Opinião

Tristeza que fica remoendo

postado em 15/06/2019 04:22
Eu pretendia usar este espaço hoje para falar da Marcha Nacional da Cidadania pela Vida contra o Aborto, que ocorreu na terça-feira, aqui em Brasília. Como é bom ver tantos abnegados na luta para que o Brasil não embarque de vez no massacre de vulneráveis. Mas faço apenas uma menção a essa iniciativa imprescindível porque há um inocente específico que não sai da minha cabeça, pela crueldade que permeou sua vida e pela forma covarde e brutal com que foi tirado deste mundo.

Eu preciso continuar a falar de Rhuan. É um pedido da minha alma, porque a tristeza fica remoendo. Às vezes, vem numa onda tão forte que parece não haver ar suficiente, dá uma sensação de sufocamento. Minha mente cria imagens do terror que ele passou, do dia a dia na companhia de uma mãe que o odiava, o torturava, mas de quem ele dependia totalmente. Em cárcere privado, não havia a quem pedir socorro, ninguém para aliviar o sofrimento dele, para abraçá-lo, confortá-lo, dar-lhe colo. Uma criança aterrorizada, vivendo em silêncio o seu calvário. Se isso não é de corroer nosso coração, não sei mais o que seria.

Fico pensando em quantas chances surgiram de salvá-lo nos cinco longos anos de martírio. E se a Justiça não tivesse desistido dele? E se tivesse havido uma investigação de verdade, em busca do paradeiro dos quatro? Os monstros eram foragidas da Justiça, estavam com duas crianças! Elas recebiam uma pensão mensal. Por que não rastrearam os saques para tentar encontrá-las? Será que isso era impossível de fazer?

E se tivesse havido denúncia de alguém em um dos muitos lugares em que moraram nesses cinco anos? Será mesmo que ninguém nunca desconfiou de nada? Até aqui no DF, nenhum vizinho que compartilhava o lote com eles em Samambaia considerou errado, ao menos, o fato de as crianças não irem à escola? Só isso já bastava para acionar o Conselho Tutelar, a polícia ou qualquer órgão de proteção à infância. Uma simples denúncia anônima poderia ter mudado o trágico destino de Rhuan.

Meus questionamentos e considerações parecem inúteis agora. Rhuan se foi e não há nada que se possa fazer sobre isso. É a desoladora verdade. Mas os menciono porque certamente muitos falharam com ele. Seja Justiça, sejam autoridades em geral, sejam cidadãos. Era apenas uma criança, e foi abandonada à própria sorte. Vamos continuar a fazer isso? Vamos ignorar os perigos e os sofrimentos de meninas e meninas neste país? A dor de Rhuan tem de nos fazer mudar, nos despertar para a proteção dos mais indefesos. Cada um de nós tem de fazer a sua parte para evitar que monstros continuem a trucidar crianças. É o mínimo que nossa humanidade exige.



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