Opinião

A tributação dos combustíveis sem reforma

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 25/06/2019 04:16


Instabilidade jurídica afasta investimentos e, sem eles, não haverá retomada do crescimento econômico. Um dos motivos dessa instabilidade é a eterna proposta de mudança da Constituição. Seguramente, ela deve ser alterada aqui e ali, mas encaminhar mudanças de todo o sistema tributário nacional gera insegurança, ainda mais quando as relações entre Executivo e Legislativo não permitem vislumbrar a obtenção da quantidade de votos necessária para as transformações pretendidas.

Nesse sentido, e com os olhos voltados para o ditado que diz que tributo bom é tributo velho, apresento uma proposta de alteração da sistemática de apuração do ICMS sobre combustíveis com vista a torná-lo mais simples, mantendo a arrecadação. A ideia é transformar o ICMS sobre combustíveis de plurifásico em monofásico, respeitando as normas constitucionais já vigentes, bastando alterar a legislação infraconstitucional, o que necessita de menos votos no Congresso e não cria instabilidade jurídica.

Atualmente, a cobrança de ICMS ocorre de forma plurifásica, isto é, a cada operação mercantil, há nova incidência tributária. Pretendendo facilitar o sistema, foi estabelecida a substituição tributária do ICMS nessas operações. Assim, quando uma refinaria vende para um estado, todas as operações posteriores já se encontram de antemão tributadas até o consumidor final. Ocorre que existem diversos aspectos que complicam todo o sistema, como se vê nos dois casos abaixo.

O primeiro é a possibilidade de que o preço final ao consumidor, estabelecido para a incidência via substituição tributária, seja maior ou menor do que o preço efetivamente praticado. Essa hipótese cria uma espécie de conta-corrente entre o fisco e os contribuintes que necessita ser acertada. Se a previsão de incidência tributária for maior que a realizada, os contribuintes terão direito à restituição; caso contrário, o fisco poderá exigir a diferença. Essa insegurança jurídica cria instabilidade econômica.

O segundo é que, muitas vezes, o adquirente do combustível, antes de comercializá-lo no estado, revende para outros estados, no qual o combustível será efetivamente consumido. Nesse caso, será do estado destinatário final do combustível o ICMS de toda a operação. Ocorre que a substituição tributária já foi realizada tendo em vista o primeiro estado, não o segundo, o que obriga a refinaria a estornar o que havia creditado ao primeiro estado e refazer toda a operação com vistas ao segundo estado, onde haverá o consumo.

Parece fácil, porém, se considerarmos a diferença de alíquotas entre os estados, essa operação se tornará verdadeira prova de fogo para que as empresas recebam a diferença recolhida maior. Um exemplo pode esclarecer: o ICMS sobre gasolina no Rio de Janeiro é de 34% e, em Minas Gerais, de 31%. Ocorrendo essa hipótese, a refinaria terá que refazer a operação e se habilitar a receber a devolução dos 3% de diferença junto ao fisco fluminense.

Pode acontecer que, em alguns estados, a devolução seja um processo simples, porém, em outros, as exigências burocráticas estabelecidas se tornam insuperáveis, impedindo que o valor seja reavido, o que aumenta o custo fiscal direto, e também o indireto, em face da burocracia infindável. A solução é tornar o ICMS monofásico, como já ocorre com os tributos federais: PIS, Cofins e Cide-combustíveis.

A proposta é que o valor seja cobrado por preço fixo por litro, e não mais sobre percentagem do montante vendido, o que é permitido pelo art. 155, ; 4;, IV, ;a;, CF. O valor pode ser diferenciado por produto (gasolina, diesel, álcool etc.), o que é também permitido pela Constituição (art. 155, ; 4;, IV, ;b;). E esses valores podem ser alterados a qualquer momento, mesmo durante o ano em curso, conforme o art. 155, ; 4;, IV, ;c;, CF. Enfim, haveria uma única incidência de ICMS, em valor fixo por litro, diferenciado por produto e com a possibilidade de ser adotado um sistema de elevação ou redução da carga tributária de acordo com as crises do petróleo ou de abastecimento, dando a essa incidência de ICMS um caráter regulatório, ao lado do arrecadatório.

Com isso, tudo indica que haverá o término da guerra fiscal no setor, a redução dos custos financeiros das empresas que atuam nesse mercado pela simplificação tributária, a consequente otimização da logística e o combate à sonegação, que ocorre por meio dos mecanismos mais mirabolantes que se possa imaginar. Para quem acha que é uma solução mágica, basta olhar para o passado: trata-se da aplicação do sistema de impostos únicos, com a arrecadação dirigida integralmente aos estados, que a ratearão com os municípios, na forma constitucional. A União já faz isso com os seus tributos. Por que os estados não podem fazer também e facilitar a vida do setor? Não precisa de grandes reformas para isso. Basta usar a Constituição, que já existe, e encaminhar soluções pela via legislativa.



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