Opinião

O Tibete e o desenvolvimento da China

Correio Braziliense
postado em 15/07/2019 04:23 / atualizado em 29/09/2021 09:01




Talvez o Tibete ainda habite o imaginário de muitos como a longínqua região onde se localiza a cadeia dos Himalaias. Ou então aquela localidade esquecida no tempo, como retratado nas cenas do filme “Sete Anos no Tibete”, no qual a história de um alpinista austríaco é vivida pelo ator Brad Pitt. Parte importante da antiga Rota Comercial da Seda, o Tibete que visitei pela segunda vez em junho deste ano está muito diferente da produção cinematográfica que retrata uma realidade dos anos 40. E mesmo quando comparado a 2012, quando estive na região pela primeira vez, as diferenças são gritantes.

Os quase cento e cinquenta chineses e estrangeiros, incluindo o autor deste texto, que participaram do Fórum Internacional sobre o Desenvolvimento do Tibete em junho de 2019 foram apresentados a uma região onde não é necessário muito esforço para perceber a velocidade do progresso econômico e social. Para começar, estradas, pontes e túneis de ótima qualidade interligam belas e bucólicas paisagens cercadas por montanhas a perder de vista. Além dos vistosos rios de água corrente e cristalina, chama atenção a quantidade de antenas para sinal de telefone celular e de painéis solares nos telhados de coloridas casas construídas com arquitetura peculiarmente regional. Também é impressionante, não só o número de  torres para transmissão de energia elétrica, mas o fato de muitas delas estarem fincadas em distantes pontos no alto de montanhas, em posições que de longe pareceriam inalcançáveis.

As condições atmosféricas adversas do mais alto planalto do mundo foram amenizadas pelo fato de o grupo ter pousado inicialmente na cidade de Nyingchi. O nome significa “o Grande Assento do Sol” na língua tibetana. Situada no sudeste do Tibete, no curso inferior do rio Yaluzangbu, é uma das sete prefeituras da Região Autônoma. Atravessada pela rodovia Sichuan-Tibete, a capital Bayi fica a cerca de 400 km de Lhasa, em uma altitude bem maior. Conhecida pelas montanhas verdejantes, águas límpidas e montanhas do Himalaya, Nyingchi também é conhecida como “a Suíça do Tibete”.

Tanto em Nyingchi como em Llhasa, nosso destino seguinte, além de testemunharmos a qualidade da infraestrutura, pudemos visitar um asilo de idosos e escolas com instalações de ótima qualidade, onde os alunos têm acesso a laboratórios bem equipados, aulas de música e artes, e aprendem as línguas chinesa e tibetana. Foi surpreendente saber que existem seis universidades no Tibete, dando maiores condições aos jovens de se prepararem adequadamente para o mercado de trabalho. Pareceu clara a mensagem dos organizadores do Fórum. A China não está apenas investindo na modernização e na qualidade da infraestrutura no Tibete. Também vem aportando recursos financeiros e humanos para melhoria dos índices de desenvolvimento social da região.

Um fator fundamental para uma transformação em velocidade tão rápida são os recursos provenientes da Iniciativa Cinturão e Estrada (BRI, na sigla em inglês). É indiscutivelmente um dos maiores planos de desenvolvimento de infraestrutura da história moderna. Por meio da interligação de estradas, ferrovias, portos, aeroportos, pontes e túneis, as gigantescas obras conectam regiões fronteiriças menos desenvolvidas da China com outros países. Também conhecida como “Um Cinturão, Uma Rota” (“One Belt, One Road” ou OBOR), é vista como uma das mais ambiciosas iniciativas de política externa e econômica do Presidente Xi Jinping. Os legisladores chineses consideram o megaprograma de infraestrutura crucial para melhorar a indústria do país.

Em 2014, a BRI foi oficialmente incorporada na estratégia nacional de desenvolvimento econômico da China, prevendo rotas tanto terrestres quanto marítimas. A sustentabilidade das obras é impulsionada pela capacidade financeira de Pequim, graças aos enormes superavits comerciais globais chineses. Outro pilar importante é o rápido desenvolvimento tecnológico da China em setores estratégicos, como trens de alta velocidade, equipamentos de geração e transmissão de energia, e equipamentos de telecomunicações de última geração. Dessa forma, o Tibete está rapidamente deixando para trás a imagem de uma região relativamente atrasada na fronteira sudoeste da China e ganhando um status de vanguarda na abertura do país para o sul da Ásia. A Região Autônoma do Tibete respondeu, por exemplo, por mais de 90% do comércio exterior da China com o Nepal desde a abertura da ferrovia Golmud-Lhasa em 2006.

O governo regional prometeu investir o equivalente a U$ 88 bilhões em transportes e desenvolvimento econômico e social entre 2016 e 2020, incluindo a construção de 20 novas rodovias. No quinquênio anterior, 300 quilômetros de boas estradas foram construídos, além da Ferrovia Lhasa-Shigatse ter iniciado as operações em 2014. No modal ferroviário, após a Ferrovia Qinghai-Tibete, uma segunda ferrovia ligando Sichuan ao Tibete, que inclui o difícil trecho entre Kangding e Nyingchi, deve ser concluída em 2025. Um dos setores mais favorecidos por essa grande expansão é o turismo, também favorecido pelas atrações históricas, culturais e naturais do Tibete, com geração de emprego e renda. Nada como pisar em solo tibetano para testemunhar tudo isso acontecendo. É ver para crer.

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