postado em 29/05/2019 04:28
Talvez muitos tenham recorrido ao ditado ;Bandido bom é bandido morto; ao tomarem conhecimento das mortes de 55 presos em quatro presídios de Manaus no último fim de semana. Talvez nem tenham se sensibilizado, alguns até comemoraram. Eles se esquecem que é responsabilidade do Estado garantir a integridade física do cidadão, seja ele apenado ou não.
As vítimas das execuções no Amazonas cumpriam suas sentenças determinadas pela Justiça. É terrivelmente absurda a imposição da pena de morte nos presídios brasileiros, que mais se parecem com depósitos de gente. É deprimente perceber que facções do crime organizado se valem da falência moral do governo para dominar as penitenciárias e sufocar o aparato da máquina pública.
A matança em Manaus é reflexo de uma nação que agoniza enquanto supervaloriza a violência e a pretensa defesa pessoal. O decreto para o porte de armas é uma decisão irresponsável, capaz de aumentar o número de homicídios Brasil afora, além de beneficiar milícias e criminosos. Armas são feitas para matar. Ponto. Nas mãos do ;cidadão de bem; podem se tornar objetos de cobiça de marginais. Quem já ficou com um revólver apontado para a cabeça tem a exata noção disso.
Em 8 de abril de 1995, fui vítima de sequestro-relâmpago em Goiânia. Dois assaltantes. O cano da arma, frio e com anúncio de morte, apertando minha nuca. Uma hora de terror. Em uma estrada vicinal, mandaram que eu descesse do carro e ficasse de cueca. Afirmaram que eu morreria ali. Foram 15 minutos em uma discussão entre os dois sobre se me matariam ou não. Quase um julgamento sumário. Arma na testa e outra na nuca. Tudo o que eu fazia era rezar, mas a mente parecia ter entrado em blecaute. Se eu estivesse armado aquele dia, hoje não seria pai, não teria me casado com a mulher mais linda desse mundo e, com a mais absoluta certeza, estaria sob uma lápide no cemitério. Engana-se quem pensa que a arma concede à vítima o privilégio da defesa. Quase sempre é o oposto: sentença de morte.
É um absurdo um país de 13 milhões de desempregados se curvar a um decreto autorizando o porte de armas a pelo menos 20 milhões de pessoas. É um absurdo uma nação ser incapaz de assegurar o cumprimento da pena de condenados sem que a vida deles seja colocada em risco, independentemente do caráter hediondo do crime cometido. O governo não pode delegar a tarefa de segurança pública ao cidadão, quando legaliza as armas. Também não pode tratar as penitenciárias como lixões humanos, quando se tornam escolas do crime.