Opinião

O veneno nosso de cada dia

postado em 05/08/2019 04:04


Diz o ditado popular que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose. Porém, no Brasil, quando o assunto é agrotóxico, estamos assistindo ao quanto mais ;melhor;. Neste ano, foram liberados 262 novos produtos dessa natureza, a maior liberação da história. É mais de um por dia. Antes de continuar, quero dizer que não sou contra a utilização correta, moderada, estudada e bem-intencionada desses remédios. O problema é que não é o que parece acontecer no Brasil.

É inadmissível assistirmos aos bebês da cidade de Limoeiro do Norte, no Ceará, apresentando puberdade precoce devido à ação dos agrotóxicos, como indicou a pesquisa da Universidade Federal do Ceará e está sendo investigado pelo Ministério Público estadual. É inaceitável o Brasil dobrar os casos de intoxicação por defensivos de 7.001, em 2009, para 14.664, em 2018, com a Organização Mundial da Saúde afirmando que esse número pode ser 50 vezes maior, como publicou a imprensa. Entre 2007 e 2015, segundo números do Ministério da Saúde, divulgados também por sites de notícia, foram cerca de 84 mil intoxicados.

Não queremos ler matérias como a do jornal francês Le Monde, que apontou que, em 2017, o Instituto Nacional do Câncer concluiu que o brasileiro consumia, em média, 5 quilos de agrotóxicos/ano. Isso é preocupante, pois o resultado na saúde poderá ser visto ao longo dos próximos anos. Durante Audiência Pública sobre Isenção Fiscal de Agrotóxicos, realizada neste ano, em Brasília, foi informado que cada US$ 1 gasto com defensivos agrícolas gera um custo de até US$ 1,28 em tratamentos de intoxicação, impactando diretamente o orçamento da saúde brasileira.

Mesmo diante de números e casos tão absurdos como esses, o Ministério da Agricultura não para de liberar novos defensivos. Os produtos são colocados no mercado sem sequer um estudo atual sobre o tema. O chocante e o que nos causa um grande alerta é a liberação indiscriminada versus a fiscalização: o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), criado para avaliar os níveis de agrotóxicos que chegam à mesa do consumidor, está há quatro anos sem divulgar novos dados. Os últimos são referentes a 2015.

Em Brasília, temos cobrado explicações do governo. Apresentamos projetos de lei para que em todos os alimentos sejam informados a utilização e os tipos de agrotóxicos adotados; para obrigar o consumo de alimentos orgânicos em escolas e hospitais; dentre outros que contribuem para uma melhor alimentação das pessoas. Vamos promover, no próximo dia 7, uma audiência pública com os ministros da Saúde, Luiz Mandetta, e da Agricultura, Tereza Cristina. Queremos saber o que levou o Brasil a, de repente, autorizar centenas de novos produtos, quando a tendência mundial é de redução. Vamos trabalhar em favor de uma alimentação saudável. Dessa forma, prevenimos doenças e proporcionamos uma qualidade de vida cada vez melhor para todos.

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