postado em 11/06/2019 04:15
;Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade.; A frase, de William Randolph Hearst (1863-1951), um empresário norte-americano que criou uma enorme rede de jornais na Califórnia, sintetiza bem a essência do jornalismo combativo. Uma nação privada de uma imprensa livre está fadada à autocracia e à erosão do Estado de direito. São papéis do jornalismo informar, denunciar, expor as mazelas da sociedade, exigir moralização e ética nas três esferas do poder, fiscalizar o governo. Um dos pilares da democracia, a imprensa livre somente se mantém sólida quando não sofre interferências dos atores-alvo de suas publicações.
Uma imprensa livre e combativa tem sido crucial para trazer à tona escândalos que colocam em xeque o próprio establishment na política. Foi assim no caso Watergate, que derrubou o então presidente norte-americano, Richard Nixon, depois que os jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein, ambos do The Washington Post, obtiveram de um informante dados sobre o grampeamento do escritório do Comitê Nacional Democrata, em 1972. Os repórteres do Post souberam que Nixon tivera conhecimento da ação ilegal. Pressionado, o líder republicano não viu escolha e renunciou.
O jornal Página 12, de Buenos Aires, adotou o termo ;Brasilgate; para se referir aos supostos diálogos entre Sérgio Moro, então juiz da Operação Lava-Jato e atual ministro da Justiça, e o procurador federal Deltan Dallagnol. As trocas de mensagens, vazadas pelo site The Intercept Brasil, do jornalista Glenn Greenwald, sugerem parcialidade nas investigações da Operação Lava-Jato e um provável desvio ético de Moro. Greenwald garante ter um ;arquivo colossal;, composto de áudios, vídeos, milhares de páginas de documentos e conversas por meio do Telegram. A maneira como esse material foi obtido provavelmente não vem ao caso.
O ponto principal aqui é que ele tem forte interesse popular; revela-se denúncia de possíveis desmandos e de vícios da Justiça; e, portanto, possui valor jornalístico. Além disso, Greenwald se escora na própria reputação. Em 2014, o então jornalista do The Guardian ganhou o Prêmio Pulitzer por uma série de reportagens nas quais revelava a extensa atividade de espionagem global exercida pela Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA, com base em vazamentos do ex-analista de sistemas Edward Snowden. Greenwald não é um jornalista aventureiro ou um iniciante. Conhece os limites da ética e compreende o conceito de Hearst como poucos. Sabe que, provavelmente, tem em mãos um material de importância histórica.