Opinião

Como atravessar esse mar revolto?

postado em 23/06/2019 04:17
Ao longo da vida, tenho me afeiçoado ao hábito de não julgar. Apontar o dedo, cutucar feridas abertas, aderir ao estouro da boiada, gritar pelo que todos gritam são manifestações, a meu ver, cada vez mais suspeitas. É fácil entrar numa histeria coletiva; o difícil é pensar por si, colocar-se no lugar do outro, refletir sobre suas certezas. Empatia e sororidade são lindas teorias. A prática, isto sim, é um exercício árduo.

Digo isso porque, cada vez mais, compartilho da tese de que vivemos tempos estranhos e sombrios. Estamos em plena era da imbecilidade. Às vezes, é bem fácil virar um idiota. E, por vezes, o idiota vira contraventor, infrator, assassino. Onde estão os limites? Cadê as linhas que separam o certo e o errado? Busque a educação que sua família te deu. É o que tenho feito.

Fica difícil não julgar alguém que arraste uma idosa pelas ruas e acredite ser apenas uma brincadeira. Fica mais difícil ainda acreditar que esta pessoa tinha companhia no banco carona, que compactuou com o gesto criminoso. Que gente é essa que pode achar normal ou divertida uma atitude dessas? Em algum momento na vida, todos nós podemos errar, extrapolar limites, avançar os sinais do bom senso. Mas há valores perpétuos: ou eles estão em você ou simplesmente são ausentes. Como diz o ditado, ;ou se aprende pelo amor ou pela dor;.

Olhar para o outro, entendê-lo como um ser humano, ser cúmplice de sua alegria e de seu sofrimento, é o que faz de nós capazes de sobreviver como espécie, dotada de inteligência e sabedoria. Observo o presente com a terrível sensação de que o vale-tudo, o bangue-bangue, o salve-se quem puder e o individualismo estão virando onipresentes. Um grave risco à nossa sobrevivência neste mundo.

Mas folgo em saber que há uma massa crítica, operante e atuante, que exige justiça. Também brada contra os preconceitos, os absurdos e os abusos cometidos em nome de ideias deturpadas de família, segurança, religião, tradição. Por que não pensarmos em coletividade, civilidade, cultura da não violência, amor ao próximo?

Está difícil chegar ao fim do dia sem um nó no estômago, uma dor na alma. Segura na mão de alguém de bom coração e segue. É o que tenho feito.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação