estado de Nova York, o presidente Donald Trump fez um ensaio de reaproximação com os militares. Em vez de trechos considerados polêmicos ou controversos, priorizou no discurso um tom solene marcado por elogios às Forças Armadas. “Foi sob a liderança de graduados de West Point, como o lendário general Matthew Ridgway, que o Exército esteve na linha de frente para acabar com a terrível injustiça da segregação’”, declarou.

De acordo com Trump, os recém-graduados de West Point “exemplificam o poder do propósito nacional compartilhado de transcender todas as diferenças e alcançar a unidade nacional”. Depois de ser alvo de críticas de três oficiais do Pentágono, o magnata republicano aproveitou o pronunciamento para acenar com a retirada militar das zonas de conflito e para esboçar os planos para as Forças Armadas. “Estamos restaurando os princípios fundamentais de que o trabalho do soldado americano não é o de reconstruir nações estrangeiras, mas defender — e fortemente — a nossa nação de inimigos externos. Estamos pondo fim às guerras intermináveis”, afirmou. “Em seu lugar, há um foco renovado e centrado na defesa dos interesses vitais da América. Não é dever das tropas americanas resolver conflitos antigos em terras distantes, das quais muitas pessoas nunca ouviram falar. Não somos policiais do mundo.”

Sem citar a tensão com autoridades militares, o comandante-em-chefe dos EUA lembrou que “quando os tempos são turbulentos, quando o caminho é difícil, o que mais importante é o que é permanente, atemporal, duradouro e eterno”. Dentro do Pentágono, circulam críticas de que Trump busca politizar o uso do Exército. No último dia 1º,  o republicano anunciou o envio de “milhares de soldados fortemente armados” para controlar os protestos contra o racismo, ao declarar que o país foi “tomado por anarquistas”.

Após policiais reprimirem manifestantes que se concentravam na Praça Lafayette, em frente à Casa Branca, Trump percorreu o local e deixou-se fotografar segurando a Bíblia, acompanhado de outra autoridades, entre elas o chefe do Estado-Maior, general Mark Milley. Também foi alvo de ataques por parte do ex-secretário de Defesa James Mattis. O atual ocupante da pasta, Mark Esper, recusou-se a mobilizar tropas.

Carta
Uma carta firmada por mais de 700 ex-alunos da West Point condena a ameaça de Trump de “usar o Exército como arma contra cidadãos americanos” que protestam contra o racismo. Um dos signatários do documento, o capitão Edmundo M. Colchado Jr., 66 anos, disse ao Correio que, a priori, opõe-se ao uso de força militar contra manifestantes. “A menos que os protestos caiam no caos e coloquem vidas e propriedades em xeque”, explicou o ex-militar, que formou-se em 1976 e serviu na Alemanha Ocidental antes da unificação. “Há graduados em West Point que servem ao governo Trump nos mais altos níveis e que não cumprem com os ideais ensinados na academia. A intenção da carta é deixar que a turma de graduados em 2020 saiba que esses indivíduos não devem ser imitados”, acrescentou.

Um dos alvos da carta é o próprio Esper, que também acompanhou o presidente na sessão de fotos do último dia 1º. “Quando colegas graduados fracassam em respeitar os freios e contrapesos do governo, promovem o poder individual sobre o país, ou valorizam a lealdade a indivíduos acima dos ideais expressos na Constituição, cometem uma farsa no juramento de seu cargo”, afirma o texto.

Vozes dissonantes

Quem são as autoridades do Pentágono e oficiais dos EUA que discordaram de Donald Trump

Mark Esper
O secretário de Defesa, também graduado em West Point, discordou da ideia do presidente de invocar a Lei de Insurreição para conter as manifestações antirracistas. “A opção de recorrer a soldados ativos deveria ser empregada somente como último recurso e em situações mais urgentes e dramáticas”, afirmou.

Mark Milley
O general e chefe do Estado-Maior lamentou ter aparecido em uniforme ao lado de Trump em uma sessão de fotografias na frente de uma igreja de Washington, depois de uma violenta dispersão de manifestantes perto da Casa Branca. “Não deveria ter estado lá. Deu a impressão de que o exército estava interferindo na política interna”, declarou.

James Mattis
Ex-secretário de Defesa de Trump, acusou o presidente de tentar “dividir” o país, depois da morte do afro-americano George Floyd, morto por um policial branco. “Em toda minha vida, Donald Trump foi o primeiro presidente que não tenta unir os americanos, que não pretende sequer tentar”, declarou à revista The Atlantic. “Ao contrário, ele está tentando nos dividir.”

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