Opinião

A culpa não é da vítima

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 29/08/2019 04:05
A violência contra a mulher, que faz uma vítima a cada 2 segundos no Brasil, ganhou as manchetes dos veículos de comunicação e virou tema de conversa nos restaurantes, elevadores e grupos de WhatsApp esta semana. O assassinato de Letícia Curado, aos 26 anos, e de Genir Pereira de Sousa, 47, e a descoberta de que o autor do crime pode ter feito outras vítimas no Distrito Federal, deu visibilidade ao tema e, de modo brutal, esfrega na cara da sociedade o machismo que nos acorrenta, nos fere o corpo e a alma e, não raro, nos tira a vida.

Nas redes sociais ou cara a cara, é assustador o discurso, inclusive entre mulheres, de culpabilização da vítima. Uma hora é o decote, outra a saia curta, ou o fato de estar na rua tal hora, ou, nos casos de Letícia e de Genir, por terem entrado no carro de um motorista que ofereceu o transporte pirata. Mas não, não foram mortas porque entraram num carro pirata. Foram mortas por terem dito ;não; ao assédio sexual do condutor, segundo apurou a Polícia.

No Distrito Federal, mulheres, homens e crianças são empurrados para o transporte pirata de passageiros por uma razão óbvia: o poder público não tem tido, ao longo de décadas, a competência que se espera de um gestor público para oferecer ônibus e metrô de qualidade. Aliás, é incompetente até para fazer calçadas, equipamento imprescindível para os deslocamentos a pé. A incapacidade de gestão e execução de projetos também fica evidente no caso das ciclovias.

Então, Letícia não morreu porque entrou no transporte pirata. Morreu porque, além de ter nascido mulher, numa sociedade extremamente machista, vivia, como a maior parte da população brasileira, à margem das preocupações do poder público nas suas necessidades básicas de ir e vir, asseguradas pela Constituição Federal.

Letícia, Genir e tantas outras mulheres morreram porque a sociedade ainda trata como mimimi a luta pela equidade de gênero. Precisamos formar uma nova geração de meninos e meninas que se respeitem acima de qualquer coisa. Precisamos entender o que é masculinidade tóxica. Precisamos reconhecer os mais sutis sinais de violência. O assunto deve ser abordado em sala de aula. O governo deve investir em políticas públicas e programas que amparem as vítimas de violência. Basta de silêncio! Basta de morte.





Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação