postado em 18/07/2019 04:05
A respeito de hackers que interceptaram mensagens telefônicas, não há dúvida de que ;são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos; (CF, art. 5;, LVI), vale dizer, por meio de intercepção de comunicação telefônica sem autorização judicial (Lei n; 9.296/96, art. 10). Daí ressai o direito de o réu não ser condenado por provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se cuide de ilicitude derivada, como tem julgado o ministro Celso de Mello.
Finalizado esse ponto, a questão passa a ser se a prova ilicitamente obtida pode ser utilizada a favor do réu, para absolvê-lo ou anular o processo que resultou em condenação. E a resposta deve ser positiva. A inadmissibilidade da prova ilícita deve ser relativizada, sob o princípio da proporcionalidade, sempre que se perceba que o bem a ser tutelado com uso da prova ilícita merece ser mais protegido do que o direito à intimidade e à vida privada.
Se determinada prova foi obtida ilicitamente, mas possui o condão de comprovar que um cidadão é inocente ou foi condenado por um juiz parcial, essa prova deve ser admitida para reformar a sentença ou anulá-la, pois tanto o processo justo quanto a liberdade são valores mais caros ao Estado de Direito do que a proibição da utilização da prova ilícita ; segundo a aplicação dos métodos exegéticos da ponderação ou balanceamento; os quais devem ser utilizados sempre que dois interesses constitucionais são postos em confronto (antinomia).
O Supremo, sob o princípio da proporcionalidade, teve a oportunidade de convalidar a prova obtida por meios ilícitos para o fim de garantir a legítima defesa das liberdades públicas fundamentais. Um filho não poderia utilizar gravação clandestina, para demonstrar que seu pai o seviciava? Um empresário não poderia fazê-lo, para comprovar extorsão ou ameaça? O parente de uma vítima de sequestro não pode gravar o sequestrador? É de meridiana clarividência que sim, que podem e devem! E por igual motivo, esse mesmo cidadão, ao ser condenado por determinado juiz, também pode se utilizar da prova ilícita para provar que o juiz que agiu de forma parcial ; tudo sob o princípio segundo o qual ;quem pode o mais; [absolver] ;pode o menos; [anular].
Um agente público não tem razoável expectativa de privacidade. Sua conduta deve ser pautada pelos princípios da publicidade, moralidade, impessoalidade e legalidade. Deve o magistrado manter conduta irrepreensível na vida pública e particular, sendo-lhe vedado ;manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem; (Lei Orgânica da Magistratura).
Igualmente, o princípio da publicidade não permite ao magistrado trocar mensagens privadas com uma das partes, seja acusador, seja defensor. O processo é público, e não privado. Despachar com o juiz é direito da parte, dos procuradores e dos advogados; direito esse, que está longe de se poder confundir com a espécie de ingerência e condução processual que as mensagens veiculadas por Veja, Folha e Intercept dão conta.
A Constituição não coonesta a impunidade. Se um funcionário público pudesse cometer ato ilícito e depois se esconder sob o véu da ilicitude da prova, é claro que as garantias da inviolabilidade, da intimidade e da vida privada estariam se desvirtuando dos motivos que ditaram sua instituição. Lord Edward Coke, chefe da Suprema Corte Inglesa, em sua célebre contenda com o rei James I, em 1608, teve a oportunidade de dizer que nem o soberano está acima da lei. Não sou contra a Lava-Jato; ao contrário, sou a favor do combate à corrupção em todas as suas formas. Todavia, se eu tiver que escolher entre a Lava-Jato e a Constituição, fico com a segunda, sem pestanejar!