postado em 29/08/2019 04:05
Ciência em colapsoA crise econômica, que se arrasta por mais de meia década, não poupou nenhum setor. Alguns ganham visibilidade porque frequentam o noticiário diário com imagens dolorosas e estatísticas preocupantes. É o caso da educação, da saúde, da segurança, do mercado de trabalho, da mobilidade urbana. Outros se restringem a nichos mais restritos e, por isso, menos divulgados pelos meios de comunicação de massa. É o caso da ciência e tecnologia.
Em razão do contingenciamento de R$ 2,32 bilhões ; 41,9% das verbas previstas para gastos discricionários na área, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) anunciou a suspensão das cerca de 80 mil bolsas ligadas à pasta, a partir de setembro. Antes, projetos de pesquisa, ações de divulgação e eventos científicos foram prejudicados ou cancelados. Para evitar apagão no setor, o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, tem pleiteado a liberação de recursos ao ministro da Economia.
O aperto no segmento de pós-graduação e pesquisa não se deve à criatividade da equipe de Paulo Guedes. As dificuldades vêm de longe. Há anos, mesmo em períodos de vacas gordas, os órgãos de fomento à pesquisa e à formação acadêmica têm enfrentado contínuos cortes de receitas. Vale exemplo recente. Em 2014, o orçamento do CNPq foi de R$ 1,3 bilhão. Em 2019, despencou para R$ 784 milhões, montante que só será embolsado com a suspensão do bloqueio.
É preocupante. O Brasil não ocupa posição de vanguarda mundial na produção de ciência e tecnologia. Uma das principais razões do atraso é a baixa qualidade da educação. Sem ter passado da fase da universalização do ensino para a fase da excelência, o país ficou para trás. O quadro se agravou com a eclosão das atuais dificuldades orçamentárias cuja face mais cruel são os mais de 12 milhões de desempregados.
As consequências cobrarão preço alto. De um lado, interrompem-se pesquisas e perdem-se experimentos que, para serem retomados, exigirão volta ao ponto de partida. De outro, registra-se a fuga de cérebros. Pessoas talentosas buscam no exterior oportunidade de aprofundar conhecimentos e de conquistar espaço no mercado de trabalho. Cientistas com formação em áreas estratégicas e enorme potencial de inovação, formados com recursos públicos brasileiros, vão prestar serviço na Europa ou nos Estados Unidos.
Em nações com carência de mão de obra sofisticada como o Brasil, a emigração de indivíduos com alto nível educacional representa perda de trabalhadores indispensáveis para o salto de qualidade de que a economia tanto precisa para ganhar competitividade internacional. Ao retomar o crescimento, o Brasil precisará de cérebros com ideias inovadoras. O bom senso manda retê-los.