Correio Braziliense
postado em 28/06/2020 07:15
O impacto de uma pandemia que já infectou 10 milhões de pessoas e exigiu respostas rápidas de governos ao redor do mundo permitiu o avanço de agendas autoritárias de lÃderes que se aproveitaram da crise para ampliar o próprio poder. Mas, segundo especialistas, o vÃrus também expôs as fraquezas de vários regimes populistas.
De acordo com especialistas, a ausência de uma resposta padrão torna mais difÃcil prever como os populistas sairão da crise. Alguns, como Donald Trump, nos EUA, Andrés Manuel López Obrador, no México, e Jair Bolsonaro, no Brasil, preferem o negacionismo. Outros, como Viktor Orbán, premiê da Hungria, e Narendra Modi, da Ãndia, impuseram e rÃgidas medidas de restrição, estratégicas também para dificultar protestos, desmobilizar a oposição e demonstrar força.
Professora de polÃtica comparada da Universidade de Reading, no Reino Unido, Daphne Halikiopoulou diz ser "possÃvel e provável" que uma mesma crise fortaleça alguns lÃderes populistas e enfraqueça outros. "Em circunstâncias que envolvem instituições frágeis, os lÃderes têm maiores chances de se aproveitarem disso, como historicamente tem acontecido."
A capacidade de partidos e lÃderes de capitalizar a crise é um fator determinante. "O fechamento das fronteiras, o fortalecimento do nacionalismo e a crise econômica, por exemplo, são oportunidades para a extrema direita", diz.
Nos EUA, Trump recusou-se a ouvir especialistas por dois meses. Bolsonaro demitiu dois ministros da Saúde e foi à TV repetidas vezes pedir o fim da quarentena. No Reino Unido, o primeiro-ministro, Boris Johnson, tentou evitar o isolamento, buscando inicialmente a estratégia de "imunidade de rebanho" - rapidamente abandonada pelo caminho. No México, Obrador publicou mensagens dizendo que o vÃrus não era grave.
As declarações encontraram eco em parcelas da população. "A desconfiança na elite polÃtica tradicional se espalhou para outros tipos de autoridades, incluindo especialistas", diz Adina Trunk, do Instituto pela Democracia e Assistência Eleitoral (Idea), da Suécia. "Campanhas de desinformação, câmaras de eco e notÃcias manipuladas aumentaram ainda mais o ceticismo, criando versões confusas, divergentes e muitas vezes opostas da verdade, dificultando a distinção entre especialistas reais e autoproclamados."
Esse embate extrapolou fronteiras e atingiu a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a União Europeia, que foram contestadas por suas ações durante a pandemia. "Os populistas não gostam de ser constrangidos por instituições internacionais e não acreditam no multilateralismo", lembra Trunk.
Coautora de um artigo intitulado Traga de volta os especialistas - como a crise do coronavÃrus pode ajudar a conter o populismo, Trunk acredita que o embate será determinante para o futuro do populismo. O texto, também assinado por Simone Bunse, diz que até lÃderes que resistiam aos fatos recorreram aos experts, citando exemplos de Johnson e Trump, que adotaram medidas mais rÃgidas após a publicação de estudos do Imperial College de Londres.
Para o professor da Universidade da Georgia e autor do livro The Far Right Today, Cas Mudde, a prova de fogo para os populistas está no campo da imprensa. Ele cita o exemplo da Hungria, onde Orbán controla a mÃdia estatal e privada. "Em paÃses assim, apenas as mÃdias sociais podem expressar crÃticas, mas elas atingem apenas uma pequena parte da população."
Para Trunk, dependendo de como a crise for gerenciada, lÃderes eleitos podem não obter um novo mandato. Outros devem tentar culpar a China, a OMS e paÃses vizinhos - para manter o poder. "O timing das eleições será importante: quanto mais recente e aguda a crise for sentida durante a eleição, mais difÃcil será se livrar da culpa." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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